Código de Deontologia dos Advogados Europeus
Deliberação n.º 2511/2007 OA (2.ª série), de 27 de Dezembro de 2007 / Ordem dos Advogados. Conselho Geral. - Aprova a tradução na língua portuguesa do Código de Deontologia dos Advogados Europeus, originalmente adoptado na sessão plenária do Conseil des Barreaux européens (CCBE) de 28 de Outubro de 1988 e subsequentemente alterado nas sessões plenárias do CCBE de 28 de Novembro de 1998, de 6 de Dezembro de 2002 e de 19 de Maio de 2006. Revoga o Regulamento n.º 25/2001, de 22 de Novembro. Diário da República. - S.2-E n.249 (27 Dezembro 2007).
ORDEM DOS ADVOGADOS
Deliberação n.º 2511/2007
Aprova a tradução na língua portuguesa do Código de Deontologia dos Advogados Europeus, originalmente adoptado na sessão plenária do Conseil des Barreaux européens (CCBE) de 28 de Outubro de 1988 e subsequentemente alterado nas sessões plenárias do CCBE de 28 de Novembro de 1998, de 6 de Dezembro de 2002 e de 19 de Maio de 2006. Revoga o Regulamento n.º 25/2001, de 22 de Novembro.
O Conselho Geral da Ordem dos Advogados, reunido em plenário de 13 de Julho de 2007, delibera, ao abrigo do disposto nas alíneas d) e h), do n.º 1, do artigo 45.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela n.º Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro:
1 - Aprovar a tradução em língua portuguesa do Código de Deontologia dos Advogados Europeus e o respectivo memorando explicativo, originalmente adoptado na Sessão Plenária do Conseil des Barreaux européens (CCBE), de 28 de Outubro de 1988, e subsequentemente alterado nas Sessões Plenárias do CCBE de 28 de Novembro de 1998, de 6 de Dezembro de 2002 e de 19 de Maio de 2006, cujas versões autênticas em língua inglesa e em língua francesa, e a respectiva tradução em língua portuguesa ficam em anexo à presente deliberação, da qual fazem parte integrante.
2 - Revogar o Regulamento n.º 25/2001, de 22 de Novembro.
7 de Dezembro de 2007
O Presidente do Conselho Geral, Rogério Alves.
ANEXO
CÓDIGO DE DEONTOLOGIA DOS ADVOGADOS EUROPEUS
1 - Preâmbulo
1.1 - A função do advogado na sociedade
Numa sociedade baseada no respeito pelo primado da lei, o advogado desempenha um papel especial. Os deveres do advogado não se esgotam no cumprimento rigoroso do seu mandato dentro dos limites da lei. O advogado deve servir o propósito de uma boa administração da justiça ao mesmo tempo que serve os interesses daqueles que lhe confiaram a defesa e afirmação dos seus direitos e liberdades. Um advogado não deve ser apenas um pleiteador de causas, mas também um conselheiro do cliente. O respeito pela função do advogado assume-se como uma condição essencial para a garantia do Estado de Direito Democrático.
Por isso, a função do advogado impõe-lhe uma diversidade de obrigações legais e morais, muitas vezes conflituantes, perante:
- o cliente;
- os tribunais e outras autoridades junto das quais o advogado pleiteia ou representa o seu cliente;
- a advocacia em geral ou qualquer colega em particular;
- o público, para o qual a existência de uma profissão livre e independente, auto-regulada por normas vinculativas, é um elemento essencial para a defesa dos direitos humanos face ao poder do Estado e a outros instalados na sociedade.
1.2 - A natureza das regras profissionais e deontológicas
1.2 - 1 - As regras profissionais e deontológicas aplicáveis ao advogado estão adequadas a garantir, através da sua espontânea observância, o exercício correcto de uma função que é reconhecida como indispensável em todas as sociedades civilizadas. O incumprimento dessas regras pelo advogado é susceptível de ser objecto de sanções disciplinares.
1.2 - 2 - As regras próprias de cada Ordem ou organização de advogados decorrem das respectivas tradições e estão adaptadas à organização e âmbito de actividade em cada Estado Membro, aos procedimentos judiciais e administrativos e à legislação nacional. Não é possível nem desejável retirá-las do seu próprio contexto, nem deverá fazer-se uma aplicação genérica das regras que não sejam susceptíveis de tal aplicação.
Contudo, as regras próprias de cada Ordem ou organização de advogados baseiam-se em iguais valores e, na maioria dos casos, têm uma origem comum.
1.3 - Os objectivos do Código
1.3 - 1 - A integração progressiva da União Europeia (UE) e do Espaço Económico Europeu (EEE) e a intensificação da actividade transfronteiriça do advogado no interior do Espaço Económico Europeu tornaram necessária, na defesa do interesse público, a definição de regras uniformes aplicáveis a todos os advogados do espaço económico europeu na sua actividade transfronteiriça, qualquer que seja a Ordem de advogados a que pertençam. A definição de tais regras visa, nomeadamente, atenuar as dificuldades resultantes da aplicação de uma "dupla deontologia", designadamente conforme previsto no artigo 4.º e no n.º 2, do artigo 7.º da Directiva 77/249/CEE e nos artigos 6.º e 7.º da Directiva 98/5/CE.
1.3 - 2 - As organizações representativas da profissão de advogado reunidas no âmbito do CCBE propõem que as regras aqui codificadas:
Sejam desde já reconhecidas como a expressão da convicção comum de todas as ordens de advogados da União Europeia e do Espaço Económico Europeu;
Sejam adoptadas como regras vinculativas no mais curto prazo possível, de harmonia com os procedimentos nacionais ou do EEE, à actividade transfronteiriça do advogado na União Europeia e no Espaço Económico Europeu;
Sejam tidas em consideração em todas as revisões das regras deontológicas internas, com vista à progressiva harmonização das mesmas.
Pretendem ainda que, na medida do possível, as regras deontológicas internas, de cada Estado, sejam interpretadas e aplicadas de uma forma harmonizada com as do presente Código.
Após a adopção das regras do presente Código como vinculativas na actividade transfronteiriça, o advogado continuará sujeito à observância das regras da Ordem de advogados a que pertence, na medida em que estas sejam conformes com as do presente Código.
1.4 - Âmbito de aplicação ratione personae
Este código aplicar-se-á aos advogados, tal como definidos na Directiva 77/249/CEE e na Directiva 98/5/CE, assim como aos advogados sedeados em Membros-Observadores do CCBE.
1.5 - Âmbito de aplicação ratione materiae
Sem prejuízo do objectivo da progressiva harmonização das regras deontológicas ou profissionais aplicáveis internamente em cada Estado-Membro, as regras seguintes aplicar-se-ão às actividades transfronteiriças do advogado no interior da União Europeia e do Espaço Económico Europeu. Por actividade transfronteiriça considera-se:
Toda a relação profissional de um advogado de um Estado-Membro estabelecida com advogados de outro Estado-Membro;
As actividades profissionais de um advogado num Estado-Membro diferente do seu, mesmo que o advogado aí não se desloque.
