António Menezes Cordeiro - A lealdade no direito das sociedades


Pelo Prof. Doutor António Menezes Cordeiro

SUMÁRIO:

I — Introdução: 1. Sentido geral; 2. Origem e evolução; 3. O ressurgimento periférico. II — O desenvolvimento no Direito das sociedades: 4. Pano de fundo e manifestações; 5. As conquistas da jurisprudência; 6. O apoio doutrinário e a consagração. III — A evolução posterior a 1945: 7. O distanciamento do pós guerra e a retoma jurisprudencial; 8. O aprofundamento doutrinário; 9. A tripartição: participações sociais, competência da assembleia e deveres dos administradores. IV — Os deveres de lealdade dos administradores: 10. Origem e evolução; 11. Actuações vedadas; 12. Condutas devidas; delimitação da diligência e do cuidado; 13. Justa causa de destituição e responsabilidade. V — A reforma do CSC de 2006: 14. Glossário.

I – INTRODUÇÃO

1. Sentido geral

I. A lealdade traduz a característica daquele que actua de acordo com uma bitola correcta e previsível. Perante uma pessoa leal, o interessado dispensa a sua confiança. Daí resultam, desde logo, os seguintes vectores:

— a preferência: dada uma multitude de hipóteses, o interessado será levado a acolher a situação encabeçada por quem se afigure leal;

— a entrega: justamente mercê da confiança depositada, o beneficiário irá baixar as suas defesas naturais; deixará de tomar precauções que, de outro modo, seriam encaradas;

— o investimento: além da entrega passiva, o beneficiário poderá ir mais longe: confiando, à pessoa leal, os seus próprios valores, crente de que eles serão devidamente tra-tados.

Podemos apresentar a lealdade como o contraponto da confiança. Ou, pelo menos: daquela que seja originada por uma conduta humana. A relação de lealdade envolve uma relação de confiança na qual, o pólo activo — o que suscita a confiança — é, precisamente, o indivíduo leal.

II. Se procurarmos decompor os elementos em que assenta a lealdade, encontramos dois, já aludidos:

— a previsibilidade da conduta;

— a sua correcção.

A previsibilidade está na base da confiança. Justamente por o interessado poder, subjectivamente, prognosticar a actuação futura de uma outra pessoa, surge, da parte dele, a convicção que permite a preferência, a entrega e o investimento. A pessoa imprevisível não é leal.

O elemento subjectivo da prognose deve, todavia, ser completado com um factor objectivo: o da correcção da conduta na qual se confia. Não se pode dizer que o criminoso compulsivo seja leal: e isso embora se possam prever os actos futuros. A verdadeira lealdade envolve a observância de bitolas correctas de actuação.

Esta dimensão ético normativa da lealdade aflora no seu étimo latino. Leal provém de legalis, de lex(1), legis: a lei. Será leal quem, no futuro, vá estar conforme com a lei, aqui tomada em sentido amplo.

A correcção dá as margens externas máximas de lealdade: fora delas não surgem qualidades. Mas vamos, aqui, mais longe: a previsibilidade, com a inerente confiança, exige um recorte mais estreito. Quem, dentro do correcto, actue imprevisivelmente, não é leal. A lealdade exige, num âmbito de legalidade, uma atitude especificamente conforme com as expectativas do caso.

III. Não é possível distinguir uma lealdade extrajurídica a qual seria, depois, acolhida pelo Ordenamento. As necessidades de análise que nos levam a isolar, no humano, um plano especificamente jurídico não correspondem à realidade. O humano é social: logo, jurídico. Os sentimentos ligados à lealdade, seja como algo que se pode exigir a outrem, seja como uma realidade que devemos aos nossos semelhantes, estão, na sua génese, ligados a uma ideia de ética normativa na conduta exterior. O ser humano é leal porque se sente, intrinsecamente, um homo juridicus: deve e pode exigir.

IV. Os vectores ligados à lealdade surgem em todo o ordenamento, tomado num sentido muito lato. A omnipresença dificulta a análise. E isso ao ponto de apenas em data relativamente recente ter sido viável estudar, em moldes jurídico científicos, a realidade em jogo.

Como veremos, torna se possível, na lealdade, encontrar acepções mais estritas: uma ideia fecunda, em termos de resolução de problemas concretos.

2. Origem e evolução

I. Pela sua própria natureza, a lealdade terá acompanhado a hominização. Desde os primórdios, os homines sapientes terão sabido, para a sua sobrevivência, distinguir entre elementos leais e desleais. Apenas os primeiros eram fiáveis; apenas neles se poderia confiar. Sem lealdade não há acordos possíveis; sem estes não há mercado, não há propriedade e não há pessoas. A capacidade, exibida pelo ser humano, de se comprometer e de se conservar fiel ao compromisso está na base de qualquer organização social.

II. Na Roma antiga, a lealdade foi objectivada na deusa fides, centrando se na mão direita: o instrumento do aperto ritual que exprimia o compromisso mútuo. A fides traduzia a necessidade ético jurídica de respeitar a palavra dada(2).

De fides vem nos fé; mas vem, ainda, fiel e fidelidade. A fidelidade é, no português actual, uma noção mais estrita do que a lealdade: embora pressupondo esta, a fidelitas postula um compromisso, estrito e de tipo pessoal, a respeitar. Pelo contrário, a lealdade compagina uma margem de livre actuação por parte da pessoa em que ela se manifeste.

A carga significativa subjacente à fides permitiu, ao pretor, o seu aproveitamento vocabular, fazendo a acompanhar do adjectivo bona. Conseguiu, assim, compor novas fórmulas destinadas a legitimar os bonae fidei iudicia, base de todos os contratos modernos(3). Embora se trate de uma criação técnico jurídica, é seguro que, subjacente aos novos contratos, esteve, sempre, a ideia de lealdade ao compromisso.

III. A noção da lealdade, ligada à confiança, foi acolhida no antigo Direito alemão(4). Recebeu, aí, um contributo objectivista importante. A lealdade era retirada do ritual solene e da aparência dele resultante. Além disso, impôs se uma funcionalização do conceito: a lealdade é devida à chefia e por via desta.

O racionalismo adoptou a lealdade, dando lhe uma cobertura sistemática, a inferir da própria natureza humana. O desenvolvimento conferido, por GROTIUS, à lealdade, na “recentemente” redescoberta obra Parallelon(5), exprime a sua recepção na fase histórica seguinte.

