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A exigência de uma remuneração mínima de 950 euros para os estagiários e a abertura da consultoria jurídica aos não inscritos nas ordens só vai “prejudicar os cidadãos”, avisam os bastonários.

Bastonários estão contra 950 euros de estágio e perda de atos próprios
A exigência de uma remuneração mínima de 950 euros para os estagiários e a abertura da consultoria jurídica aos não inscritos nas ordens só vai “prejudicar os cidadãos”, avisam os bastonários.

Os estágios profissionais obrigatórios vão ter de ser remunerados e, mais, o valor terá de ser, no mínimo, de 950 euros, o equivalente ao salário mínimo acrescido de 20%. A medida consta da proposta de lei do Governo para a revisão dos estatutos das Ordens Profissionais, que deu entrada no Parlamento esta segunda-feira e está a ser contestada pelos bastonários dos advogados e dos solicitadores e agentes de execução que consideram que vai ter o efeito oposto ao pretendido: sendo os patronos a pagar, a maioria não vai conseguir fazê-lo, o que tornará mais difícil o acesso dos jovens à profissão.

As críticas vão, também, para as alterações em matéria de atos próprios, que, basicamente, permitirão que licenciados em direito façam aconselhamento jurídico sem estarem inscritos em nenhuma das ordens, uma verdadeira “revolução face ao modelo atual”. O Governo, porém, mantém-se irredutível.  

O salário dos estagiários, agora definido pelo Executivo, está em linha com o valor de referência do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) para estágios de licenciados. Para a ministra adjunta e dos Assuntos Parlamentares, que apresentou a proposta em conferência de imprensa, o objetivo é “o combate à precariedade” e, nesse sentido, “acabar com os estágios gratuitos”. Os bastonários concordam que os estágios devem ser remunerados, mas temem que o valor exigido “esteja fora da realidade”.

“Se a maioria dos advogados exerce em prática individual, com que dinheiro vão conseguir pagar estes valores”, questiona Fernanda de Almeida Pinheiro, bastonária da Ordem dos Advogados. “Ninguém é contra a remuneração dos estagiários, mas, a não ser que o Estado crie uma bolsa idêntica à que existe para os estágios das empresas, [esta medida] vai é impedi-los de aceder à profissão”, sustenta, em declarações ao Negócios.

“Esta proposta está feita a pensar nas grandes sociedades de advogados de Lisboa ou do Porto, que mal ou bem já remuneram os seus estagiários. Mas o país real, que exerce em prática individual, acredito que não tem condições financeiras para apoiar e ensinar, não vai conseguir fazê-lo quando nós até sabemos que o solicitador estagiário não pode praticar nenhum ato individual o que significa que não é gerador de riqueza para o escritório”, acrescenta, por seu turno, Paulo Teixeira, bastonário da ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução. “Ao impor a obrigatoriedade da remuneração e estabelecer até uma presunção de que se é estagiário está a prestar trabalho’, o Governo está a criar a maior entropia no acesso à profissão”, acrescenta.

O valor mínimo de remuneração dos estagiários foi uma das novidades da proposta, cuja versão final ontem ao final do dia ainda não tinha chegado aos bastonários. Jorge Batista da Silva, que lidera a Ordem dos Notários, prefere, por isso, esperar para ver. “Iremos analisar o texto final e verificar a sua exequibilidade de acordo com a as restantes normas do nosso estatuto, sendo que o valor referido, o qual até à data era desconhecido, poderá ser pouco ou muito em função do trabalho efetivo prestado”, afirmou. A Ordem dos Notários, assegura, “continuará como sempre o fez a defender estágios dignos, mas com condições economicamente viáveis”.

Atos próprios em perigo

Dos contactos com o Governo na fase de preparação da proposta, os bastonários sabiam já que havia a intenção de rever a parte relativa aos atos próprios dos advogados e solicitadores e ontem soube-se que o Governo se mantém aí irredutível. Aqui o que se faz é permitir que outros licenciados em direito, ainda que não inscritos nas Ordens Profissionais, possam fazer consulta jurídica, reservando aos advogados “o mandato forense, o patrocínio judiciário nos tribunais, a essência da advocacia”, explicou o secretário de Estado Adjunto e da Justiça, também presente na conferência de imprensa. “O que se pretende é alargar a um universo que até agora não pode fazer consulta jurídica, mas que esteve na academia, como o advogado também esteve”, acrescentou Jorge Alves Costa, sublinhando que esta é também uma forma de cumprir o principio do acesso ao Direito e aos Tribunais”. Haverá, seguramente”, trabalho para todos”, rematou.