1.6 - Definições
Neste Código:
«Estado-Membro» significa Estado-Membro da União Europeia ou qualquer outro estado cujos profissionais jurídicos estejam incluídos no artigo 1.4.
«Estado-Membro de Origem» significa o Estado-Membro no qual o advogado adquiriu o direito a usar o seu título profissional;
«Estado-Membro de Acolhimento» significa qualquer outro Estado-Membro no qual o advogado exerça uma actividade transfronteiriça;
«Autoridade competente» significa a ou as organizações profissionais ou autoridades do Estado-Membro em causa, responsáveis pela aprovação das regras profissionais e deontológicas e pelo exercício da jurisdição disciplinar sobre os advogados.
«Directiva 77/249/CEE» significa a Directiva 77/249/CEE do Conselho, de 22 Março de 1977 tendente a facilitar o exercício efectivo da livre prestação de serviços pelos advogados.
«Directiva 98/5/CE» significa a Directiva 98/5/CE do Parlamento e do Conselho Europeu de 16 Fevereiro de 1998 tendente a facilitar o exercício permanente da profissão de advogado num Estado-Membro diferente daquele em que foi adquirida a qualificação profissional.
2 - Princípios gerais
2.1 - Independência
2.1 - 1 - A multiplicidade de deveres a que o advogado está sujeito impõe-lhe uma independência absoluta, isenta de qualquer pressão, especialmente a que possa resultar dos seus próprios interesses ou de influências exteriores. Esta independência é tão necessária à confiança na justiça como a imparcialidade do juiz. O advogado deve, pois, evitar pôr em causa a sua independência e nunca negligenciar a ética profissional com a preocupação de agradar ao seu cliente, ao juiz ou a terceiros.
2.1 - 2 - Esta independência é necessária em toda e qualquer actividade do advogado, independentemente da existência ou não de um litígio concreto, não tendo qualquer valor o conselho dado ao cliente pelo advogado, se prestado apenas por complacência, ou por interesse pessoal ou sob o efeito de uma pressão exterior.
2.2 - Confiança e integridade moral
As relações de confiança só podem existir se a honestidade, a probidade, a rectidão e a sinceridade do advogado forem inquestionáveis. Para o advogado, estas virtudes tradicionais são obrigações profissionais.
2.3 - Segredo profissional
2.3 - 1 - É requisito essencial do livre exercício da advocacia a possibilidade do cliente revelar ao advogado informações que não confiaria a mais ninguém, e que este possa ser o destinatário de informações sigilosas só transmissíveis no pressuposto da confidencialidade. Sem a garantia de confidencialidade não pode haver confiança. O segredo profissional é, pois, reconhecido como direito e dever fundamental e primordial do advogado.
A obrigação do advogado de guardar segredo profissional visa garantir razões de interesse público, nomeadamente a administração da justiça e a defesa dos interesses dos clientes. Consequentemente, esta obrigação deve beneficiar de uma protecção especial por parte do Estado.
2.3 - 2 - O advogado deve respeitar a obrigação de guardar segredo relativamente a toda a informação confidencial de que tome conhecimento no âmbito da sua actividade profissional.
2.3 - 3 - A obrigação de guardar segredo profissional não está limitada no tempo.
2.3 - 4 - O advogado exigirá aos membros do seu pessoal e a todos aqueles que consigo colaborem na sua actividade profissional, a observância do dever de guardar segredo profissional a que o próprio está sujeito.
2.4 - Respeito pelas regras profissionais de outras organizações de advogados
Quando em actividade transfronteiriça, o advogado de um Estado-Membro pode ser obrigado a respeitar as regras profissionais da ordem de advogados do Estado-Membro de Acolhimento. Os advogados têm o dever de se informar acerca das regras a que estão sujeitos no exercício de qualquer actividade específica.
As organizações membros do CCBE estão obrigadas a depositar os seus códigos de deontologia no Secretariado do CCBE, a fim de que qualquer advogado possa obter uma cópia do código em vigor, junto do referido Secretariado.
2.5 - Incompatibilidades
2.5 - 1 - Para permitir ao advogado exercer a sua função com a independência necessária e em conformidade com o seu dever de colaborar na administração da justiça, o exercício de certas profissões ou funções pode ser declarado incompatível com a profissão de advogado.
2.5 - 2 - O advogado que assegure a representação ou a defesa de um cliente num processo judicial ou perante qualquer autoridade pública de um Estado-Membro de Acolhimento está sujeito às regras sobre incompatibilidades aplicáveis aos advogados desse Estado-Membro.
2.5 - 3 - O advogado estabelecido num Estado-Membro de Acolhimento que pretenda participar directamente numa actividade comercial ou noutra actividade diferente da advocacia respeitará as regras relativas a incompatibilidades, tais como são aplicadas aos advogados desse Estado-Membro.
2.6 - Publicidade pessoal
2.6 - 1 - O advogado pode informar o público dos serviços por si oferecidos, desde que tal informação seja verdadeira, objectiva, não induza em erro e respeite a obrigação de confidencialidade e outros deveres deontológicos essenciais.
2.6 - 2 - É permitida a publicidade pessoal do Advogado através de qualquer meio de comunicação, nomeadamente a imprensa, rádio, televisão, meios electrónicos ou outros, na medida em que cumpra os requisitos definidos no artigo 2.6.1.
2.7 - Os interesses do cliente
Sem prejuízo da estrita observância das normas legais e deontológicas, o advogado tem a obrigação de agir sempre em defesa dos interesses legítimos do seu cliente, em primazia sobre os seus próprios interesses ou dos colegas de profissão.
2.8 - Limitação da responsabilidade do advogado face ao cliente
Na medida em que a lei do Estado-Membro de Origem e a lei do Estado-Membro de Acolhimento o permitam, o advogado pode limitar a sua responsabilidade face ao cliente, de acordo com as normas profissionais a que se encontre sujeito.
3 - Relações com os clientes
3.1 - Aceitação e renúncia do patrocínio
3.1 - 1 - O advogado não pode aceitar o patrocínio se para tal não tiver sido mandatado pelo seu cliente. Contudo, o advogado pode ser mandatado por outro advogado que represente o cliente ou por uma entidade competente para cumprir esse mandato. O advogado deve esforçar-se, de forma razoável, por conhecer a identidade, a capacidade e os poderes de representação da pessoa ou da entidade que o tenha mandatado, quando as circunstâncias específicas revelem que essa identidade, capacidade e poderes de representação são incertos.
3.1 - 2 - O advogado deve aconselhar e defender o seu cliente com prontidão, consciência e diligência. O advogado assume pessoalmente a responsabilidade pelo cumprimento do mandato e deve informar o seu cliente da evolução do assunto que lhe foi confiado.
3.1 - 3 - O advogado não pode aceitar o patrocínio de uma questão para a qual saiba, ou deva saber, não ter a competência necessária, a não ser que actue conjuntamente com um advogado que tenha essa competência. O advogado só pode aceitar o patrocínio de uma questão se, tendo em conta as suas demais obrigações profissionais, puder ocupar-se dela de forma expedita.