IV. O liberalismo e as codificações dele tributárias foram pouco sensíveis, no início, à ideia de lealdade. De resto, isso sucedeu, em geral, com os conceitos indeterminados que postulavam ordenamentos alargados para além do jus positum. Aos cidadãos eram reconhecidos direitos que eles exerceriam como bem lhes parecesse. Apenas era devida obediência aos contratos livremente celebrados e, naturalmente, à lei. Para além disso, não haveria mais “lealdades” exigíveis.

3. O ressurgimento periférico

I. A lealdade voltaria a surgir no plano jurídico: com uma eficácia precisa e, em última análise, dogmatizada. Mas isso não sucederia mercê de qualquer construção coerente e centralizada, da qual seria possível retirar soluções para problemas. Pelo contrário: a lealdade impôs se na periferia, sectorialmente e em áreas por vezes distantes. Apenas recentemente se tornaria possível uma reconstrução sistemática, de modo a formular uma concepção dogmaticamente operacional.

No presente escrito, vamos ponderar esse fenómeno na área das sociedades comerciais, ensaiando uma teorização geral. Assinale se que a doutrina de ponta continua, hoje, a lamentar, no Direito continental, a ausência de uma teoria unitária dos deveres de lealdade(6). Esclarecemos que, no desenvolvimento subsquente, iremos usar, de modo predominante, elementos jurídico científicos germânicos. Nenhuma outra literatura — nem mesmo a anglo saxónica(7)! — dispõe de elementos jurisprudenciais e doutrinários que se aproximem, sequer, dos alemães. Além disso, a Ciência de além Reno tem, no nosso Direito, uma terra de acolhimento tradicional: remonta a 1902 e a GUILHERME MOREIRA. Na 2.ª edição do nosso Manual de Direito comercial / Parte geral, em preparação, cuidaremos da competente integração no nosso sistema.

Como via auxiliar de análise subsequente vamos, todavia, proceder a algumas precisões antecipatórias de investigações já levadas a cabo noutros locais. Vejamos como se comporta a lealdade no Direito civil. Encontramos, aí, quatro áreas preferenciais de aplicação:

— a lealdade como dever acessório: acompanha as diversas obrigações, adstringindo as partes a, por acção, preservar os valores em jogo, facultando as efectivas vantagens aguardadas pelo credor(8); trata se de um vector especialmente marcante nas obrigações duradouras(9), tendo vindo a apoiar se em regras cada vez mais precisas(10); no Direito português, os deveres de lealdade, enquanto deveres acessórios das obrigações, apoiam se no artigo 762.º/2, do Código Civil; a natureza específica dos vínculos constitui um especial apelo à boa fé(11);

— a lealdade como articular conf

ormação de prestações de serviços: variará, aí, na razão directa da confiança requerida(12); temos, aqui, uma manifestação mais intensa dos deveres acessórios, que modelam a própria prestação principal(13);

— a lealdade como dever próprio de uma obrigação sem dever principal de prestar: lembremos as adstrições legais in contrahendo(14), assentes, entre nós, na boa fé e no ar-tigo 227.º/1, do Código Civil;

— a lealdade como configuração das actuações requeridas a quem gira um negócio alheio; aproxima se, aqui, dos deveres do gestor ou do mandatário — 465.º, a), 1161.º e 1162.º, todos do Código Civil; nesta vertente, a lealdade tem um conteúdo fiduciário.

Os deveres de lealdade distinguem se dos deveres de protecção e dos de informação: visam condutas positivas e promovem directamente o escopo almejado pelo credor(15). Pelo contrário: a protecção procura uma tutela indirecta desse escopo, enquanto a informação (por vezes requerida pela lealdade!) requer um conteúdo “informativo”.

III. No Direito do trabalho, a lealdade conheceu uma especialização característica. Ela surge como elemento clássico da relação jurídica laboral: aí, ela adstringiria o trabalhador a zelar, por acção ou por omissão, pelos interesses da entidade empregadora ou da empresa(16). Contrapor se ia aos deveres de assistência, a cargo da entidade empregadora(17), obrigando-a a velar pela integridade física, económica e moral do trabalhador.

A doutrina dos nossos dias critica a concepção comunitário pessoal da relação de trabalho, relação essa que viu surgir os deveres clássicos de lealdade e de assistência(18). Não obstante, o dever de lealdade mantém se, como dever acessório legal reforçado, a cargo do trabalhador. Ele recebeu, no artigo 121.º/1, e), do Código do Trabalho de 2003, a redacção seguinte(19):

Guardar lealdade ao empregador, nomeadamente não negociando por conta própria ou alheia em concorrência com ele, nem divulgando informações referentes à sua organização, métodos de produção ou negócios.

Trata se de um preceito que vinha já da velha LCT. Corresponde a um desenvolvimento civilístico da matéria.

IV. Torna se importante sublinhar que as diversas manifestações da lealdade, acima apontadas, surgiram por si: pontualmente e de modo isolado umas das outras. É óbvio que elas correspondem a grandes aspirações humanas que em todas transparecem: confiança, continuidade, segurança e protecção. Mas não houve, no imediato, conexões dogmáticas entre elas.

A sua origem típica só muito mais tarde permitiria uma integração sistemática. De resto: ainda em curso. Nesta ambiência devemos entender a lealdade — melhor: as manifestações de lealdade — no Direito das sociedades.

II - O DESENVOLVIMENTO NO DIREITO DAS SOCIEDADES

4. Pano de fundo e manifestações

I. A societas foi, na origem, um bonae fidei iudicium. A boa fé e a lealdade teriam, ab initio, um papel na sua génese. Verifica se ainda que, à partida, o contrato de sociedade ocorre intuitu personae: as partes celebram no na medida em que tenham especial confiança nas qualidades uma da outra. No âmago da sociedade ocorrem as previstas interacções com vista a um fim comum(20). E nesse nível refere se a lealdade, própria das relações duradouras, com um papel multifacetado(21).

Esta lealdade é própria das sociedades civis sob forma civil ou das sociedades comerciais de base pessoal. Ela decresce na sociedade por quotas e, mais ainda, nas sociedades anónimas(22). Ora estas últimas constituem, sabidamente, a grande matriz do Direito das sociedades.

II. As sociedades anónimas surgiram e desenvolveram se num ambiente pouco favorável à confiança interindividual. A própria designação “anónima” constitui um início de explicação.

No período das companhias coloniais, as sociedades eram dominadas por relações de força e pelo respeito inspirado pelo soberano: a este era devida lealdade(23). Mais tarde, a sua constituição foi passando, sucessivamente, pela outorga, pela concessão e pelo reconhecimento específico. A intervenção conformativa do Estado estava na base da respeitabilidade do novo ente colectivo.

