Marcelo envia ordens profissionais ao TC por dúvidas sobre regulação
Imposição de órgãos com membros externos às associações colide com princípio da auto-regulação, avisa o Presidente. Depois de ter prometido que enviaria o diploma sobre as associações profissionais para avaliação preventiva do Tribunal Constitucional (TC), o Presidente da República pediu ontem aos juízes que avaliem se há violação do princípio constitucional da auto-regulação no novo regime que impõe a criação, no seio das ordens, de órgãos de regulação, avaliação e fiscalização com membros externos à profissão. No requerimento enviado ao TC, Marcelo Rebelo de Sousa argumenta que tem “dúvidas relativamente ao respeito de princípios como os da igualdade e da proporcionalidade, da garantia de exercício de certos direitos, da auto-regulação e democraticidade das associações profissionais, todos previstos na Constituição”. Lembra que as normas constitucionais estipulam a existência de um regime próprio para as associações públicas, em particular as associações profissionais, “que deve ser respeitado pelo legislador”, leia-se, o Parlamento. Nomeadamente, vinca, no âmbito da auto-regulação, que essas associações devem “reger-se por princípios democráticos internos, [ser] dotadas de órgãos próprios, eleitos pelos membros seus associados”. Marcelo diz que as novas regras estabelecem “um conjunto de restrições relevantes ao princípio da auto-regulação” e da protecção constitucional destas entidades. Em que situações? Marcelo enumera-as. O órgão de supervisão agora criado vai assumir funções de verdadeira auto-regulação genérica, incluindo o “controlo da legalidade”, integra pessoas que, na sua maioria, não pertencem à respectiva associação profissional e “não são democraticamente eleitas” pelos respectivos associados. Existem também funções de natureza disciplinar, de avaliação de final de estágio ou até de provedor que passam a ser atribuídas a pessoas que não estão inscritas na respectiva associação profissional. Na prática, o provedor dos advogados pode, por exemplo, ser um sociólogo ou um professor. As críticas de Marcelo, porém, não se ficam por aqui. Assinala que as novas regras do regime de incompatibilidades absolutas sobre o exercício de funções dirigentes na Administração Pública “deixam de exigir a demonstração de incompatibilidade em concreto” e considera que se cria uma “restrição desproporcionada” ao exercício de tais funções públicas sem fundamento. Por exemplo, isso significa que o director do serviço de um hospital público do Serviço Nacional de Saúde “está impedido de exercer funções nos órgãos directivos da Ordem dos Médicos, da qual é obrigatoriamente membro”, ao passo que o director de idêntico serviço de um hospital privado “não está sujeito à mesma incompatibilidade”. Tal situação, vinca o Presidente, “pode violar o princípio da igualdade na dimensão de igualdade proporcional”. Os problemas apontados pelo Presidente coincidem com boa parte das críticas que as ordens profissionais foram fazendo às propostas do PS e do PAN que acabaram por dar origem ao diploma aprovado no Parlamento, também com votos do PAN e do deputado do PSD Alexandre Poço — PSD, Chega e PCP votaram contra; BE e Livre abstiveram-se. As ordens estão também contra a obrigatoriedade de estágios remunerados no acesso à proÆssão e a criação de sociedades multidisciplinares (como serviços jurídicos e contabilidade, por exemplo), como o texto também prevê. Presidente sinaliza “dúvidas” sobre aspectos do diploma que já haviam suscitado críticas das ordens.