3.1 - 4 - Não é legítimo ao advogado exercer o direito de renunciar ao patrocínio em circunstâncias donde possa resultar a impossibilidade do cliente obter, em tempo útil para evitar prejuízos, nova assistência jurídica.
3.2 - Conflito de interesses
3.2 - 1 - O advogado não pode aconselhar, representar ou agir por conta de dois ou mais clientes relativamente ao mesmo assunto, se existir um conflito ou um risco sério de conflito entre os interesses desses mesmos clientes.
3.2 - 2 - O advogado deve abster-se de se ocupar dos assuntos de ambos ou de todos os clientes envolvidos quando surja um conflito de interesses, quando exista risco de quebra de confidencialidade, ou quando a sua independência possa ser comprometida.
3.2 - 3 - O advogado deve abster-se de aceitar o patrocínio de um novo cliente se tal colocar em risco o cumprimento do dever de guardar sigilo profissional relativamente aos assuntos de um anterior cliente ou se do conhecimento desses assuntos resultarem vantagens injustificadas para o novo cliente.
3.2 - 4 - Quando os advogados exerçam a sua actividade em grupo, os n.os 3.2.1 a 3.2.3 são aplicáveis ao grupo no seu conjunto e a todos os seus membros.
3.3 - Pacto de quota litis
3.3 - 1 - É vedado ao advogado celebrar pactos de quota litis.
3.3 - 2 - Por pacto de quota litis entende-se o acordo entre o advogado e o seu cliente, antes da conclusão definitiva da questão em que este é parte, através do qual o cliente se compromete a entregar ao advogado uma parte do resultado que vier a obter, independentemente do resultado corresponder a uma soma em dinheiro ou a qualquer outro bem ou valor.
3.3 - 3 - Não constitui pacto de quota litis o acordo que preveja a determinação dos honorários em função do valor do assunto confiado ao advogado, desde que observe os termos de uma tabela oficial ou se tal acordo puder ser avaliado pela Autoridade Competente titular de jurisdição sobre o advogado.
3.4 - Fixação dos honorários
A conta de honorários apresentada pelo advogado deve conter a discriminação completa dos serviços prestados e o montante dos honorários deve ser moderado e justo, em conformidade com a lei e com as regras profissionais a que o advogado se encontra vinculado.
3.5 - Provisões para honorários e despesas
Se o advogado necessitar de uma provisão por conta dos honorários ou para pagamento de despesas, o montante da provisão não deverá exceder uma estimativa razoável dos honorários e das despesas prováveis. Não sendo entregue a provisão solicitada, o advogado pode recusar o patrocínio ou renunciar ao mesmo, sem prejuízo do cumprimento do disposto no n.º 3.1.4.
3.6 - Partilha de honorários com quem não seja advogado
3.6 - 1 - O advogado não pode partilhar os seus honorários com quem não seja advogado, excepto se a parceria entre o advogado e essa pessoa for autorizada pela lei e pelas regras profissionais a que o advogado se encontra vinculado.
3.6 - 2 - O disposto no n.º 3.6.1 não exime o advogado do pagamento dos honorários, comissões ou compensações devidas aos herdeiros de um colega falecido ou a um colega reformado a título da sua apresentação como sucessor da clientela desse colega.
3.7 - Custos do litígio, possibilidade de recurso ao benefício de apoio judiciário
3.7 - 1 - O advogado deve, a todo o tempo, procurar alcançar a solução economicamente mais adequada para o litígio do seu cliente e deverá, oportunamente, aconselhá-lo relativamente à viabilidade de tentar resolver o litígio por acordo e ou mediante meios alternativos de resolução de litígios.
3.7 - 2 - Se o cliente reunir condições para recorrer ao benefício de apoio judiciário, o advogado deve informá-lo dessa possibilidade.
3.8 - Fundos dos clientes
3.8 - 1. - Sempre que em qualquer momento o advogado detenha fundos por conta dos seus clientes ou de terceiros (doravante denominados "fundos dos clientes") deverá depositar esses montantes numa conta aberta num banco ou instituição similar sujeita à supervisão de uma autoridade pública (doravante designada "conta cliente"). A conta cliente será independente de qualquer outra conta do advogado. Todos os fundos dos clientes recebidos por um advogado devem ser depositados numa conta cliente, excepto se o titular dos fundos autorizar uma afectação diferente.
3.8 - 2. - O advogado deve manter registos completos e precisos relativos a todas as operações efectuadas com os fundos dos clientes, distinguindo-os de outras quantias por si detidas. Poderá ser exigido ao advogado que preserve esses registos durante um determinado período de tempo, de acordo com as regras nacionais.
3.8 - 3. - As contas-clientes não poderão ter saldo negativo, excepto em circunstâncias excepcionais expressamente previstas na legislação nacional ou devido a despesas bancárias, que não possam ser controladas pelo advogado. Estas contas não poderão em circunstância alguma ser utilizadas como garantia ou caução. Não poderá existir qualquer compensação ou fusão entre uma conta-cliente e qualquer outra conta bancária, nem poderão os fundos dos clientes numa conta-cliente ser disponibilizados para amortizar dívidas do advogado ao banco.
3.8 - 4. - Os fundos dos clientes devem ser entregues aos respectivos titulares no mais curto espaço de tempo ou de acordo com as condições por estes autorizadas.
3.8 - 5. - O advogado não pode transferir fundos de uma conta-cliente para a sua própria conta a título de pagamento de honorários sem informar o cliente por escrito.
3.8 - 6. - As Autoridades Competentes dos Estados Membros estão autorizadas a verificar e a examinar quaisquer documentos relativos aos fundos dos clientes, respeitando a confidencialidade e a obrigação legal de guardar segredo profissional a que possam estar sujeitos.
3.9 - Seguro de responsabilidade profissional
3.9 - 1 - O advogado manterá um seguro de responsabilidade civil profissional num montante razoável e adequado à natureza e âmbito dos riscos a que está sujeito na sua actividade profissional.
3.9 - 2 - No caso de não ser possível ao advogado celebrar um seguro em conformidade com as regras precedentes, deve o advogado informar os seus clientes dessa situação e das suas possíveis consequências.
4 - RELAÇÕES COM OS TRIBUNAIS
4.1 - Deontologia aplicável à actividade judiciária
O advogado que se apresente ou participe num procedimento perante uma autoridade judicial ou Tribunal, terá de observar as regras deontológicas aplicáveis nessa jurisdição.
4.2 - Dever de boa-fé e de lealdade processual
O advogado deve, em todas as circunstâncias, observar o princípio da boa fé e da lealdade processual e o carácter contraditório dos debates.
4.3 - Conduta em Tribunal
Salvaguardando o respeito e a urbanidade devidos ao Tribunal, o advogado defenderá o seu cliente honradamente e sem medo, abstraindo-se dos seus próprios interesses e de quaisquer consequências que possam resultar para si ou qualquer outra pessoa.
4.4 - Informações falsas ou susceptíveis de induzir em erro
Em momento algum deve o advogado, conscientemente, fornecer ao Tribunal uma informação falsa ou susceptível de o induzir em erro.