Aquando da liberalização: a sociedade anónima operava pelo poder do dinheiro que congregava. As pessoas aderiam convictas de que todos os intervenientes, pretendendo lucros, não deixariam de agir nesse sentido(24). Apenas um aprofundamento subsequente, com diversos sortilégios humanos, permitiria detectar situações onde a velha lealdade poderia prestar serviços dogmá-ticos.

III. Antecipando e por razões de exposição: a lealdade, no campo das sociedades, toma diversas configurações(25). Analiticamente, podemos distinguir:

— a lealdade dos accionistas entre si: designadamente da maioria para com a minoria mas, também, inversamente;

— a lealdade dos accionistas para com a sociedade;

— a lealdade dos administradores para com a sociedade;

— a lealdade dos administradores para com os accionistas.

A reforma de 2006 do Código das Sociedades Comerciais, particularmente quanto ao seu artigo 64.°, permite ainda apontar outras “lealdades”. A sua consistência dogmática é mais do que discutível, até porque a banalização da lealdade lhe vai tirar consistência. Adiante veremos até onde se poderá ir, nessa via.

5. As conquistas da jurisprudência

I. As diversas codificações comerciais passaram em branco o tema da lealdade, no âmbito das sociedades. O mesmo sucederia com as novelas, as recodificações e as leis especiais, com relevo para a lei alemã das sociedades por quotas(26). A explicação é simples: a codificação acolhe apenas material já codificado. Não era, na época e seguramente, essa a situação da lealdade.

II. A referência específica a uma lealdade no campo societário surgiu, muito lentamente, na jurisprudência alemã(27).

Num primeiro momento, a jurisprudência do Reichsoberhandelsgericht e, depois, a do Reichsgericht(28), vieram optar pela total não vinculação dos sócios, fora do que a própria lei ou os estatutos determinassem. Assim:

ROHG 20 Out. 1877: seria irrelevante, para efeitos de adstrições não previstas de modo expresso, o tipo de interesses em jogo(29);

RG 25 Set. 1901 (caso Deutsche Tageszeitung): decidiu se que não era possível a exclusão de um sócio, por ser contrária à essência da sociedade anónima(30);

RG 8 Abr. 1908 (caso Hibernia): não seria contrária aos bons costumes uma exclusão da preferência dos accionistas, fora de quaisquer interesses atendíveis(31);

RG 17 Nov. 1922: mantém essa mesma orientação, ainda com referência à exclusão da preferência dos accionistas(32);

RG 19 Jun. 1923: retoma a opção em causa, explicitando que apenas a assembleia geral pode dizer qual é o interesse da sociedade(33);

RG 24 Jun. 1924: incumbir a administração da prática de determinados actos não é contrário à boa fé(34).

Paralelamente, a literatura era omissa quanto a um dever de lealdade, no âmbito societário. Apenas HACHENBURG veio afirmar, em 1907, que também o exercício do voto se deveria subordinar à boa fé(35).

III. Com antecedentes parciais em RG 29 Nov. 1912(36) e em RG 22 Fev. 1916(37), o dever de lealdade surgiria na jurisprudência e na doutrina do período da Constituição de Weimar(38). Tomamos nota das seguintes espécies:

RG 20 Out. 1923: surge contrária aos bons costumes a exclusão, fora do interesse social, da preferência dos accionistas(39);

RG 23 Out. 1925: será contrário aos bons costumes a actuação da maioria de voto ohne Rücksicht auf das Wohl der Gesellschaft [sem consideração pelo bem da sociedade](40);

RG 30 Mar. 1926: usa essa mesma expressão(41);

RG 31 Mar. 1931: seria contrário aos bons costumes usar o voto apenas para explorar a minoria(42);

RG 8-Jan.-1932: é contrário contra os bons costumes prever compensações para os membros do conselho de vigilância que não compareçam(43);

RG 4 Dez. 1934: sem usar “lealdade”, reporta proibições de voto por conflito de interesses(44).

Ainda nesta linha evolutiva, deve frisar se que a jurisprudência societária passou a referir a boa fé. Assim:

RG 6-Fev.-1932: no tocante à repetição de deliberações de modo a sanar vícios, deve haver limites temporais induzidos pela boa fé(45).

Podemos considerar que todos estes elementos, no seu conjunto, traduziam, na periferia, uma massa crítica susceptível de ocasionar o salto qualitativo subsequente.

6. O apoio doutrinário e a consagração

I. Os casos indicados, na sua globalidade, originaram uma pressão de fundo para, perante problemas manifestamente carecidos de saídas jurídicas justas, fazer apelo aos valores fundamentais do sistema. A essa luz, não admira a penetração da referência à boa fé. Todavia e no que toca à lealdade, surgia um problema: na falta de qualquer consagração legal, ela surgia como um instrumento pouco manejável. Procurar sedimentar soluções novas em conceitos desconhecidos é salto que não se espera, por parte dos cuidadosos tribunais superiores.

II. O hábito de decidir praeter legem e em consonância com o sistema tinha, agora, de ser alavancado com a doutrina, de modo a alcançar uma fórmula nova e adequada: a da lealdade. E de facto, na altura, ocorreram diversas intervenções doutrinárias que permitiriam esse salto qualitativo. Torna se muito atraente determinar as precisas origens desse fenómeno: além de um evidente interesse jurídico científico. Eis a evolução:

— em 1928, PINNER ainda considera que a introdução da boa fé no Direito das sociedades anónimas seria fonte de incertezas(46);

— mas nesse mesmo ano, HACHENBURG, na linha de posições anteriores, afirma que o voto não pode contrariar a interpretação de boa fé do contrato(47);

— em 1929, ALFRED HUECK, num estudo decisivo, sistematiza a jurisprudência do Reichsgericht determinando três situações essenciais de contrariedade aos bons costumes, por parte das deliberações: oposição ao objectivo em jogo, abuso da maioria e uso da maioria simples, quando se exigiria a qualificada(48);

— ainda em 1929, DEGEN sublinhou a possibilidade de se estabelecerem relações específicas entre os sócios, seja de sociedades por quotas, seja de sociedades anónimas; quando isso sucedesse, teríamos relações de lealdade, fontes, designadamente, de deveres de informar, cuja violação poderia conduzir a uma responsabilidade aquiliana(49);

— também em 1929, NETTER, contraditando anteriores tendências doutrinárias, manifesta se no sentido de uma cláusula geral limitativa do direito de voto(50), sublinhando a existência de um dever de lealdade a cargo do accionista(51);

— em 1930, HOMBURGER retoma essa mesma posição(52);

— em 1932, HACHENBURG, em anotação ao já citado RG 6 Fev. 1932, sublinha a importância da boa fé no Direito das sociedades anónimas(53);

— em 1934, RITTER apela para o leal tratamento entre os accionistas(54);

— em 1935, SIEBERT aplaude a jurisprudência relativa à boa fé e à lealdade, nas sociedades anónimas(55).

