Comunicado conjunto do IAD, IAJA, IAPI e da CDAPA
Comunicado conjunto do IAD, IAJA, IAPI e da CDAPA
Lançou recentemente a Ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução (OSAE) a campanha Tele Apoio Jurídico OSAE – Os associados da OSAE respondem às suas dúvidas relacionadas com o contexto da pandemia Covid-19.
Dirigir-se-á tal campanha a “esclarecer o cidadão e aproximá-lo da Justiça, sendo anunciada como um projeto que une mais de duas centenas de associados da OSAE que, de forma altruísta e voluntária, irão gratuitamente responder à sua questão jurídica”.
A Lei que regula os actos próprios dos advogados e dos solicitadores confere-lhes o exclusivo (da competência) para a prática de múltiplas categorias de actos, constituindo óbvia barreira à concorrência desleal. Concorrência desleal, pensada pelo legislador, por parte de todos quantos não estejam habilitados/capacitados como advogados ou solicitadores.
Nesta esteira, se cabe à OSAE promover o respeito pelos valores e princípio deontológicos da classe que representa, cabe aos solicitadores e agentes de execução cumprir pontual e escrupulosamente os deveres consagrados no Estatuto a que estão sujeitos, nomeadamente não solicitar nem angariar clientes por si ou por interposta pessoa, emitir publicidade meramente informativa e objectiva, com respeito pelas demais leis sobre publicidade e concorrência.
Porém, a OSAE, desde 2016, embora agora com mera alteração do pretexto, vem rotinando práticas travestidas de voluntariado generoso, na pertinaz tentativa de ocupar o espaço comum de intervenção profissional.
Com o confinamento dos cidadãos, o encerramento de milhares de empresas e o fecho dos tribunais, inúmeros advogados e solicitadores passam por grandes dificuldades, à razão da sobrevinda escassez dos seus próprios rendimentos. Neste contexto, não é compreensível ou aceitável que a OSAE lance uma campanha de autêntico “Vale Tudo” concorrencial, com trágicas consequências, desde logo, para alguns dos seus associados.
Os Institutos do Acesso ao Direito, de Apoio aos Jovens Advogados, dos Advogados em Prática Individual e a Comissão de Defesa dos Actos Próprios da Advocacia, estão a par do cenário distópico, desejado pela Autoridade da Concorrência para a nossa actividade comum, que escancararia a porta para, num “paradisíaco” mercado sem regras, as grandes consultoras internacionais ficarem com a fatia do mercado que mais lhes aprouver. Só não se esperava que a OSAE fosse o seu cavalo de Tróia ao lançar a actividade comum, em tal território.
Aliás, a consulta jurídica reveste demasiada importância enquanto prestação de informação adequada aos cidadãos e empresas, designadamente evitando muitos litígios, sendo que as referidas iniciativas da OSAE conduzem, erradamente, à sua desvalorização, o que se repudia e não pode deixar de resultar no não acompanhamento desta e de outras iniciativas semelhantes.
O acesso ao direito e aos Tribunais, prometido no artigo 20º da Constituição, garante que todos os cidadãos, independentemente das suas condições económicas, tenham acesso à prestação de consulta jurídica e que, ao abrigo do mesmo, os advogados sejam remunerados pelos seus serviços.
Esta premissa, decorrente de Lei, acarreta que os advogados e os solicitadores, que exerçam a sua profissão dentro ou fora do âmbito do apoio judiciário, devem ser remunerados pelas consultas jurídicas que prestem.
Não pode a campanha da OSAE, com escopo alegadamente altruísta e fundamentada nos tempos em que vivemos, incentivar a violação de normas estatutárias que importam, em primeira instância, um grave prejuízo económico aos advogados e aos solicitadores, que vêem o seu sustento reduzido, pela falta de procura, situação que não ocorre com os demais que exercem a sua profissão em tempos de pandemia, sejam eles profissionais de saúde, professores, comerciantes, juízes, procuradores, funcionários de justiça, polícias, entre outros.
Sendo que todos somos actores na sociedade em que vivemos, estranhos actos de generosidade devem ser substituídos por condutas sérias e leais, dignificantes das classes de que fazemos parte.
Instituto do Acesso ao Direito
Silva Cordeiro
Instituto de Apoio aos Jovens Advogados
Raquel Maudslay
Instituto dos Advogados em Prática Individual
Rui Chumbita Nunes
Comissão de Defesa dos Actos Próprios da Advocacia
José Alexandre Policarpo
27 de Abril de 2020