4.5 - Aplicação aos árbitros e a pessoas que exerçam funções semelhantes
As regras aplicáveis às relações do advogado com os Tribunais aplicam-se igualmente às relações do advogado com árbitros, peritos ou com qualquer outra pessoa que exerça funções jurisdicionais ou quase-jurisdicionais, ainda que a título ocasional.
5 - Relações entre advogados
5.1 - Solidariedade profissional
5.1 - 1 - A solidariedade profissional exige, em benefício dos clientes e a fim de evitar litígios inúteis, ou qualquer outro comportamento susceptível de denegrir a reputação da profissão, uma relação de confiança e de cooperação entre os advogados. Porém, a solidariedade profissional nunca pode ser invocada para colocar os interesses da profissão contra os interesses do cliente.
5.1 - 2 - O advogado deve reconhecer como colega todo o advogado de outro Estado-Membro, tratando-o com lealdade e com urbanidade.
5.2 - Cooperação entre advogados de diferentes Estados-Membros
5.2 - 1 - O advogado a quem um colega de outro Estado-Membro se dirija deve abster-se de aceitar um assunto para o qual não tenha competência. Nesse caso, deve procurar facultar ao colega as informações necessárias que lhe permitam contactar um advogado que esteja em condições de prestar o serviço pretendido.
5.2 - 2 - Sempre que advogados de dois Estados-Membros diferentes trabalhem em conjunto têm o dever de tomar em consideração as diferenças que possam existir entre os seus sistemas jurídicos e as suas ordens de advogados, e entre as competências e os deveres do advogado, nos respectivos Estados Membros.
5.3 - Correspondência entre advogados
5.3 - 1 - O advogado que pretenda dirigir a um colega de um outro Estado-Membro uma comunicação que pretenda ter carácter «confidencial» ou «sob reserva» deve exprimir claramente essa intenção previamente ao envio dessa comunicação.
5.3 - 2 - No caso do destinatário da comunicação não estar em condições de assegurar o seu carácter «confidencial» ou «sob reserva», deve imediatamente informar o remetente dessa situação.
5.4 - Honorários de angariação
5.4 - 1 - O advogado não pode solicitar nem aceitar honorários, comissões ou qualquer outra compensação de um advogado ou de terceiros, por recomendar ou encaminhar um advogado a um cliente.
5.4 - 2 - O advogado não pode pagar a ninguém honorários, comissões ou qualquer outra compensação em contrapartida pela angariação de um cliente.
5.5 - Comunicações com a parte contrária
O advogado não pode contactar directamente uma pessoa que saiba encontrar-se representada ou assistida por um outro advogado, sobre determinado assunto, sem o consentimento deste (e, neste caso, deve manter o colega informado sobre os contactos que ocorram).
5.6 - (Revogado por deliberação da Sessão Plenária de Dublin, de 6 de Dezembro de 2002)
5.7 - Responsabilidade pelo pagamento de honorários
No âmbito das relações entre advogados de ordens de advogados de Estados-Membros diferentes, o advogado que, não se limitando a recomendar um colega ou a apresentá-lo a um cliente, lhe confie um assunto concreto ou lhe solicite colaboração, fica pessoalmente responsável pelo pagamento dos honorários, despesas e reembolsos devidos ao advogado estrangeiro, mesmo em caso de insolvência do cliente. Os advogados em questão podem, no entanto, acordar regras específicas quanto a esta matéria no início das suas relações. Além disso, o advogado mandante pode, a todo o momento, limitar a sua responsabilidade pessoal ao montante dos honorários, despesas e reembolsos realizados até à notificação ao colega estrangeiro da declaração de escusa de responsabilidade para o futuro.
5.8 - Formação profissional contínua
Os advogados devem actualizar e melhorar o seu nível de conhecimento e das suas competências profissionais, tendo em consideração a dimensão Europeia da sua profissão.
5.9 - Litígios entre advogados de vários Estados-Membros
5.9 - 1 - Quando um advogado considere que um colega de outro Estado-Membro violou uma regra profissional e deontológica deve chamar a atenção do colega para esse facto.
5.9 - 2 - Sempre que qualquer diferendo pessoal de natureza profissional surja entre advogados de vários Estados-Membros, devem os mesmos, em primeiro lugar, tentar resolver a questão de forma amigável.
5.9 - 3 - O advogado não deve iniciar um processo contra um colega de outro Estado-Membro, relativo a um litígio previsto nos n.os 5.9.1 e 5.9.2, sem previamente informar as ordens de advogados de que ambos dependem, por forma a conceder-lhes a oportunidade de mediarem a resolução amigável do diferendo.
MEMORANDO EXPLICATIVO
Este Memorando Explicativo foi preparado, a pedido do Comité Permanente do CCBE, pelo Grupo de Trabalho de Deontologia do CCBE, que já havia sido responsável pela elaboração da primeira versão do Código de Conduta propriamente dito. O seu objectivo é explicar o sentido e a origem das disposições contidas no Código, ilustrar os problemas para cuja resolução aquelas foram concebidas - particularmente no que respeita a actividades transfronteiriças - e auxiliar as Autoridades Competentes dos Estados-Membros na interpretação do Código. O Memorando Explicativo foi actualizado na Sessão Plenária do CCBE de 19 de Maio de 2006.
As versões originais do Código foram redigidas nas línguas Inglesa e Francesa. As traduções para outras línguas Comunitárias são da responsabilidade das respectivas delegações nacionais.
Comentário ao artigo 1.1 - A função do Advogado na sociedade
A Declaração de Perugia, adoptada pelo CCBE em 1977, estabeleceu os princípios fundamentais da deontologia profissional aplicáveis aos advogados na Comunidade Europeia. As disposições do artigo 1.1 reafirmam a declaração de princípios contida na Declaração de Perugia relativa à função do advogado na sociedade, a qual constitui o fundamento e base das regras que regulam o desempenho dessa função.
Comentário ao artigo 1.2 - A Natureza das Regras Profissionais e Deontológicas
Estas disposições reafirmam, no essencial, a explicação encontrada na Declaração de Perugia sobre a natureza das regras profissionais e deontológicas e como algumas dessas regras dependem das circunstâncias particulares locais, mas que mesmo nesses casos são baseadas em princípios gerais comuns.
Comentário ao artigo 1.3 - Os Objectivos do Código
Estas disposições explicam a evolução dos princípios contidos na Declaração de Perugia para um Código de Conduta específico para advogados na União Europeia e no Espaço Económico Europeu, assim como para advogados dos Membros-Observadores do CCBE, com especial referência às suas actividades transfronteiriças (definidas no artigo 1.5). As disposições do artigo 1.3.2 descrevem as intenções específicas do CCBE relativamente às disposições substantivas do Código.