III. A situação jurídica podia ser considerada madura. E assim:

RG 22 Jan. 1935: a boa fé surge como limite ao exercício dos direitos: também no domínio das sociedades(56);

RG 21 Set. 1938: existe um dever de lealdade: quer dos accionistas entre si; quer destes para com a sociedade(57).

A referência à lealdade correspondeu ainda a um certo uso de expressões profundas, com ressaibos sentimentais, típicas da época. Além disso, ela foi facilitada pelo pensamento comunitário pessoal, próprio do Direito do trabalho(58) e que se procurou alargar aos entes colectivos(59). A Lei das sociedades anónimas de 1937 não consagraria, de modo expresso, a lealdade. Esta surgia, todavia e com intensidade, na doutrina, até 1945(60). Ainda hoje teremos de localizar, nesse período, construções básicas para o seu manuseio jurídico científico: com um especial destaque para FECHNER(61). Podemos antecipar que a lealdade representaria um ganho, permitindo dogmatizar, nas relações específicas que se estabelecerem dentro do universo societário, as exigências do sistema. Apenas décadas mais tarde seria possível alcançar o desenvolvimento jurídico científico suficiente para esse passo.

IV. Nesta fase, a defesa de uma ideia de lealdade pode, ainda, ser aproximada das concepções que pretenderam arvorar a empresa a conceito nuclear do Direito comercial. Em especial, tem sido notada uma certa proximidade com a ideia da “empresa em si”(62).

Atribuída (erradamente) a Rathenau(63), a fórmula “empresa em si” (Unternehmen an sich) surgiu, em 1928, pela pena de Hausmann(64). Retomada por vários autores(65), ela chegou a dar corpo, na justificação de motivos de um projecto de lei sobre sociedades anónimas, em 1930, à ideia de que haveria um autónomo interesse da empresa, que ao Direito caberia proteger(66). Aí se inscreveriam deveres de lealdade.

Uma série de dificuldades de ordem dogmática impediriam a fixação do “interesse da empresa” como instrumento dogmaticamente operacional(67). A própria “empresa em si” perderia apoio, no pós -guerra. De todo o modo, ela ilustra um período especialmente criativo, do qual os deveres de lealdade societários acabariam por emergir e por sobreviver.

III - A EVOLUÇÃO POSTERIOR A 1945

7. O distanciamento do pós guerra e a retoma jurisprudencial

I. Após 1945, assistiu se a um claro abandono da doutrina da lealdade, aplicada às sociedades comerciais. Uma certa contaminação com as considerações comunitário pessoais propugnadas pelo pensamento nacional socialista, quer para contraditar o liberalismo, quer o socialismo, a tanto conduziu. De resto, essa mesma contaminação provocou, em geral, um retrocesso na aplicação prática da empresa(68) e, até, na própria boa fé(69). Evidentemente: não há conceitos maus: mau poderá ser o uso que deles se faça, sobretudo quando se perca a sindicância de uma Ciência do Direito coerente e dotada de valores materiais.

II. No campo jurisprudencial, o relatado estado de coisas levou a que apenas cerca de trinta anos mais tarde(70), o Bundesgerichtshof retomasse as aplicações do seu antecessor. Assim, foram decisões marcantes nessa retoma:

— BGH 5 Jan. 1975 (caso ITT): o sócio tem uma acção contra um gerente da sociedade, baseada num dever de lealdade que, a este, incumbiria(71);

— BGH 16 Fev. 1976 (caso NSU): a VW comprou, a uma pessoa e por preço elevado, acções da NSU; essa pessoa não avisou as restantes; o Tribunal derivou, do § 242 do BGB, um dever de lealdade que, todavia, não teria, aqui aplicação(72);

— BGH 25 Fev. 1982 (caso Holzmüller): numa situação de especial significado, em que estava em causa a alienação do estabelecimento da sociedade, a direcção deve convocar a assembleia geral(73);

— BGH 13 Mai. 1985: o sócio comanditário pode mover uma acção pro socio contra o sócio comanditado e gerente, por este não dedicar, à sociedade, toda a sua força de trabalho(74);

— BGH 1 Fev. 1988 (caso Linotype): entendeu se que a decisão maioritária de elevação do capital social, contra um dever de lealdade, é impugnável(75);

— BGH 20 Mar. 1995 (caso Girmes): atenta contra a lealdade a minoria que impeça a adopção das medidas necessárias para o saneamento da empresa da sociedade em jogo(76).

III. Como veremos, neste período foi a doutrina que iniciou a retoma da lealdade. De todo o modo, parece nos importante antecipar esta jurisprudência: ela documenta a efectiva formação periférica da lealdade. Esta vem a assentar numa plêiade de distintos problemas que, em comum, têm a necessidade de uma intervenção, in casu, dos valores básicos do sistema jurídico e, ainda, a presença de uma especial proximidade entre dois sujeitos.

Apesar da vaguidade (natural) da linguagem, não encontramos um dever genérico de “lealdade”: antes situações relacionais concretas em que esta se manifesta. Para além disso, verifica se uma multiplicação de direccionamentos da lealdade. Temos e conforme acima antecipámos:

— lealdade entre accionistas individualmente tomados (caso NSU e caso da actio pro socio);

— lealdade do gerente para com o sócio (caso ITT);

— lealdade da maioria para com a minoria (caso Holzmüller e caso Linotype);

— lealdade da minoria para com a sociedade (caso Girmes).

Nenhum destes vectores pode ser generalizado, sob pena, seja de perder impacte, seja de paralisar a vida da sociedade.

Assinale se ainda que a responsabilidade dos administradores na base de deveres de lealdade veio a conhecer uma derivação própria autónoma, abaixo referida.

8. O aprofundamento doutrinário

I. Na doutrina do pós guerra relativa à lealdade no âmbito das sociedades comerciais, no plano continental fundamentalmente alemão, podemos distinguir três grandes manchas:

— a dos estudiosos que prosseguiram na linha adiantada no período imediatamente anterior ao colapso do III Reich, em 1945;

— a dos anotadores e críticos, relativamente aos grandes casos dos anos 70 e 80 (ITT, Holzmüller, pro socio e Linotype) retomadas nos anos 90 (Girmes);

— a dos dogmáticos da reconstrução do conceito, nos anos 2000 e ainda em curso.

