Comunicado do Bastonário | Portaria n.º 161/2020 de 30 de Junho
Caros Colegas,
A publicação da Portaria n.º 161/2020 de 30 de Junho, que actualiza em oito cêntimos a unidade de referência utilizada para o cálculo das remunerações dos Colegas que trabalham no Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais (SADT) constitui uma afronta ao trabalho desses nossos Colegas, exercido em benefício dos cidadãos desprotegidos, mostrando a desconsideração que o Ministério da Justiça tem em relação aos Advogados em geral e aos que trabalham no Sistema de Acesso ao Direito em particular.
Infelizmente este é apenas mais uma manifestação do comportamento a que o Ministério da Justiça nos tem sistematicamente habituado, com particular destaque nos últimos tempos, como a falta de protecção aos Advogados nos tribunais em relação à pandemia, a inexistência das adequadas condições de segurança e trabalho proporcionadas aos Advogados, obrigando-os muitas vezes a esperar à porta do tribunal, e a pretensão de que os Advogados adquiram às suas custas os seus próprios equipamentos de protecção, com máscaras colocadas à venda nos tribunais ao preço excessivo de um euro cada.
Depois de aumentar os ordenados dos Magistrados em centenas de euros, a quem fornece equipamentos de protecção gratuitamente, e de pedir aos Advogados que adquiram máscaras a um euro cada, o Ministério da Justiça aumenta agora os Advogados que trabalham no SADT em apenas oito cêntimos afirmando no preâmbulo da Portaria que esta actualização "satisfaz, do mesmo passo, o princípio da justa remuneração, e a garantia da sustentabilidade ou solvabilidade do sistema”. E acrescenta ainda que, tendo a pandemia COVID-19 provocado uma redução das remunerações dos advogados no SADT, esta actualização "concorrerá, positivamente, para a reintegração da sua situação económico-financeira”.
A Ordem dos Advogados vai ponderar todos os meios de reacção adequados perante esta Portaria n.º 161/2020 e as extraordinárias afirmações que constam do seu preâmbulo. É, no entanto, já manifesto que esta Portaria infringe o disposto na Lei 40/2018, de 8 de Agosto, uma vez que não abrange a inflação verificada em 2018, mas apenas a de 2019, sendo publicada a meio do ano de 2020, quando a actualização deveria ter sido efectuada duas vezes, em 31 de Dezembro de 2018 e 31 de Dezembro de 2019. E verifica-se igualmente o incumprimento pelo Ministério da Justiça da obrigação que resulta do art. 3º da Lei 40/2018, de rever a Lei 34/2004, de 29 de Julho, no prazo de um ano a contar da data da entrada em vigor daquela lei, com o objectivo de actualizar a tabela de honorários para a protecção jurídica e compensação das despesas efectuadas, no intuito de assegurar o efectivo, justo e adequado pagamento de honorários e despesas.
Constituindo um dos principais deveres da Ordem dos Advogados, nos termos do art. 3º d) do seu Estatuto, “zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de Advogado”, tem a nossa Ordem o dever legal de reagir sempre que essa função social, dignidade e prestígio sejam postas em causa por qualquer órgão do Estado, o que manifestamente ocorre neste caso. Assim sendo, sem prejuízo de outras medidas a tomar oportunamente, a Ordem irá desde já reagir nos tribunais contra a manifesta ilegalidade desta Portaria.
Com os melhores cumprimentos,
O Colega ao dispor,
Luís Menezes Leitão
Bastonário
Lisboa, 2 de Julho de 2020