Comentário ao artigo 1.4 - Âmbito de Aplicação ratione personae
As regras serão aplicáveis a todos os advogados tal como definido na Directiva relativa à livre prestação de serviços por advogados de 1977 e na Directiva relativa ao exercício permanente da profissão de advogado de 1998, e aos advogados dos Membros-Observadores do CCBE. Incluem-se os advogados dos Estados que subsequentemente aderiram às Directivas e cujos nomes foram acrescentados por revisão das mesmas. O Código aplica-se igualmente a todos os advogados representados no CCBE, sejam eles Membros ou Membros-Observadores, nomeadamente:
Alemanha Rechtsanwalt;
Áustria Rechtsanwalt;
Bélgica avocat / advocaat / Rechtsanwalt;
Bulgária advokat;
Croácia adjetnik;
Chipre dikegóros;
Dinamarca advokat;
Eslováquia advokát / advokátka;
Eslovénia advetnik / odvetnica;
Espanha abogado / advocat / abokatu / avogado
Estónia vandeadvokaat;
Finlândia asianajaja / advokat;
França avocat;
FYROM/Macedóni advokat;
Grécia dikegóros;
Holanda advocaat;
Hungria ügyvéd;
Irlanda barrister, solicitor;
Islândia lögmaõur;
Itália avvocato;
Letónia zverinãts advokãts;
Liechtenstein Rechtsanwalt;
Lituânia advokatas;
Luxemburgo avocat / Rechtsanwalt;
Malta avukat, procuratur legali;
Noruega advokat;
Polónia adwokat, radca prawny;
Portugal advogado;
Reino Unido advocate, barrister, solicitor;
República Checa advokát;
Roménia avocat;
Suécia advokat;
Suiça Rechtsanwalt / Anwalt / Fürsprech / Fürsprecher / avocat / avvocato / advokat;
Turquia avukat;
Ucrânia advocate.
Espera-se também que o Código seja aceitável para os profissionais jurídicos de Estados não-Membros do CCBE, na Europa e fora dela, possibilitando a sua aplicação através de convenções apropriadas entre os referidos Estados não-Membros e os Estados-Membros.
Comentário ao artigo 1.5 - Âmbito de Aplicação ratione materiae
Por força deste artigo as regras assumem aplicação directa apenas em "actividades transfronteiriças", tal como aqui definidas, de advogados sedeados na UE e no Espaço Económico Europeu, assim como de advogados sedeados em Membros-Observadores do CCBE - vide artigo 1.4 supra e a definição de "Estado-Membro" no artigo 1.6. (veja-se ainda a possibilidade de aplicação, no futuro, a advogados sedeados noutros estados). A definição de actividades transfronteiriças inclui, por exemplo, contactos no estado A sobre questões legais internas do estado A, entre um advogado sedeado no estado A e outro sedeado no estado B; excluir-se-iam os contactos no estado A entre advogados sedeados no estado A sobre questões emergentes no estado B, desde que nenhum dos advogados exercesse actividade no estado B; incluem-se quaisquer actividades no estado B, de advogados sedeados no estado A, ainda que tais actividades não passassem de comunicações enviadas do estado A para o estado B.
Comentário ao artigo 1.6 - Definições
Este artigo define vários termos utilizados no Código, "Estado-Membro", "Estado-Membro de Origem", "Estado-Membro de Acolhimento", "Autoridade Competente", "Directiva 77/249/CEE" e "Directiva 98/5/CE".
A referência a "onde o advogado desenvolve actividades transfronteiriças" deverá ser interpretada à luz da definição de "actividades transfronteiriças" do artigo 1.5.
Comentário ao artigo 2.1 - Independência
Esta disposição reafirma, no essencial, os princípios gerais contidos na Declaração de Perugia.
Comentário ao artigo 2.2 - Confiança e Integridade Moral
Esta disposição também reafirma um princípio geral da Declaração de Perugia.
Comentário ao artigo 2.3 - Segredo Profissional
Esta disposição começa, no artigo 2.3.1, por reafirmar princípios gerais da Declaração de Perugia e reconhecidos pelo TJCE no caso AM&S (157/79). Posteriormente, nos artigos 2.3.2 até 2.3.4, desenvolve esses princípios numa regra específica relacionada com a protecção da confidencialidade. O artigo 2.3.2 contém uma regra básica ao determinar a obrigatoriedade do respeito pela confidencialidade. O artigo 2.3.3 confirma que o advogado permanece vinculado a essa obrigação ainda que deixe de representar o cliente em questão. O artigo 2.3.4 confirma que o advogado deve respeitar não apenas ele próprio essa confidencialidade, mas também exigir a todos os membros e funcionários da sua firma que procedam da mesma forma.
Comentário ao artigo 2.4 - Respeito pelas Regras Profissionais das outras organizações de advogados
O artigo 4.º da Directiva 77/249/CEE "Livre Prestação de Serviços", a seguir transcrito, contém as disposições relativas às regras a observar por um advogado de um Estado-Membro, que preste serviços numa base ocasional ou temporária noutro Estado-Membro ao abrigo do artigo 49.º do Tratado da CE consolidado:
"Artigo 4.º
1 - As actividades relativas à representação e à defesa de um cliente em juízo ou perante autoridades públicas serão exercidas em cada Estado-membro de acolhimento nas condições previstas quanto aos advogados estabelecidos nesse Estado, com exclusão de qualquer requisito de residência ou de inscrição numa organização profissional no referido Estado.
2 - No exercício destas actividades, o advogado respeitará as regras profissionais do Estado-membro de acolhimento, sem prejuízo das obrigações a que esteja sujeito no Estado-membro de proveniência.
3 - Se essas actividades forem exercidas no Reino Unido, entendem-se por «regras profissionais do Estado-membro de acolhimento» as dos «solicitors», desde que tais actividades não estejam reservadas aos «barristers» ou aos «advocates». No caso contrário, serão aplicáveis as regras profissionais relativas aos últimos. Todavia, os «barristers» provenientes da Irlanda ficarão sempre sujeitos às regras profissionais dos «barristers» ou dos «advocates» do Reino Unido.
Se essas actividades forem exercidas na Irlanda, entendem-se por «regras profissionais do Estado-membro de acolhimento» as dos «barristers», desde que se trate de regras profissionais que regulamentem a apresentação oral de uma causa em tribunal. Em todos os demais casos, serão aplicáveis as regras profissionais dos «solicitors». Todavia, os «barristers» e os «advocates» provenientes do Reino Unido ficarão sempre sujeitos às regras profissionais dos «barristers» da Irlanda.
4 - No que respeita ao exercício de actividades diferentes das referidas no n.º 1, o advogado continuará sujeito às condições e regras profissionais do Estado-membro de proveniência, sem prejuízo do respeito das regras, seja qual for a sua origem, que regulamentam a profissão no Estado-membro de acolhimento, nomeadamente, as relativas às incompatibilidades entre o exercício das actividades de advogado e o de outras actividades nesse Estado, do segredo profissional, às relações entre colegas, à proibição de assistência pelo mesmo advogado a partes com interesses opostos, e à publicidade. Tais regras só serão aplicáveis se puderem ser cumpridas por um advogado não estabelecido no Estado membro de acolhimento e na medida em que o seu cumprimento se justifique objectivamente para assegurar, nesse Estado, o exercício correcto das actividades do advogado, a dignidade da profissão e o respeito das incompatibilidades."
