Morreu advogada com cancro que não teve direito a apoio nem baixa médica
Morreu, na segunda-feira, aos 39 anos, a advogada Joana Canas Varanda, vítima de doença oncológica. Mesmo impossibilitada de trabalhar, continuou a fazê-lo, uma vez que não beneficiou de qualquer apoio à doença nem por parte do Estado nem por parte da Caixa de Previdência para a qual fez descontos. A bastonária da Ordem dos Advogados (OA), Fernanda Almeida Pinheiro, fala em "realidade medieval" vivida pelos advogados.
Era num grupo de advogados no Facebook que, volta e meia, Joana desabafava após ter sido diagnosticada, no último ano, com um "cancro em último estádio". Natural de Águeda e com um filho com menos de um ano, a advogada, com escritório na Comarca de Aveiro, lamentava a falta de apoio à doença e o facto de ser privada dos seus direitos básicos de parentalidade ("porque o crescimento do meu filho vale muito mais do que um recurso ou uma queixa no CSM").
Numa publicação recente, fotografou-se a trabalhar quando estava a ser acompanhada no Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto. Noutra, lamentou a falta de empatia e a indiferença de alguns juízes que lhes rejeitaram requerimentos para adiar diligências, argumentando que poderia ser substituída por um colega.
Bastonária fala em "realidade medieval"
A discussão em torno da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), que garante a reforma destes profissionais, mas não assegura, por exemplo, direitos assistenciais aos beneficiários/contribuintes, não é nova.
Nas redes sociais, Fernanda Almeida Pinheiro, que enquanto candidata a bastonária propôs a realização de um referendo sobre o carácter exclusivo da CPAS, lamentou o falecimento de Joana Canas Varanda, uma mãe que morreu "sem qualquer apoio institucional e do Estado e sem que a Justiça pudesse 'parar' para a conseguir ajudar" e sem "acesso a uma previdência digna desse nome".
No Facebook, Fernanda de Almeida Pinheiro criticou aquilo que diz ser uma "realidade medieval" vivida pelos profissionais da advocacia.
"É ao Estado que compete fazer cumprir a Constituição e não pode continuar a fazer de conta que nada tem que ver com o que se passa com cerca de 40 000 profissionais que são seres humanos como os demais e que escolheram as profissões legais para servir a Justiça. Manter esta situação é denegar a cada um/a deles/as os seus direitos constitucionais de previdência mais básicos", escreveu.
"Passaram quase 10 anos desta luta e isto vai mesmo ter de mudar, porque não vamos deixar que isto possa continuar a ser uma realidade medieval", concluiu.
Contactada pelo JN, esta terça-feira à tarde, Fernanda Almeida Pinheiro não se mostrou disponível para prestar declarações, remetendo para a sua assessoria de imprensa. Já a direção do CPAS informou que iria responder às questões do JN "logo que seja possível reunir a informação requerida."
Outro caso
Em novembro do ano passado, a Ordem dos Advogados informou que uma advogada foi obrigada por juiz de Aveiro a comparecer no tribunal ou a fazer-se substituir por outro colega nove dias depois de ter dado à luz, apesar de ter pedido adiamento. Na altura, a OA acusou o magistrado de ter agido "sem a menor empatia e compaixão humana", considerando que esta decisão judicial constitui "uma clara violação da lei e das prerrogativas dos advogados e um atentado aos direitos fundamentais de igualdade e não discriminação em função da maternidade".