Regulamentação do lóbi defendida como forma de ganhar transparência | Ordem dos Advogados aberta a participar na regulamentação
Com argumentos a favor e contra, desde há muito que a questão da regulamentação do lóbi está sobre a mesa. Faz agora parte de mais um pacote de medidas anticorrupção e deverá mesmo avançar, assim admitem os advogados inquiridos pelo Negócios. Porque o lóbi existe, com ou sem estar regulamentado, o melhor é mesmo dar-lhe a forma de lei, pois só assim se ganhará transparência e se separará o lícito do ilícito, defendem os nossos interlocutores.
Tal como recorda o advogado Pedro Lomba, sócio de TMT da PLMJ, “já foram feitas várias tentativas de legalização do lóbi ou da atividade de representação de interesses legítimos”. Em sua opinião, “hoje é mais claro do que nunca que, havendo a institucionalização do lóbi, há ganhos enormes e evidentes na transparência”. Neste sentido, aponta como exemplos os casos de países como “Espanha, Alemanha e Irlanda” para podermos ver que “há amplo consenso sobre o assunto”.
A questão que se coloca é como é que essa legalização pode e deve acontecer? Para Pedro Lomba, “olhando para as boas práticas de países que estão mais avançados no tema e uma delas é a necessidade de criação de um registo de transparência obrigatório e de um código de conduta para os representantes de interesses legítimos”.
Paralelamente, “há aqui também alguma ponderação e calibração a fazer na regulamentação, na medida em que não queremos que a Lei seja de tal maneira com Porque o lóbi existe, com ou sem regulamentação, o melhor é dar-lhe a forma de lei, pois irá ganhar-se transparência e separar o lícito do ilícito, defendem os advogados ouvidos pelo Negócios. plexa na aplicação que resulte em mais um travão ou obstáculo à desejável e necessária celeridade dos demais processos”, frisa o sócio da PLMJ.
Inês Almeida Costa, especialista em direito penal e associada Já foram feitas várias tentativas de legalização do lóbi ou da atividade de representação de interesses legítimos. coordenadora da sociedade de advogados MFA, considera que “ainda há muita discussão a travar acerca deste tema. Sobretudo quanto à regulamentação”. Contudo, diz ter a convicção de que “não só faz sentido legalizar o lóbi, como isso é desejável”.
A mesma advogada adianta que “o lóbi existe, haja ou não regulamentação”. Por isso, é preferível que tal aconteça “de forma regulada e transparente”, pois “só assim se conseguirá traçar ao certo as fronteiras entre o lícito e o ilícito, entre o permitido e o proibido”. Na sua opinião, “a regulação do lóbi poderá fomentar a igualdade de oportunidades” e permite “que a participação na formação da opinião pública ou política não esteja circunscrita às pessoas ou empresas bem ‘posicionadas’ em termos de relacionamentos pessoais e ou profissionais. O espetro alarga-se a outros possíveis participantes. Desta forma, a regulação do lóbi estimula a participação democrática”.
Tal como enfatiza o penalista Carlos Pinto de Abreu, “tem sido pouco clara e até fluida e equívoca a interpretação do crime de tráfico de influências e a consequente aplicação a casos concretos”. Na perspetiva desta advogado, “algumas vezes se confundem atos perfeitamente lícitos de consultoria ou de defesa e de patrocínio de interesses, com ilícitos criminais”.
Para Pinto de Abreu, "a vantagem da regulamentação da atividade de lóbi era tornar clara a sua licitude e a normalidade de condutas tipificadas". Há, porém, "pelo menos, um óbice", aponta, que "é o de se entender existir a partir daí uma espécie de inversão do ónus da prova".
Até por isso, o advogado defende que "talvez fosse mais útil o legislador trabalhar melhor e delimitar adequadamente os tipos de ilícito criminal". Isto, sublinha o mesmo advogado, acautelando que "não se pactua minimamente com caldeirões em que cabe tudo e normas quase em branco".
Na perspetiva de Cláudia Amorim, sócia da Sérvulo, "a definição do que é verdadeiramente lóbi e a sua regulamentação permitirá separar o trigo do joio". Tal como adianta, "há uma ideia errada que se generalizou, e que que acabou por ser, de certa forma, veiculada também pelo Ministério Público, de que todo o tipo de influência que se interligue com o poder público é passível de constituir crime. Este normativo poderá servir para traçar a linha de fronteira".
No entanto, adianta esta advogada, "é muito importante acautelar que uma eventual 'lei do lóbi' não servirá para automaticamente criminalizar todos os comportamentos que escapem a este conceito". Por isso, sublinha "é preciso continuar a ter um rigor absoluto na tipificação dos crimes de corrupção, tráfico de influências, e infrações conexas, para que o Direito Penal continue efetivamente a sera ultima ratio do Estado de Direito Democrático
Ordem dos Advogados aberta a participar na regulamentação
A Ordem dos Advogados (OA) quer ter uma participação ativa no processo de regulamentação do lóbi em Portugal. O propósito foi reforçado num comunicado recente do Conselho Geral, presidido pela bastonária Fernanda de Almeida Pinheiro, na sequência dos casos mediáticos que nos últimos meses envolveram o sistema judiciário e alguns atores políticos, que culminaram, na última semana, com uma muita falada violação de segredo de Justiça.
“A Ordem dos Advogados será um poderoso parceiro do legislador uma vez que a implementação de um regime de regulamentação do lóbi em Portugal apresenta diversos desafios”, é sublinhado no referido comunicado, que tem por base um excerto do documento entregue aos grupos parlamentares, na sequência do 1.º Fórum da Advocacia Portuguesa, realizado em fevereiro deste ano, assim como à ministra da Justiça, Rita Júdice, aquando da primeira reunião com a OA.
No documento em causa, é evidenciado que a atividade de lóbi envolve uma série de nuances legais, como transparência, conflitos de interesse e responsabilidades profissionais, pelo que “criar regras claras e abrangentes que abordem essas questões é um desafio complexo”. Neste sentido, é sublinhado que “o legislador tem necessidade de encontrar um equilíbrio delicado entre os interesses das empresas e da sociedade em geral”.
Por outro lado, garantir que os lobistas cumprem as regras requer um sistema eficaz de fiscalização. A este nível, os atuais dirigentes da Ordem dizem que a instituição “conseguirá monitorizar as atividades dos advogados e aplicar sanções a nível deontológico e disciplinar e pode ser parceiro na gestão da aplicabilidade da lei de uma forma geral”.
Enquanto parceiro de gestão, a Ordem defende, de resto, que pode intervir através do seu Conselho Superior e dos seus conselhos de deontologia, bem como lhe será possível “fornecer orientações claras sobre como os advogados se devem envolver em atividades de lóbi de maneira ética e legal”.
Porque a regulamentação do lóbi “não é responsabilidade exclusiva do legislador”, no documento em análise frisa-se que “terá de haver colaboração com outras instituições, como a Ordem dos Advogados, o que se mostra essencial para criar um ambiente regulatório eficaz”.