(JOCE, Edição especial portuguesa, 1985, Capítulo 06, Fascículo 1 p. 224)
A Directiva 98/5/CE ("Exercício Permanente") contém as disposições, que a seguir se transcrevem, relativas às regras a observar por um advogado de um Estado-Membro que exerça a sua actividade a título permanente noutro Estado-Membro em conformidade com o artigo 43.º do Tratado CE consolidado:
"Artigo 6.º
Regras profissionais e deontológicas aplicáveis
1 - Independentemente das regras profissionais e deontológicas a que está sujeito no seu Estado-membro de origem, o advogado que exerça com o título profissional de origem fica submetido às mesmas regras profissionais e deontológicas aplicáveis aos advogados que exerçam com o título profissional adequado do Estado-membro de acolhimento, relativamente a todas as actividades que desenvolva no território deste último.
(...)
3 - O Estado-membro de acolhimento pode exigir que o advogado que exerça com o título profissional de origem subscreva um seguro de responsabilidade profissional ou se inscreva num fundo de garantia profissional, de acordo com as regras por si fixadas para as actividades profissionais exercidas no seu território. Contudo, o advogado que exerça com o título profissional de origem será dispensado dessa obrigação se provar estar coberto por um seguro ou por uma garantia subscrita de acordo com as regras do Estado-membro de origem, desde que estes sejam equivalentes quanto às modalidades e ao âmbito de cobertura. Se essa equivalência for apenas parcial, a autoridade competente do Estado-membro de acolhimento pode exigir um seguro ou uma garantia complementar que abranja os elementos ainda não cobertos pelo seguro ou pela garantia subscrita de acordo com as regras do Estado-membro de origem.
(...)
Artigo 8.º
Exercício assalariado
O advogado inscrito no Estado-membro de acolhimento com o título profissional de origem pode exercer na qualidade de advogado assalariado de outro advogado, de uma associação ou sociedade de advogados, ou de uma empresa pública ou privada, na medida em que o Estado-membro de acolhimento o permita aos advogados inscritos com o título profissional desse Estado-membro."
(JOCE L 77, de 14.3.98.)
Nos casos não previstos em qualquer destas Directivas ou que ultrapassem os seus requisitos, a obrigação do advogado perante a lei Comunitária de observar as regras de outras Ordens de Advogados fica sujeita à interpretação das disposições aplicáveis, tais como a Directiva sobre Comércio Electrónico (2000/31/CE). Um dos objectivos principais do Código é minimizar e, se possível, eliminar completamente os problemas que possam emergir devido a "dupla deontologia", ou seja, da aplicação de mais do que um conjunto de regras nacionais potencialmente conflituantes numa determinada situação (vide artigo 1.3.1).
Comentário ao artigo 2.5 - Incompatibilidades
Existem diferenças entre estados e mesmo dentro de alguns estados relativamente aos termos em que é permitido aos advogados dedicarem-se a outras actividades, tais como actividades comerciais. O objectivo geral das regras que proíbem os advogados de exercer outras funções é protegê-los de influências que possam comprometer a sua independência ou o seu papel na administração da justiça. As variações nestas regras reflectem diferentes condições locais, diferentes perspectivas relativamente à função que o advogado deve desempenhar e diferentes técnicas de legislar. Por exemplo, em alguns casos existe uma proibição total do exercício de determinadas actividades, enquanto que noutros casos o exercício de outras actividades é, de uma forma geral, permitido, desde que sejam observadas determinadas medidas de salvaguarda da independência do advogado.
Os artigos 2.5.2 e 2.5.3 contêm regras para as diferentes circunstâncias nas quais um advogado de um determinado Estado-Membro exerce actividades transfronteiriças (tal como definido no artigo 1.5) num Estado-Membro de Acolhimento, sem estar inscrito como advogado neste Estado-Membro.
O artigo 2.5.2 impõe o estrito cumprimento das regras do Estado de Acolhimento relativas a incompatibilidades, por parte do advogado que exerça a sua actividade perante a jurisdição ou autoridades públicas no Estado de Acolhimento, independentemente de estar estabelecido nesse estado ou não.
O artigo 2.5.3, por outro lado, determina a obrigação de "respeito" pelas regras do Estado de Acolhimento relativas a actividades proibidas ou incompatíveis noutros casos, mas apenas quando o advogado se encontra estabelecido no Estado-Membro de Acolhimento e deseja participar directamente em actividades comerciais ou outras actividades não relacionadas com o exercício da advocacia.
Comentário ao artigo 2.6 - Publicidade pessoal
O termo "publicidade pessoal" refere-se à publicidade das sociedades de advogados, assim como à de advogados por conta própria, e não à publicidade organizada pelas Ordens de Advogados no sentido de promover a classe. As regras relativas à publicidade pessoal pelos advogados variam consideravelmente entre os Estados-Membros. O artigo 2.6 deixa bem claro que não existem objecções de carácter substantivo relativamente à publicidade pessoal em actividades transfronteiriças. Contudo, os advogados estão sempre sujeitos às proibições ou restrições impostas pelas regras profissionais do seu Estado de origem, e às regras do Estado de Acolhimento sempre que estas vinculem o advogado através da Directiva 77/249/CEE ("Livre Prestação de Serviços") ou da Directiva 98/5/CE ("Exercício Permanente").
Comentário ao artigo 2.7 - Os interesses do Cliente
Esta disposição enfatiza o princípio geral de que o advogado deverá sempre colocar os interesses do seu cliente à frente dos seus próprios interesses e daqueles dos seus colegas de profissão.
Comentário ao artigo 2.8 - Limitação da responsabilidade do advogado face ao cliente
Esta disposição deixa claro que não existem objecções de carácter substantivo à limitação da responsabilidade do advogado relativamente ao seu cliente no desempenho de actividades transfronteiriças, seja através de contrato, ou mediante sociedades de responsabilidade limitada, sociedades em comandita simples ou sociedades por quotas. Contudo, ressalva que esta faculdade depende da sua conformidade com a legislação e as regras profissionais aplicáveis - e existem várias jurisdições em que a lei e as regras profissionais proíbem ou restringem a limitação de responsabilidade.
Comentário ao artigo 3.1 - Aceitação e renúncia do patrocínio
As disposições do artigo 3.1.1 foram elaboradas com o intuito de assegurar que existe uma relação real e efectiva entre o advogado e o seu cliente e que o advogado recebe de facto instruções do seu cliente, ainda que estas possam ser transmitidas através de um intermediário devidamente autorizado. Cabe ao advogado certificar-se da competência do intermediário e das intenções do seu cliente.
O artigo 3.1.2 refere-se à forma como o advogado deve desempenhar a sua função. A disposição que determina que o advogado será pessoalmente responsável pelo cumprimento das instruções do seu cliente significa que o advogado não poderá evitar a sua responsabilidade delegando o cumprimento das instruções noutras pessoas. Não obstante, o advogado pode procurar limitar a sua responsabilidade legal na medida em que tal for permitido pela legislação e regras profissionais aplicáveis - vide artigo 2.8.
O artigo 3.1.3 afirma um princípio que assume particular importância nas actividades transfronteiriças, por exemplo quando é pedido a um advogado que se encarregue de uma questão a pedido de um advogado ou cliente de um outro Estado que eventualmente não esteja familiarizado com a legislação e prática envolvida, ou quando é pedido a um advogado que se encarregue de uma questão relacionada com a lei de outro Estado e com a qual ele esteja pouco familiarizado.