II. O período anterior a 1945 fechou (neste domínio!) com chave de ouro: a habilitação de FECHNER sobre as ligações fiduciárias dos accionistas(77). Procedamos à sua síntese. Segundo FECHNER, a lealdade nasceria directamente do povo, sendo, depois, tratada pela Moral, pela Filosofia e pelo Direito(78). Na base, ela está enraizada na consciência de cada um, dirigindo se ao outro(79). A lealdade dá firmeza às relações jurídicas: sem ela, a vida em comunidade nem seria possível(80). Tudo isto — para mais tendo em conta o pensamento comunitário — teria aplicação no Direito das sociedades anónimas(81).

Na retoma, avulta o pequeno mas rico escrito de ALFRED HUECK sobre a ideia de lealdade no Direito privado moderno(82). No essencial, este Autor vem apoiar a lealdade na Ética; todavia, ela alcançaria um significado no Mundo do Direito(83). Trata se, depois, de ordenar as ideias de boa fé, de bons costumes e de dever de lealdade. E propõe a seguinte pirâmide(84):

— o conceito mais geral é o de bons costumes: banham, em geral, todo o ordenamento, dando azo a responsabilidade aquiliana, quando violados com dolo;

— a boa fé já é mais exigente e específica: pressupõe uma série de requisitos, para se manifestar;

— o dever de lealdade surge ainda mais pesado e estrito: tem a ver com uma especial ligação entre as pessoas; assim sucederia no contrato de trabalho(85).

O próprio ALFRED HUECK questiona a hipótese de deveres de lealdade entre accionistas: faltariam, aí, as relações pessoais entre os sócios(86). Mas outra seria a situação nas sociedades em nome colectivo onde, de toda a forma, se imporia a lealdade ao contrato(87).

Dos trabalhos de HUECK ressalta um ponto a que atribuímos a maior importância: o da necessidade de precisão de conceitos. A lealdade não pode ser usada como algo de informe, susceptível de transmitir uma ideia aprazível, mas sem conteúdo dogmático claro.

III. Como evolução da literatura tradicional podemos apontar uma certa funcionalização da lealdade. Por certo que, à partida, ela se destinará a proteger as pessoas. Mas em que sentido? WIEDEMANN sublinha o papel da lealdade na tutela das minorias, pelas razões particulares e gerais que se conhecem(88); IMMENGA recorda, além do conflito maioria/minoria(89), a separação entre a propriedade e o domínio, subjacente às grandes anónimas e ao reforço dos deveres requeridos para as necessárias composições(90). Outros autores seguiam nestas vias(91).

Tudo isto se insere no movimento geral da “socialização” do Direito privado: empenhado, de modo assumido, em, sem perturbar o livre jogo económico, proteger os fracos.

IV. Um especial avanço na literatura da lealdade foi o promovido pelas decisões exemplares dos anos 70, 80 e 90, do século XX. Devemos aliás antecipar que essa literatura não seguiu, apenas, a pista dogmática dos deveres de lealdade, antes se alargando a áreas conexas da responsabilidade, aos grupos de sociedades e, até, à doutrina do levantamento da personalidade colectiva.

Quanto a BGH 5 Jan. 1975 (o caso ITT), para além de anotações(92) e comentários gerais(93), temos a apontar escritos que acentuam os deveres de lealdade(94) e, ainda, que se reportam à tutela dos credores(95) e à responsabilidade nos grupos de sociedades(96).

Muito impressivo, BGH 25 Fev. 1982 (o caso Holzmüller) suscitou análises em artigos, monografias e obras gerais(97); ocasionou críticas no plano dogmático (98), tendo se chamado a atenção para a necessidade de não assimilar a protecção dos accionistas minoritários à tutela do consumidor(99), de limitar a tutela a questões de grupos de sociedades(100) e de respeitar a unidade do sistema(101). Também aqui a discussão foi levada para a área dos grupos de sociedades(102), bem como para a da distribuição interna dos poderes sociais(103). Deve notar se que as ondas da doutrina Holzmüller se prolongam até hoje, tendo sido objecto de novas delimitações jurisprudenciais(104).

Quanto a BGH 1 Fev. 1988 (caso Linotype): além das anotações(105), ele obteve um interessante comentário que acentua o dever de lealdade dos accionistas(106).

Finalmente, BGH 20 Mar. 1995 (o caso Girmes): sublinhou se o dever de lealdade que também recai sobre os sócios minoritários(107).

Toda esta matéria aponta, no seu conjunto, para a necessidade de depurar o tema da lealdade: ele vai sobrepor se com regimes técnico jurídicos mais precisos que se ligam à competência da assembleia geral, à responsabilidade dentro dos grupos de sociedades e ao próprio levantamento da personalidade. Ora quando isso aconteça, o dever de lealdade, como figura mais geral e, nessa medida, residencial, deve ceder em face das realidades dogmáticas mais estritas.

IV. Finalmente, uma referência aos dogmáticos que têm procurado uma reconstrução do conceito. Vamos reter dois: WIEDEMANN(108) e WELLENHOFFER KLEIN(109). O primeiro aponta, quanto aos deveres de lealdade, as suas breves aparições no BGB e no HGB, bem como a impossibilidade de, com referência a eles, operar qualquer subsunção(110). Posto isto, distingue três áreas de aplicação: a lealdade dos sócios(111), a dos órgãos(112) e a da maioria(113). Contemplariam, sob um pano de fundo, problemas diversos.

A segunda sublinha a concretização do § 242 do BGB (boa fé) que eles representam(114). Assentam, em especial(115):

— numa relação duradoura;

— que postula uma organização;

— determinada entre as partes específicas.

Encontramos, aqui, as sementes da evolução subsequente e do seu apoio dogmático.

9. A tripartição: participações sociais, competência da assembleia e deveres dos administradores

I. Na evolução de que demos nota, quer no plano jurisprudencial quer nas indagações doutrinárias, ficou claro que os deveres de lealdade conheciam campos distintos de aplicação. Parece razoável supor que tais campos originaram, por seu turno, conteúdos específicos distintos. Distinguimos três áreas:

— a da lealdade exigível aos sócios, seja nas relações entre si, seja com referência à própria sociedade;

— a da lealdade da sociedade para com os sócios;

— a da lealdade requerida aos órgãos societários.

