Comunicado do Bastonário | Fiscalização abstracta da constitucionalidade
Fiscalização abstracta da constitucionalidade dos artigos 10.º, n.º 2, 13.º, n.º 4 e 14.º, n.º1, da Lei n.º 26/2020, de 21 de Julho, que estabelece a obrigação de comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira de determinados mecanismos internos ou transfronteiriços com relevância fiscal transpondo a Directiva (UE) 2018/822 do Conselho, de 25 de Maio de 20219
Caros Colegas,
A publicação da Lei n.º 26/2020, de 21 de Julho, que transpôs a Directiva (UE) 2018/822 do Conselho, de 25 de Maio de 2018 (DAC 6), ao exigir que os advogados efectuem à Autoridade Tributária comunicações de operações dos seus clientes que possam ter por objecto uma vantagem fiscal, esclarecendo que essa obrigação prevalece sobre o dever de sigilo, veio atentar profundamente contra o segredo profissional dos advogados, que constitui condição essencial da sua profissão. Tal foi denunciado pela Ordem dos Advogados, ainda no mandato do anterior Conselho Geral, desde a publicação do anteprojecto deste diploma (Ver Comunicado Transposição da Directiva (UE) 2018/822) tendo dado origem ao parecer da Ordem dos Advogados de 23 de Dezembro de 2019, sobre essa proposta de Lei, então enviado ao Parlamento, onde claramente se demonstrava que não só esta solução atentava contra o sigilo profissional do advogado, como nem sequer era imposta pela Directiva.
No entanto, nenhuma destas pronúncias teve qualquer acolhimento por parte do Governo ou do Parlamento que insistiu em consagrar nos artigos 10.º, n.º2, 13.º, n.º4 e 14.º, n.º 1 da Lei n.º 26/2020 de 21 de Julho, a prevalência das obrigações de comunicação à Autoridade Tributária sobre o sigilo profissional dos Advogados. Tal levou a que o actual Conselho Geral tivesse recebido queixas de muitos Colegas contra esta forma de atentar por via legislativa contra o sigilo profissional dos Advogados, o que na prática representa uma forma de derrogar o seu Estatuto.
Por esse motivo, a Ordem dos Advogados decidiu solicitar à Senhora Provedora de Justiça que, no quadro das suas competências, requeresse ao Tribunal Constitucional a fiscalização abstracta da constitucionalidade destas disposições da Lei n.º 26/2020, de 21 de Julho.
Na sequência desta solicitação da Ordem dos Advogados, a Senhora Provedora de Justiça apresentou junto do Tribunal Constitucional, no passado dia 15 de Setembro, um pedido de fiscalização da constitucionalidade dos artigos 10.º, n.º2, 13.º, n.º4 e 14.º, n.º 1 da Lei n.º 26/2020 de 21 de Julho, que estabelece a obrigação de comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira de determinados mecanismos internos ou transfronteiriços com relevância fiscal transpondo a Directiva (UE) 2018/822 do Conselho, de 25 de Maio de 2018, que altera a Directiva 2011/16/UE, no que respeita à troca automática de informações obrigatórias no domínico da fiscalidade em relação aos mecanismos transfronteiriços a comunicar, por constituírem:
- violação do princípio da proporcionalidade na restrição do direito a um processo justo e equitativo, consagrado no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP);
- violação do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada e familiar, consagrado no artigo 26.º, n.º1 da CRP;
- violação do sigilo das comunicações entre o Advogado e os seus Clientes, consagrado no artigo 34.º, n.º1 da CRP.
O referido pedido encontra-se disponível no portal da Provedoria de Justiça em https://www.provedor-jus.pt/lei-n-o-26-2020-provedora-de-justica-requer-a-fiscalizacao-do-tribunal-constitucional/
A Ordem dos Advogados reitera a sua firme determinação, no quadro das competências que lhe são conferidas pelo seu Estatuto de “defender o Estado de Direito e os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos” (art. 3º a) EOA) e "defender os interesses, direitos, prerrogativas e imunidades dos seus membros” (art. 3º e) EOA), de reagir contra quaisquer actos do Governo e do Parlamento que atentem contra estes valores fundamentais para o Estado de Direito, a Advocacia e a Cidadania.
Com os melhores cumprimentos,
O Colega ao dispor,
Luís Menezes Leitão
Bastonário
Lisboa, 20 de Setembro de 2021