Mais de 11 mil condutores apanhados a conduzir sem carta
Os números da PSP e da GNR relativos a 2024 são provisórios e poderão refletir apenas a ponta do icebergue, já que configuram somente as pessoas apanhadas a conduzir sem carta. Poderão haver muitas mais na estrada a cometer este crime e que não são detetadas pela fiscalização. No ano passado, em conjunto, as duas autoridades registaram, em conjunto, 11.359 detenções por condução sem habilitação legal. Os dados das forças de segurança incluem pessoas que nunca tiveram um título de condução válido e outras que deixaram a data de validade da carta passar mais de dez anos.
António Reis, presidente da Associação Nacional de Escolas de Condução Automóvel (ANIECA), considera que os números de crimes sobre condução sem habilitação legal são "extremamente preocupantes". "São pessoas que andam a conduzir, algumas delas sem qualquer habilitação inicial e outras andam a conduzir sem uma atualização de conhecimentos", afirma. Os últimos relatórios da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), incluindo as operações de Natal e de Ano Novo, mostram que circular sem carta é o segundo crime rodoviário mais cometido, ultrapassado apenas pela condução sob influência de álcool.
Além das pessoas que nunca aprenderam (formalmente) a conduzir ou foram sequer sujeitas a exames teóricos e práticos para circular na estrada, continuam a chegar "algumas pessoas por dia" às escolas de condução com dúvidas sobre a renovação das cartas de condução. Caso deixem passar mais de dez anos da validade do documento, o Código da Estrada determina que esses condutores não podem renovar o documento e, caso queiram continuar a conduzir, terão de tirar novamente a carta de condução.
Crime punível com pena de prisão
A PSP explica que, "para todos os efeitos legais", as pessoas que deixem a carta caducar por mais de dez anos não estão habilitadas "a conduzir os veículos para os quais o título foi emitido" e incorrem no crime de condução de veículo sem habilitação legal, punível com pena de prisão até um ano ou multa até 120 dias. "Caso conduzam motociclo ou automóvel, a pena duplica para pena de prisão até dois anos ou multa até 240 dias", clarifica a mesma força de segurança.
Apesar do pedido do JN, as autoridades não fizeram a distinção, nos dados fornecidos sobre a condução sem habilitação legal, entre os que nunca tiveram um título de condução e os que ultrapassaram a data de validade da carta por mais de dez anos. António Reis acredita que não haverá um "número muito elevado" de condutores com o documento caducado há mais de uma década, mas reconhece continuar a haver "complicações administrativas" em revalidar a carta de condução. Alguns condutores, diz o presidente da ANIECA, confundem os prazos ou não sabem como o fazer.
De recordar que, em 2023, o governo socialista de António Costa criou o Regime Extraordinário de Revalidação de Títulos de Condução (RERTC). A medida entrou em vigor a 1 de agosto de 2023 e terminou a 31 de julho de 2024. O regime tinha o objetivo de simplificar a renovação das cartas de condução para os condutores habilitados antes de 1 de janeiro de 2008 e que tinham o documento caducado. Mesmo com o título de condução desatualizado há vários anos, a lei permitiu que os condutores renovassem a carta sem que tivessem de se submeter a exame.
Em muitos dos casos, a data de validade na carta de condução não correspondia à que estava atualmente em vigor, devido a uma mudança legislativa em 2012.
Testes de código têm de ser alterados
O Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) diz que não há “previsão de extensão do regime extraordinário de revalidação dos títulos de condução em 2025”. O instituto admite, no entanto, a criação de medidas de apoio à renovação dos documentos este ano, quando for revisto o regime de habilitação legal para conduzir. De acordo com jornal "Público", cerca de 16 mil (num total de 55 mil elegíveis) aproveitaram o regime extraordinário de 2023 para renovar o documento e a maioria (6502) tinha o documento caducado há mais de dez anos.
António Reis acredita que a medida criada pelo governo socialista de renovação das cartas permitiu diminuir os números dos crimes da condução sem habilitação legal, no ano passado (ver infografia abaixo). Desde 2019, segundo os dados da GNR e da PSP, o ano com mais detenções por causa daquele tipo de crime rodoviário foi 2023 (15.570).
"Por forma a evitar o crescimento do número de detenções por falta de habilitação legal, a PSP informa que a revalidação da carta de condução pode ser requerida nos seis meses que antecedem o termo de validade do título", aponta a polícia. A força de segurança aconselha ainda a visitar o site do IMT para consultar os prazos, uma vez que variam consoante o ano em que se tirou a carta e a categoria de veículo que se conduz.
Sobre as pessoas que nunca obtiveram um título de condução, e que ainda assim circulam sem carta, o presidente da ANIECA defende que há "situações no exame teórico de condução que têm de ser alteradas". "A forma como os testes de código estão a ser realizados não vão encontro da literacia dos candidatos", refere António Reis.
Para o responsável associativo, há "uma necessidade urgente de criar condições para que os testes sejam de mais fácil interpretação". "Não implica o desconhecimento da matéria, mas uma interpretação muito mais acessível. Hoje, os testes de código são extremamente difíceis para um indivíduo que não pratique da leitura", aponta.
O último relatório da ANSR, que contabiliza dados entre janeiro e julho do ano passado, mostra que as detenções por causa da condução sem habilitação legal desceram 37%, face ao mesmo período de 2023. Nos primeiros sete meses de 2024, 7 409 pessoas foram detidas por conduzir sem carta ou por circular com a carta caducada há mais de dez anos.
Menos de quatro mil renovam carta por app
Menos de quatro mil condutores (3497) renovaram a carta de condução no ano passado, através da aplicação oficial do Estado, ID.gov. Desde 16 de outubro de 2023, está disponível a Renovação Automatizada da Carta de Condução, que permite aos condutores de veículos ligeiros até aos 50 anos renovar o documento através do telemóvel.
Quando a medida foi criada, para aliviar a sobrecarga do IMT e evitar esquecimentos e multas dos condutores, o Governo socialista estimava que o regime poderia abranger cerca de seis mil pessoas por mês. Porém, de acordo com os dados fornecidos pelo IMT, em 2024 foram emitidas 3497 cartas de condução pela app ID.gov.
A maioria dos condutores renova a carta através de entidades parceiras (409.137), como as escolas de condução, o Automóvel Club de Portugal ou a Associação Nacional dos Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros. Pelo menos 291 mil renovaram no site do IMT e 92.059 foram aos balcões do IMT.