“Foi preciso fazer queixa contra o Estado para se analisar a previdência"
O novo regime das sociedades multidisciplinares foi promulgado em meados de novembro. Quais as implicações do veto à alteração do estatuto no funcionamento dessas estruturas?
As sociedades multidisciplinares já estão aprovadas há muito e têm inscrição na Ordem. A nosso ver está muito mau, é absolutamente incorreto, mas é um assunto tratado. A nossa preocupação é a lei dos atos próprios, que foi aprovada na Assembleia da República, que possam ser prestadas consultas jurídicas por licenciados em Direito, que possam ser elaborados contratos apenas com a supervisão de um advogado – portanto, com não advogados – e que a cobrança de créditos possa ser efetuada por não advogados. Todas as pessoas que tiverem assegurados os atos que até aqui eram exclusivos aos advogados não vão ter ninguém que as defenda. Zero. Os outros não estão sujeitos a regras deontológicas, não tem de pagar quotas e caixa de previdência, seguro de responsabilidade civil, podem fazer publicidade... Vão ficar em terra de ninguém.
As pessoas vão pensar que estão a pagar um serviço barato, mas depois se houver algum problema não está lá ninguém para acudir - nem provedor nem Ordem – e têm de ir para tribunal para serem ressarcidos dos prejuízos.
O presidente da ASAP - Associação das Sociedades de Advogados de Portugal diz que estão “um bocadinho de costas voltadas” com a Ordem. Porquê?
Não é verdade. O senhor presidente [da ASAP] até diz, na entrevista [ao Jornal Económico], que foi recebido recentemente aqui na Ordem e que a reunião até correu muito bem. Não temos absolutamente nada contra a ASAP, como não temos contra as outras associações que existem, quer seja a ANJAP [Associação Nacional de Jovens Advogados Portugueses] quer seja a APAPI [Associação Portuguesa da Advocacia em Prática Individual]. As relações entre um órgão e qualquer associação que exista são relações institucionais, normais e transparentes. Naturalmente, discordamos em muitos pontos, o que é normal e de salutar, mas não existe aqui nenhuma, nenhum relacionamento que seja mau ou de costas voltadas. Ficámos até com o compromisso de trabalhar juntos para alterar algumas realidades, nomeadamente a situação dos associados perante as sociedades de advogados, no próximo ano, que carece há muito tempo de revisão. Infelizmente, este ano não foi possível devido a várias circunstâncias.
Quais serão as outras prioridades da Ordem
para 2024?
A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores [CPAS]. Finalmente, depois de muito labor ao longo de 2023 - foi preciso fazer uma enorme pressão, inclusive apresentar uma queixa na Fédération des Barreaux d’Europe, acusando o Estado português de estar a faltar com as suas obrigações para com os direitos sociais dos advogados, solicitadores e agentes de execução - foi finalmente constituída na comissão de trabalho que visa encontrar uma solução para a previdência da advocacia (ou a inexistência). É o assunto mais importante que este Conselho Geral tem para resolver. Segundo, a questão da tabela e do acesso à justiça por parte dos cidadãos. Em 2024 fará, infelizmente, 20 anos da tabela remuneratória das(os) advogadas(os) ao serviço no sistema de acesso ao Direito e aos tribunais. Está claramente desatualizada do ponto de vista formal, porque não acomoda a realidade atual judicial (valores das ações…) e remuneratório (inflação).