II. A lealdade exigível aos sócios inscreve se no seu próprio status enquanto sócios. Tal status exprime uma série de direitos e de deveres, ínsitos na própria ideia de participação social. Entre os deveres em causa incluem se, precisamente, os da lealdade. Trata se de uma ideia antiga(116), depois retomada(117) e aprofundada(118). Hoje, poderemos falar, neste domínio, no exercício das posições sociais de acordo com a boa fé, seguindo se as vias de concretização deste instituto: tutela da confiança (p. ex., proibição de venire contra factum proprium) e primazia da materialidade subjacente (p. ex., proibição de actos emulativos). Exemplo de deslealdade será o abuso no pedido de informações: contraria a materialidade subjacente, isto é: os valores que levaram o legislador a conferir as inerentes pretensões(119).

Como foi avançado, tudo isto pressupõe a construção da participação societária não como um direito subjectivo, mas como uma posição complexa (status) que envolve uma relação complexa, com deveres(120).

III. A lealdade da sociedade para com os sócios implica, tudo visto, um alargamento ex bona fide da competência da assembleia geral e a adopção, nesta, de certas deliberações por maioria qualificada. O caso emblemático mantém se o Holzmüller, podendo encontrar se outras concretizações(121). Também aqui as vias de concretização da boa fé são úteis.

IV. Quanto à lealdade requerida aos próprios órgãos societários, com natural relevo para a administração: ela integra uma área em crescente especialização, dando azo a desenvolvimentos que iremos referir, de seguida. A matéria irradia, ainda, para a área dos grupos de sociedades(122): todavia, vamos quedarmo-nos pelo núcleo da sociedade isolada, no desenvolvimento subsequente.

V. A base legal destas manifestações de lealdade, hoje em afastamento crescente, radicava, tradicionalmente, na boa fé(123). A sua especialização em grupos de casos cada vez mais precisos leva a doutrina, muito simplesmente, a apelar para o Direito consuetudinário(124).

Como balanço, podemos, nestes últimos cem anos, apontar uma evolução: oscilante, mas com um sentido geral claro. Num primeiro tempo, a lealdade relacionava sócios entre si; depois, ocupou se das relações maioria/minoria; finalmente, reportou se aos órgãos. As duas primeiras foram sendo absorvidas pela teoria das participações sociais e pela doutrina da repartição de poderes intra--societárias. Por razões que abaixo apontaremos, fica nos, como particular área de reflexão, a dos deveres dos órgãos e, em especial: dos administradores.

IV - OS DEVERES DE LEALDADE DOS ADMINISTRADORES

10. Origem e evolução I. A situação jurídica dos administradores foi, inicialmente, enquadrada por referência à figura do mandato(125). Mais tarde, ela evoluiu para explicações mais complexas mas tendo sempre, como pano de fundo, uma prestação de serviço que iria desembocar no regime do mandato.

No exercício dos seus poderes de administração, o administrador (ou o membro da direcção, no sistema dualista alemão) está ligado por vínculos específicos à sociedade. Tais vínculos implicam deveres acessórios, entre os quais, por mera lógica obrigacional, podemos inserir a boa fé.

Todavia e como repetidamente sucede com a lealdade, não foi numa derivação simples que surgiram os deveres dos administradores: estes antes se impuseram no terreno, para enquadrar problemas concretos.

II. Num primeiro momento, a jurisprudência veio explicitar os deveres dos administradores com recurso aos do mandatário, a complementar pela boa fé(126). Mais tarde, sublinhou se o facto de, na administração, estarmos em face da gestão de bens alheios: fonte de deveres específicos(127). Estes primeiros passos são importantes e devem nos fazer reter o óbvio. A relação de administração é, antes de mais, uma prestação de serviço, pautada pelas regras gerais do Direito das obrigações. Nestas vamos sempre encontrar o essencial dos regimes aplicáveis, bem como uma porta aberta para enquadrar os problemas novos que possam surgir.

Isto dito: é natural que a especificidade das situações dite o aparecimento de grandes linhas de problemas que irão encontrar, no Direito das sociedades, soluções particularmente adaptadas aos valores em jogo.

III. A evolução subsequente foi pautada pelas seguintes linhas:

— determinação de actuações vedadas, com base em cláusulas gerais;

— (re)sistematização de actuações vedadas por lei, agora ordenadas em função do vector “lealdade”;

— procura de actuações impostas ou condutas requeridas, desta feita, pela positiva.

A aproximação à lealdade foi progressiva. Tomando como exemplo a proibição de receber corretagens por conta de negócios celebrados em representação da sociedade:

— primeiro, ela foi apoiada na cláusula dos bons costumes(128);

— mais tarde, ela derivou da lealdade(129);

— por fim, ela é apontada como óbvia(130): apenas sistematicamente se apela à lealdade.

Segue se a análise das concretizações dos deveres de lealdade dos administradores.

11. Actuações vedadas

I. A jurisprudência e a literatura permitem apontar diversas situações em que, por referência à lealdade, surgem actuações proibidas aos administradores. Incluem se, aqui, proibições legais que, por razões sistemáticas e valorativas, fazem naturalmente parte desta constelação problemática.

As duas proibições mais óbvias, muitas vezes sancionadas, de modo expresso, pelas leis são:

— a proibição de concorrência(131);

— a proibição de divulgar segredos societários.

II. Para além disso, vamos encontrar:

— a proibição (ou severa restrição) de aceitar crédito da própria sociedade(132);

— a proibição e aproveitamento das oportunidades de negócio (corporate opportunities ou Geschäftschancen)(133): esta parte da proibição de concorrência vai mais longe; o aproveitamento não pode considerar se legitimado com a mera autorização para a concorrência(134); trata se de matéria conhecida pela jurisprudência(135) e ponderada à luz do Direito comparado(136);

— a proibição de tomar decisões ou de colaborar nelas, quando se verifiquem situações de conflito de interesses(137);

— a proibição ou a forte restrição no tocante a negócios a celebrar com a própria sociedade(138);

— a proibição de discriminação de accionistas, mantendo se, pela positiva, um dever de neutralidade(139);

— a proibição de empatar OPAs consideradas hostis(140).

III. De um modo geral, podemos dizer que estas proibições encontram uma base jurídico positiva seja nas regras correspondentes disponíveis nos diversos diplomas seja no princípio geral da boa fé(141). O seu recorte é simples: o administrador encabeça um vínculo material, que deve respeitar. As exigências do sistema visam o aproveitamento desse vínculo com fins alheios às situações consideradas. Designadamente: os fins pessoais do administrador ficarão sempre aquém dos da sociedade(142).

