Ordens. Governo diz que apenas quer melhorar acesso às profissões

Revisão dos estatutos das ordens profissionais tem motivado protestos, mas Executivo recusa acusações de tentativa de controlo político e de retirada de poder

Mais de uma centena de advogados concentrou-se ontem no Campus de Justiça, em Lisboa, para protestar contra a revisão do estatuto da sua Ordem profissional. Com os manifestantes colocados por imposição da PSP a 100 metros da entrada do Tribunal Central Criminal de Lisboa, a bastonária, Fernanda de Almeida Pinheiro, indignou-se com as restrições lembrando que “o tribunal é a casa da advocacia” e que o seu acesso não pode ser vedado à classe. “Não faz sentido retirar atos que são próprios dos advogados e solicitadores”, realçou a bastonária, alertando que as alterações propostas pelo Governo permitem que pessoas sem cédula de advogado, organismos e sociedades comerciais possam praticar atos até agora exclusivos daqueles profissionais, como elaboração de contratos, cobrança de dívidas e consulta jurídica.

É uma lei para melhorar o acesso às profissões e não para controlar a atividade das Ordens. A garantia é dada pelo Governo, em resposta à contestação generalizada que tem motivado a revisão dos estatutos das Ordens profissionais, com protestos a alargarem-se entre os vários setores afetados, desde advogados  a médicos, enfermeiros, farmacêuticos, engenheiros, economistas, entre outros.
Numa conferência de imprensa que juntou três governantes, a ministra dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, que tem liderado o processo de revisão da lei-quadro e estatutos das ordens profissionais dentro do Governo, defendeu a importância desta reforma, lembrando que fazia parte das recomendações de reformas no país desde a ‘troika’ e que é também o cumprimento do programa do Governo.
Para a ministra, o que está em causa não é uma tentativa de controlo político desses organismos, mas sim “o combate à precariedade, facilitar o acesso às profissões e ao mercado de trabalho dos jovens licenciados e eliminar barreiras, como as socioeconómicas”.
Ana Catarina Mendes sublinhou que os estágios nas Ordens passam a ser obrigatoriamente remunerados, com um valor mínimo de 950 euros, que correspondente ao valor do salário mínimo nacional acrescido de 25%. “Uma questão de decência”, referiu, acrescentando ainda a eliminação ou restrição de provas de acesso às ordens.
Outro objetivo da reforma passa por “melhorar a transparência no funcionamento das Ordens”, o que Ana Catarina Mendes reiterou não se tratar de “uma retirada de poder às Ordens”, mas sim de regulação do mercado de trabalho.
Ao seu lado, o secretário de Estado Adjunto e da Justiça defendeu que “é um erro de base” considerar que quem não está inscrito na Ordem dos Advogados não tem competências para exercer atividade jurídica, à exceção do mandato forense. “Esse é o erro de base, ou seja, quem não está inscrito na Ordem não tem qualificações, não tem adequação para exercer aquela atividade.
Não podemos partir desse pressuposto que quanto a nós - e respeitamos muito a Ordem dos Advogados, a senhora bastonária e os advogados em geral -, não pode significar a adesão à realidade”, disse Jorge Alves Costa, também ele defendendo que “esta reforma não se faz contra as Ordens nem sem as Ordens”.
Para o secretário de Estado da Justiça, em relação ao caso dos advogados, abrir a prática de alguns atos jurídicos a licenciados em Direito não inscritos na Ordem dos Advogados, alterando o paradigma vigente de atos próprios exclusivos da advocacia, não representa uma perda de poderes e de competências para a Ordem dos Advogados nem uma desproteção jurídica dos cidadãos. Para o Governo, “ter passado pela academia”, ou seja, ter a licenciatura em Direito, deve permitir ao profissional licenciado em Direito fazer aconselhamento jurídico, elaborar contratos ou cobrança de créditos.
Sobre as críticas à entrada de elementos externos às profissões nos conselhos de supervisão das Ordens, Jorge Alves Costa recusou críticas de tentativa de governamentalização destes órgãos, sublinhando que “não há qualquer intenção de interferir na atividade das Ordens” e que esses elementos externos “não têm qualquer conexão” nem representam o Governo.
Também o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, que completou o trio de governantes na conferência de imprensa, considerou que os conselhos de supervisão previstos nos novos estatutos das ordens profissionais são “uma falsa questão”, alegando que este órgão não terá funções de controlo técnico.
Segundo o ministro, este órgão será composto por 40% de elementos inscritos na respetiva ordem, outros 40% oriundos das “instituições académicas que conduziram à formação das pessoas que estão inscritas na ordem” e os restantes 20% escolhidos entre personalidades de reconhecido mérito.
“Todos eles -- os membros da ordem, os oriundos das instituições académicas e as personalidades de reconhecido mérito -são escolhidos e votados pelos membros da ordem”, avançou o governante.

20/05/2025 20:15:12