O advogado tem geralmente o direito a recusar encarregar-se de um assunto. Porém, de acordo com o artigo 3.1.4, uma vez tendo aceite encarregar-se do assunto do cliente, só poderá deixar de se ocupar dele depois de assegurar que os interesses do cliente estão salvaguardados.
Comentário ao artigo 3.2 - Conflito de Interesses
As disposições do artigo 3.2.1 não impedem o advogado de representar dois ou mais clientes numa mesma questão desde que os interesses destes não estejam em conflito e desde que não exista risco significativo de que tal venha a acontecer. Quando o advogado já representa dois ou mais clientes desta forma e surge um conflito de interesses entre esses clientes ou existe risco de quebra de confidencialidade ou outras circunstâncias potencialmente comprometedoras da independência do advogado, este deverá cessar a representação de ambos ou de todos esses clientes.
Contudo, podem ocorrer situações de diferendo entre dois ou mais dos seus clientes onde se justifique que o advogado tente intervir como mediador. Nesses casos, cabe ao advogado julgar por si próprio se existe ou não um conflito de interesses que obrigue à cessação da representação dos seus clientes. Caso tal não se verifique, o advogado poderá considerar apropriado expor a situação aos clientes, obter o seu consentimento e tentar agir como mediador na resolução das suas diferenças. Nesse caso, o advogado só deverá cessar a representação dos clientes se a tentativa de mediação falhar.
O artigo 3.2.4 estende as disposições dos artigos precedentes - 3.2.1, 3.2.2 e 3.2.3 - aos advogados que exercem a sua actividade em grupo. Por exemplo, uma sociedade de advogados deverá cessar a sua representação quando exista um conflito de interesses entre dois dos seus clientes, ainda que esses clientes sejam acompanhados por diferentes advogados da sociedade. Por outro lado, na forma de associação tipo chambers utilizada pelos barristers Ingleses, onde cada advogado representa os clientes individualmente, é possível a diferentes advogados que trabalhem naquele tipo de associação representarem clientes com interesses conflituantes.
Comentário ao artigo 3.3 - Pactum de Quota Litis
Estas disposições reflectem a posição comum a todos os Estados-Membros de que um acordo de fixação de honorários que faça depender o recebimento destes do desfecho positivo da causa (Contigency Fees/Pactum de Quota Litis) não sujeito a regras adequadas, é contrário ao princípio da boa administração de justiça por encorajar a litigância de má-fé e ser passível de abusos. Não se pretende, contudo, impedir a continuidade ou a celebração de acordos segundo os quais os advogados são remunerados em função dos resultados ou apenas se a acção ou questão tiver um desfecho positivo, desde que tais acordos sejam adequadamente regulados e controlados no sentido de garantir a protecção do cliente e a boa administração da justiça.
Comentário ao artigo 3.4 - Fixação dos Honorários
O artigo 3.4 define três requisitos: um padrão geral de transparência dos honorários dos advogados relativamente ao cliente, que os honorários sejam justos e adequados, e a sua conformidade com a lei e com as regras profissionais aplicáveis.
Em muitos Estados-Membros existem mecanismos de regulação dos honorários dos advogados nos termos da legislação nacional ou das regras deontológicas, seja através da concessão às Ordens de advogados ou Autoridades Competentes da faculdade de mediar e arbitrar a fixação dos honorários ou através de outro mecanismo. Nas situações abrangidas pela Directiva 98/5/CE ("Exercício Permanente") em que o advogado está sujeito às regras do Estado de Origem assim como às do Estado de Acolhimento, a base para o cálculo dos honorários poderá ter que estar em conformidade com as regras de ambos os Estados.
Comentário ao artigo 3.5 - Provisões para honorários e despesas
O artigo 3.5 estipula que o advogado pode solicitar um adiantamento por conta dos seus honorários e ou despesas, mas estabelece um limite por referência a uma estimativa razoável desses honorários ou despesas. Ver também o artigo 3.1.4 relativamente ao direito de renunciar ao patrocínio.
Comentário ao artigo 3.6 - Partilha de Honorários com quem não seja advogado
Em alguns Estados-Membros é permitido aos advogados exercerem a sua actividade em associação com membros de determinadas profissões reguladas, sejam estas ou não relacionadas com o Direito. O disposto no artigo 3.6.1 não foi concebido com o intuito de impedir a partilha de honorários nessa forma de associação autorizada, nem a partilha de honorários entre advogados a quem o Código se aplica (vide artigo 1.4 supra) e outros "advogados", tais como, por exemplo, advogados de Estados não-Membros ou membros de outras profissões jurídicas nos Estados-Membros, tais como os notários.
Comentário ao artigo 3.7 - Custos do litígio, possibilidade de recurso ao benefício de apoio judiciário
O artigo 3.7.1 salienta a importância de tentar resolver os litígios de forma económica para o cliente, incluindo o aconselhamento relativamente a quando (ou) se deve tentar negociar um acordo, ou relativamente ao recurso a formas alternativas de resolução de litígios.
O artigo 3.7.2 impõe ao advogado o dever de informar o cliente da disponibilidade de apoio judiciário quando este exista. Existem regras muito diferentes entre os Estados-Membros relativamente à disponibilidade de apoio judiciário. Em actividades transfronteiriças, o advogado deverá ter em conta a possibilidade de apoio judiciário disponível segundo leis nacionais com as quais esteja pouco familiarizado.
Comentário ao artigo 3.8 - Fundos dos Clientes
O disposto no artigo 3.8 reflecte a recomendação adoptada pelo CCBE em Bruxelas, em Novembro de 1985, sobre a necessidade de criar e implementar regras mínimas para a gestão e utilização dos fundos dos clientes detidos pelos advogados na UE. O artigo 3.8 estabelece as regras mínimas que devem ser observadas, sem interferir com as especificidades dos sistemas nacionais que oferecem uma protecção mais abrangente ou mais restrita para os fundos dos clientes.
Os advogados que detenham fundos dos clientes, ainda que no decurso de actividades transfronteiriças, deverão observar as regras da Ordem de que dependem. Os advogados deverão estar cientes das questões que podem emergir da aplicação simultânea das regras de dois Estados-Membros, especialmente quando o advogado se encontre estabelecido num Estado de Acolhimento nos termos da Directiva 98/5/CE ("Exercício Permanente").
Comentário ao artigo 3.9 - Seguro de responsabilidade profissional
O artigo 3.9.1 reflecte uma recomendação, também adoptada pelo CCBE em Bruxelas em Novembro de 1985, relativa à necessidade de todos os advogados da Comunidade estarem segurados contra os riscos que possam emergir de queixas de negligência profissional.
O artigo 3.9.2. refere-se às situações em que não é possível obter um seguro nos termos definidos no artigo 3.9.1.
Comentário ao artigo 4.1 - Deontologia aplicável à actividade judiciária
Esta disposição concretiza o princípio de que um advogado é obrigado a respeitar as regras do tribunal ou jurisdição equivalente perante o qual se apresente ou participe.