12. Condutas devidas; delimitação da diligência e do cuidado

I. Prosseguindo, pergunta se se o dever de lealdade não imporá, aos administradores, a observância, pela positiva, de deveres de conduta. Estes podem ser inferidos, por meras operações lógicas, do catálogo de proibições acima mencionado. Teríamos os deveres de não aceitar crédito, de não apropriação das corporate opportunities, de não agir em conflito de interesses, de não contratar com a própria sociedade, de respeitar a igualdade entre os accionistas e de deixar jogar a concorrência, perante OPAs hostis. Todavia: em nenhum destes casos teremos uma bússola que diga, pela positiva, como agir. Apenas são apostas margens, na conduta dos administradores.

II. Na origem, a lealdade ganha conteúdo positivo mercê da própria aproximação à boa fé, na vertente (segundo a nossa terminologia) da primazia da materialidade subjacente. O dever de lealdade implica a prossecução efectiva de um escopo: não meras actuações formais(143).

A doutrina e a jurisprudência têm, com alguma timidez, feito precisões úteis. Assim, o administrador deve consagrar, à sua função, as energias necessárias(144), abstendo se de aceitar cargos laterais que esgotem as suas forças(145).

Prosseguindo, constata se que, na actuação dos administradores, está em causa uma gestão de bens alheios(146). Tal gestão pressupõe uma específica lealdade(147), à qual podemos conferir uma natureza fiduciária: todos os poderes que lhes sejam concedidos devem ser exercidos não no seu próprio interesse, mas por conta da sociedade. Eles são dobrados pelo vínculo de confiança que dá corpo à lealdade.

Mais longe do que isso: teremos de remeter para as regras do governo das sociedades, no que tenha de prescritivo(148).

III. De todo o modo, cumpre manter a matéria semanticamente clara. Assim, o dever de lealdade, mesmo nesta concretização “positiva”, não se confunde:

— com o dever de diligência: este traduz a medida de esforço exigível aos administradores, no cumprimento dos deveres que lhes incumbam(149);

— com o dever de cuidado: este implica concretizações do dever geral de respeito, de modo a evitar situações de responsabilidade aquiliana; normalmente fala se em deveres de prevenção do perigo(150).

Atenção: o legislador português, na reforma do Código das Sociedades Comerciais, de 2006, alterou o artigo 64.° em termos que quebram a terminologia consagrada. Abaixo daremos um pequeno glossário relativo à matéria.

13. Justa causa de destituição e responsabilidade

I. O administrador que viole o dever de lealdade pode incorrer em justa causa de destituição (403.°/4 e 5, do Código das Sociedades Comerciais). A violação da lealdade conduz, por definição, à quebra da confiança: uma circunstância de muita gravidade numa relação de natureza fiduciária, como sucede com a de administração. A concretização da justa causa, salvo tratando se de bagatelas, não oferece, aqui, dúvidas ou dificuldades.

II. A inobservância da lealdade, quando danosa, conduz ainda à responsabilidade do administrador para com a sociedade (72.°/1, do mesmo Código).

A lealdade consubstancia se em vínculos específicos. A sua violação induz a presunção de culpa própria de responsabilidade obrigacional (799.°/1, do Código Civil). Quanto aos danos: nos termos gerais, haverá que determinar os estragos feitos nos bens jurídicos que a regra violada visava proteger.

III. No domínio da corporate governance, a responsabilidade dos administradores tem um papel pragmático(151). O Direito pretende que o governo das sociedades decorra da melhor forma. Quando isso não suceda, qualquer indemnização, mesmo a ser efectiva, nunca poderia substituir a riqueza perdida.

Mas nessa mesma linha, não se pode admitir que a violação de deveres de lealdade ainda acabe por ser remuneratória para o prevaricador. Numa velha máxima anglo saxónica que remonta a 1870(152):

This Court never allows a man to make profit by a wrong.

Na pureza dos princípios poderíamos ver, aqui, uma manifestação do princípio da restituição do enriquecimento(153). Pelo Direito português, dada a natureza subsidiária deste instituto, teríamos de recorrer à responsabilidade civil.

V - A REFORMA DO CSC DE 2006

14. Glossário

I. O Decreto-Lei n.° 76 A/2006, de 29 de Março, aprovou uma grande reforma do Código das Sociedades Comerciais(154). Particularmente atingido foi o seu artigo 64.°/1 relativo, segundo o próprio legislador, aos “deveres fundamentais dos administradores”. A interpretação do novo preceito, que passa pela sua crítica, foi feita noutro local, para que remetemos(155). Para os propósitos do presente estudo, cumpre, porém, chamar a atenção para o seguinte: o legislador de 2006, ao que supomos de modo não deliberado, usou uma terminologia que não corresponde nem à do Direito privado português nem à da tradição jurídico científica em que ele se inscreve. Por isso e para evitar dúvidas, passamos a indicar um breve glossário.

II. No artigo 64.°, versão 2006, do Código das Sociedades Comerciais, encontramos os seguintes termos:

— deveres de cuidado: correspondem aos duties of care anglo saxónicos os quais, reportando uma categoria de responsabilidade civil, implicam disponibilidade e eficiência; em rigor, estes elementos pertencem aos deveres de lealdade continentais; segundo a terminologia jurídica correcta, “deveres de cuidado” são deveres de prevenção do perigo: concretizam, em certos casos, o dever geral de respeito, de modo a evitar a responsabilidade aquiliana;

— diligência: significa o grau de esforço requerido para o cumprimento de um dever; a sua colocação no artigo 64.°/1, a), é redutora e deve ser alargada, pela interpretação;

— deveres de lealdade: equivalem aos fiduciary duties britânicos, mais restritos do que os deveres de lealdade propriamente ditos; reportá los aos “interesses” (cumulativamente!) da sociedade, dos sócios a longo prazo, dos trabalhadores, dos clientes e dos credores retira lhes qualquer papel prático, num problema a ultrapassar pela interpretação.

III. O Direito privado português tem uma configuração que lhe foi dada por muitas gerações de juristas e por uma vivência antiga. Está, como qualquer outro, em permanente evolução. Mas não é curial, sem um estudo prévio cuidado, vir enxertar lhe, ad nutum, uma terminologia que não é a sua, em obediência a tradições jurídico científicas estruturalmente diferentes.

As ingenuidades de 2006 podem, todavia, ser assimiladas pela interpretação.


Notas:

(1) Ver o Dicionário etimológico da língua portuguesa, III, 3.ª ed. (1977), 396/II.

