Habitação: A morte dos Vistos Gold foi manifestamente exagerada
Concordem mais ou menos com as medidas propostas pelo governo no programa Mais Habitação, aqueles que trabalham com investimento são unânimes num ponto: mexer com a confiança dos investidores é perigoso.
Vasco Rosa da Silva, co-fundador da Kleya, uma empresa do grupo Ageas que faz consultoria e assessoria a estrangeiros que queiram viver ou investir em Portugal, acredita que as medidas apresentadas apenas tendem a "apontar o investimento para o sítio certo". Responsável pela assessoria aos investimentos de muitos estrangeiros em Portugal, afirma que nos últimos anos tem sido crítico da forma como o investimento dos chamados Vistos Gold, é feito. "O programa é muito bom, mas o investimento devia ser dirigido para o sítio certo". A isto, Vasco Rosa da Silva acrescenta que o investimento residencial nunca foi o principal nos Vistos Gold, "os clientes que temos para autorização de residência em investimento no residencial são apenas três. E, todos eles, ou vivem cá ou têm a casa alugada que são exatamente as exceções previstas pelo governo para se poder manter o Visto Gold".
Dados do SEF mostram que o investimento captado através dos Vistos Gold em 2022 ultrapassou os 600 milhões de euros. Perfazendo um aumento de 41,9% face ao ano anterior. 10.593 desses vistos foram concedidos para aquisição de bens imóveis, o que se traduz num investimento de 6.041 milhões de euros, dos quais 534,1 milhões de euros correspondem à compra para reabilitação urbana.
A ideia de Vasco, e o que o Governo agora propõe no pacote Mais Habitação convergem. "Nós sempre achámos que o investimento estrangeiro por esta via devia ser dirigido para onde ele falta: hotelaria, residências de estudantes. Há sítios onde realmente há falta de oferta e este programa é uma excelente forma de captar investimento estrangeiro para onde faz falta em Portugal".
Contudo, o consultor teme o hiato temporal entre o anúncio do governo e a descrição da legislação, "se as coisas não forem clarificadas rapidamente pode trazer [ desinvestimento]. O que eu entendi das declarações do Primeiro Ministro é que estávamos a falar de investimentos exclusivamente imobiliários. Eu estou a assumir que os investimentos na hotelaria, nas residências de estudantes, no venture capital não vão estar em perigo. Essa seria a minha solução".
O anúncio da morte dos Vistos Gold tem-se sucedido ao longo dos anos, mas o que tem acontecido é um ajuste às necessidades do país. O co-fundador da Kleya lembra que "nos últimos dois anos já houve uma alteração, "Porto, Lisboa e centros das cidades já não são elegíveis para o programa e, desde aí, que a maioria do investimento captado em Vistos Gold está a ser dirigido para outro tipo de investimento: fundos, hotelaria, sobretudo reabilitação urbana também".
Mas quanto a estes números, Vasco fala apenas da sua experiência e conhecimento do mercado. Efeitos práticos destas alterações legislativas ninguém sabe porque não há métricas, alerta. "Isto é um problema grave em Portugal, nós não temos informação estatística atualizada. O único número a que temos acesso é o das autorizações emitidas e por causa dos atrasos no SEF estes referem-se há dois anos. Portanto, neste momento não tenho dados estatísticos fiáveis para dizer qual foi o impacto em termos de investimento imobiliário dessa alteração. O que posso dizer é que, já com os dados que temos - com as autorizações emitidas em 2022, que se referem a dados de 2021 ainda antes da lei alterar-se -, se nota o aumento do investimento na hotelaria e na reabilitação urbana, em detrimento do imobiliário residencial. Isso já é claramente visível nos números." E faz uma previsão, "quando tivermos números de 2022, o ponto será muito mais visível".
Depois de consultados dados da Global Citizen percebe-se que, desde as alterações à compra de imóveis em Lisboa e Porto, a opção de capital de risco/fundo de investimento tem crescido em popularidade junto dos candidatos a este programa. Também a modalidade de transferência de capital contou com um aumento de quase 40% no número de vistos emitidos.