Comentário ao artigo 4.2 - Dever de boa-fé e de lealdade processual
Este artigo concretiza o princípio geral de que em acções que devam respeitar o princípio do contraditório, o advogado não deve tentar aproveitar-se de forma desleal da parte contrária. O advogado não deverá, por exemplo, contactar um juiz sobre um caso sem informar previamente o advogado da parte contrária. Não pode enviar provas, exposições ou outros documentos a um juiz sem que os mesmos sejam comunicados em tempo útil ao advogado da parte contrária, salvo se tais actuações forem permitidas pela lei processual aplicável. Na medida em que a lei não o proíba, o advogado não pode divulgar ou submeter aos tribunais uma proposta para solucionar a questão apresentada pela parte contrária ou pelo seu advogado sem a autorização expressa do advogado da parte contrária. (Ver também artigo 4.5 infra).
Comentário ao artigo 4.3 - Conduta em Tribunal
Este artigo reflecte o equilíbrio necessário entre o respeito pelo tribunal e pela lei, por um lado, e a prossecução dos interesses do cliente, por outro.
Comentário ao artigo 4.4 - Informações falsas ou susceptíveis de induzir em erro
Este artigo concretiza o princípio de que o advogado nunca deverá conscientemente induzir o tribunal em erro. Esta é uma condição fundamental para que se crie uma relação de confiança entre os tribunais e os advogados.
Comentário ao artigo 4.5 - Aplicação aos árbitros e a pessoas que exerçam funções semelhantes
Este artigo alarga o âmbito de aplicação dos artigos anteriores a outras entidades com funções jurisdicionais ou quase-jurisdicionais.
Comentário ao artigo 5.1 - Solidariedade Profissional
Estas disposições, baseadas na Declaração de Perugia, salientam que é do interesse público que os membros da classe profissional mantenham uma relação de confiança e cooperação entre si. Contudo, isto não pode ser utilizado para justificar a colocação dos interesses da classe profissional acima dos da justiça ou dos clientes (vide artigo 2.7).
Comentário ao artigo 5.2 - Cooperação entre advogados de diferentes Estados-Membros
Esta disposição consagra, igualmente, um princípio presente na Declaração de Perugia, com o objectivo de evitar mal-entendidos nas relações entre advogados de diferentes Estados-Membros.
Comentário ao artigo 5.3 - Correspondência entre advogados
Em determinados Estados-Membros as comunicações entre advogados (por escrito ou orais) são normalmente tidas como confidenciais entre os advogados. Isto significa que o conteúdo dessas comunicações não pode ser divulgado a terceiros, não pode, em regra, ser transmitido aos clientes dos advogados, e não pode, em circunstância alguma, constituir meio de prova em tribunal. Noutros Estados-Membros, essas regras de confidencialidade só serão consideradas se a correspondência for expressamente classificada como "confidencial".
Noutros Estados-Membros ainda, o advogado é obrigado a manter o cliente a par de todas as comunicações relevantes provenientes do advogado da outra parte, e a classificação da carta como "confidencial" significa apenas que se trata de um assunto legal dirigido ao advogado destinatário e ao seu cliente, e que não deverá ser utilizado indevidamente por terceiros.
Em alguns Estados, se um advogado pretende assinalar que uma carta é enviada numa tentativa de resolver um litígio, e que não deverá ser produzida em tribunal, deverá classificar a carta como «sob reserva» / «without prejudice».
Frequentemente, estas diferenças importantes entre países dão origem a numerosos mal-entendidos. Por este motivo, os advogados deverão ser muito cuidadosos relativamente à correspondência transfronteiriça.
Sempre que um advogado pretenda enviar uma carta a um colega de profissão de outro Estado-Membro numa base de confidencialidade, ou classificada como "sob reserva", deverá perguntar antecipadamente se a carta pode ser aceite nessa base. O advogado que pretenda que a comunicação dirigida a outro advogado tenha carácter confidencial, deve demonstrá-lo claramente no cabeçalho da comunicação ou na página de capa.
O advogado destinatário de tal comunicação, e que não esteja em posição de respeitar ou garantir a confidencialidade da mesma, deve informar o remetente imediatamente, de forma a que a comunicação não seja enviada. Caso a comunicação já tiver sido recebida, o destinatário deverá devolvê-la ao remetente sem revelar o respectivo conteúdo ou referir-se a este de forma alguma; se a lei ou demais regras nacionais do destinatário não permitirem a observância deste requisito, o destinatário deverá informar o remetente imediatamente.
Comentário ao artigo 5.4 - Honorários de angariação
Estas disposições reflectem o princípio que o advogado não deve pagar ou receber pagamento pelo simples facto de recomendar um advogado ou pelo encaminhamento de um cliente, na medida em que tal poderia colocar em risco a livre escolha de mandatário pelo cliente ou o interesse do cliente em ser encaminhado para o melhor serviço disponível. Isto não inviabiliza os acordos de repartição de honorários entre advogados devidamente fundamentados (cf. artigo 3.6 supra).
Em alguns Estados-Membros é permitido aos advogados aceitar e guardar comissões em certos casos, desde que no interesse do cliente, com pleno conhecimento deste e quando o cliente tenha consentido na retenção da comissão. Nestes casos, a retenção da comissão pelo advogado constitui uma parte da remuneração pelos serviços prestados ao cliente e não é abrangida pela proibição de recebimento de honorários por encaminhamento, a qual visa evitar que os advogados tenham proveitos secretos.
Comentário ao artigo 5.5 - Comunicações com a parte contrária
Este artigo reflecte um princípio geralmente aceite e que foi concebido para promover o bom relacionamento profissional entre advogados e impedir qualquer tentativa de aproveitamento do cliente de outro advogado.
Comentário ao artigo 5.6 - Mudança de Advogado
O artigo 5.6. referia-se à mudança de advogado. Foi revogado em 6 de Dezembro de 2002.
Comentário ao artigo 5.7 - Responsabilidade pelo pagamento de honorários
Estas disposições reafirmam, no essencial, o estipulado na Declaração de Perugia. Uma vez que os mal-entendidos emergentes da responsabilidade por honorários em dívida são uma causa comum de diferendos entre advogados de diferentes Estados-Membros, é importante que o advogado que pretenda excluir ou limitar a sua responsabilidade pessoal pelo pagamento dos honorários de um colega estrangeiro defina claramente essa questão no início da transacção.
Comentário ao artigo 5.8 - Formação profissional contínua
Manter-se a par da evolução do Direito é uma obrigação profissional. É particularmente importante que os advogados estejam conscientes da crescente importância do Direito Europeu na sua área de actividade.
Comentário ao artigo 5.9 - Litígios entre advogados de vários Estados-Membros
O advogado pode exigir de um colega de outro Estado-Membro uma reparação legal ou de outra ordem à qual tenha direito. Não obstante, é preferível que, nos casos que envolvam a violação de uma regra deontológica ou um diferendo de natureza profissional, todos os meios de resolução amigável de disputas sejam esgotados, se necessário com o auxílio das respectivas Ordens de Advogados, antes de tais reparações serem exercidas».