A dignidade não é um jogo
Foi lançado esta semana o videojogo No Mercy, cujo objetivo consistia, pasme-se, em violar mulheres. É difícil conceber que, em pleno século XXI, alguém considere legítimo criar um produto com tal premissa — mais difícil ainda é compreender como plataformas de distribuição o aceitaram, como se se tratasse de apenas mais um conteúdo inócuo de entretenimento.
Em diversos países, incluindo Portugal, o jogo só foi removido após uma reação pública firme, quer do público quer de associações de defesa dos direitos das mulheres.
Este episódio expõe uma realidade inquietante: há quem confunda liberdade criativa com permissividade moral absoluta. A banalização da violência sexual sobre as mulheres, sobretudo sob a forma de entretenimento interativo, é um sintoma grave de insensibilidade ética e de uma sociedade doente.
Se o bom senso deixou de ser suficiente para travar iniciativas desta natureza, impõe-se uma regulamentação mais rigorosa, com sanções claras para os infratores. Proteger a dignidade humana deve ser sempre prioridade — e nunca uma variável de mercado.
Fernanda de Almeida Pinheiro, Bastonária da Ordem dos Advogados