O problema será mais o de saber quem controla a qualidade deste trabalho, avisa Fernanda de Almeida Pinheiro. “O acesso à justiça nestes termos é uma balela”, declara. “As pessoas até podem achar que estão a receber aconselhamento jurídico, mas a incompetência paga-se muito cara”.

Para a bastonária dos Advogados, “o Governo está a criar uma concorrência desleal, porque quem estiver na ordem tem de pagar quotas, Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), está sujeito a regras, a processos disciplinares”. “Tudo o resto é a selva.”

Paulo Teixeira concorda. “Permite-se que alguém que tem apenas uma formação académica, sem respeito por normas deontológicas, ou de publicidade, possa praticar os mesmos atos ao arrepio das sãs regras de concorrência”. Entre advogados e solicitadores há cerca de 40 mil profissionais, lembra. “Não são suficientes? Vamos correr o risco de o cidadão ser prejudicado e mal informado por quem não tem a capacidade para o poder informar”, avisa.

Por outro lado, lembra a bastonária da OA, “deixando na Ordem só quem tem mandato forense, os que não vão a tribunal, podem deixar de estar inscritos” e deixam de ser obrigados, também a descontar para a CPAS. E aí, remata, “quem vai pagar as reformas dos advogados?” “É o maior tiro no porta aviões que a CPAS podia levar.”

Ao impor a obrigatoriedade da remuneração e estabelecer até uma presunção de que se é estagiário está a prestar trabalho, o Governo está a criar a maior entropia no acesso à profissão.PAULO TEIXEIRA
Bastonário da Ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução.
 
O Governo está a criar uma concorrência desleal, porque quem estiver na Ordem tem de pagar quotas, Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, está sujeito a regras, a processos disciplinares. Tudo o resto é a selva.FERNANDA ALMEIDA PINHEIRO
Bastonária da Ordem dos Advogados
 
Contabilistas vão manter as mesmas competências fiscais
 

Os Contabilistas Certificados vão continuar a ter como ato próprio o preenchimento e envio, para o Fisco, das declarações fiscais associadas à contabilidade dos seus clientes. A questão levantou-se durante a preparação, pelo Governo, da nova proposta de estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC), o que provocou uma contestação cerrada por parte da Ordem. A versão final da proposta, entregue esta segunda-feira no Parlamento, mantém, afinal, as competências destes profissionais como hoje estão, apurou o Negócios junto de fonte do Executivo.

Os contabilistas certificados têm competências ao nível da organização da contabilidade das empresas e assumem a responsabilidade pela mesma. Além disso, são também eles quem assina as declarações fiscais dos seus clientes, juntamente com os mesmos.

A versão inicial da proposta do Governo previa que deixasse de ser necessária a assinatura de um contabilista certificado nas demonstrações financeiras e declarações fiscais das entidades, públicas ou privadas, que possuam contabilidade organizada.

Esta hipótese deixou a classe em nervos, com a bastonária, Paula Franco, a afirmar que uma formulação deste género permitiria “que qualquer cidadão pudesse submeter declarações fiscais”, o que corresponderia a “uma desenfreada, imponderada e irresponsável desregulação profissional”.

Na versão final há uma alteração na formulação da lei, e passa a prever-se que, doravante, os contabilistas certificados terão apenas uma competência própria, a de serem responsáveis pela contabilidade. E, nesse contexto, terão, em consequência, de ser eles a assinar as contas e as declarações fiscais que tenham por base a contabilidade.

Com a alteração à lei das Associações Profissionais, todos os estatutos das Ordens têm de ser revistos e adaptados às novas regras. A competência da iniciativa é do Governo, mas a última palavra será do Parlamento. A proposta de lei com os estatutos das 20 Ordens Profissionais que existem no país vai agora ser debatida no Parlamento e promete ser polémica. Porque se é certo que a lei das associações profissionais já exige regras como a criação de um conselho de supervisão com elementos externos à profissão, há medidas novas, como a remuneração obrigatória dos estágios, fixada num valor mínimo de 950 euros. 

Na primeira versão da proposta de lei, os contabilistas deixavam de ter de assinar as declarações fiscais.

20/04/2025 07:45:05