(2) Para indicações vide a nossa Da boa fé no Direito civil (1984, 2.ª reimp., 2001), 54 ss..

(3) Idem, 71 ss..

(4) Idem, 162 ss.. Recordamos que lealdade diz se, em alemão actual, Treue e crença, Glaube; Treu und Glauben corresponde, precisamente, a boa fé.

(5) Publicada por WOLFGANG FIKENTSCHER, sob o título impressivo: De fide et perfidia / Der Treuegedanke in dem “Staatsparallelen” des Hugo Grotius aus heutiger Sicht (1979); para a sua análise vide o nosso Da boa fé cit., 212 ss..

(6) Vide KONRAD RUSCH, Gewinnhaftung bei Verletzung von Treuepflichten (2003), 193.

(7) Onde, todavia, ao lado de breves referências – p. ex., JILL SOLOMON/ARIS SOLOMON, Corporate governance and accountability (2004), 47 — deparamos com interessantes desenvolvimentos, ainda que discursivos — p. ex., FRANKLIN A. GEVURTZ, Corporation Law (2000), 321 386.

(8) Com elementos, vide os nossos Da boa fé cit., 551 ss., 606 ss., 648 ss. e passim, Direito das obrigações 2 (1980, reimp., 1994), 18 ss. e Tratado de Direito civil I/1, 3.ª ed. (2005), 408 409.

(9) KARL LARENZ, Lehrbuch des Schuldrechts I – Allgemeiner Teil, 14.ª ed. (1987), 140 141.

(10) A reforma alemã do Direito das obrigações, de 2001, introduziu, no § 241, do BGB, um segundo parágrafo, assim redigido: A relação obrigacional pode, mercê do seu conteúdo, vincular cada parte ao respeito pelos direitos, pelos bens jurídicos e pelos interesses da outra.

Perante tal normativo, alguma doutrina tem vindo a apoiar o dever acessório da lealdade nesse preceito e não, já, no § 242, relativo à boa fé em geral. Cf. DIRK OLSEN, em Staudingers Kommentar 2 II, Einl zu §§ 241 ff; §§ 241 243 / Einleitung zum Schuldrecht, Treu und Glauben (2005), § 241, Nr. 504 ss. (268 ss.), com importantes elementos relativos ao texto agora em estudo.

(11) DIETER MEDICUS, Allgemeiner Teil des BGB, 9.ª ed. (2006), 60.

(12) HEINZ PETER MANSEL, no JAUERNING, BGB / Kommentar, 11.ª ed. (2004), § 611, Nr. 23 (760).

(13) Em rigor, já nem seriam “deveres acessórios”, antes enformando a obrigação principal. Todavia, por abstracção, cumpre proceder à sua autonomização dogmática.

(14) Trata se da moderna construção do instituto, consignada no § 313/II do BGB, pós 2001; vide ASTRID STADLER, no JAUERNIG / BGB, 11.ª ed. cit., § 311, Nr. 34 (351) e JAN BUSCHE, no notável Staudinger BGB / Eckpfeiler des Zivilrechts (2005), 202.

(15) Cf. GÜNTER FREESE, Die positive Treuepflicht / Ein Beitrag zur Konkretisierung von Treu und Glauben (1970), 3 ss. e OLSEN, Staudingers Kommentar, § 241 cit., Nr. 504 (268).

(16) HUECK/NIPPERDEY, Lehrbuch des Arbeitsrechts, 7.ª ed. (1963), 242 243.

(17) Vide o nosso Manual de Direito do trabalho (1991, reimp., 1999), 89 ss.. Com indicações: GÜNTER SCHAUB/ULRICH KOLH/RÜDIGER LINK, Arbeitsrechts Handbuch, 11.ª ed. (2005), § 53 (449 ss.).

(18) Vide o nosso Manual de Direito do trabalho cit., 95 ss..

(19) PEDRO ROMANO MARTINEZ e outros, Código do Trabalho anotado, 4.ª ed. (2005), 264 265.

(20) STEFAN HABERMEIER, Gesellschaft und Verein, no Staudinger BGB, Eckpfeiler des Zivilrechts (2005), 711 745 (712).

(21) STEFAN HABERMEIER, Staudingers Kommentar zum BGB, 2, §§ 705 740 (2003), § 705, Nr. 13, 50 53, 67 e passim (63, 83 84 e 67).

(22) KARL LARENZ/MANFRED WOLF, Allgemeiner Teil des Bürgerlichen Rechts, 9.ª ed. (2004), § 9, Nr. 60 (164).

(23) PETER STELZIG, Zur Treuepflicht des Aktionärs unter besonderer Berücksichtigung ihrer geschichtlichen Entwicklung (2000), 3 ss.; na Inglaterra do século XVI, os privilégios comedidos eram acompanhados por uma “cláusula de lealdade”.

(24) ULRICH WASTL, Aktienrechtliche Treupflicht und Kapitalmarkt / Ein Pläydoyer für eine juristisch interdisziplinäre Betrachtungsweise (2004), 18 19, com elementos.

(25) STELZIG, Zur Treuepflicht des Aktionärs cit., 9 ss. (11): desapareceram as “cláusulas de lealdade”.

(26) STELZIG, Zur Treuepflicht des Aktionärs cit., 15 24.

(27) Quanto à evolução histórica da lealdade, além da ob. cit., de STELZIG, cumpre ainda referir MARTIN WEBER, Vormitgliedschaftliche Treubindungen / Begründung, Reichweite und Vorauswirkung gesellschaftsrechtlicher Treuepflichten (1999), 26 ss..

(28) Unificados em 1879; cf. ARNO BUSCHMANN, Das Reichsgericht / Ein Höchstgericht im Wandel der Zeiten, em BERND RÜDIGER KERN/ADRIAN SCHMIDT RECLA (org.), 125 Jahre Reichsgericht (2006), 41 75 (41 ss.).

(29) ROHG 20 Out. 1877, ROHGE 23 (1878), 273 280 (278).

(30) RG 25 Set. 1901, RGZ 49 (1902), 77 81 (81).

(31) RG 8 Abr. 1908, RGZ 68 (1908), 235 247 (246).

(32) RG 17 Nov. 1922, RGZ 105 (1923), 373 376 (375).

(33) RG 19 Jun. 1923, RGZ 107 (1924), 67 72 (71).

(34) RG 24 Jun. 1924, RGZ 108 (1924), 322 329 (327).

(35) HACHENBURG, Aus dem Rechte der Gesellschaft mit beschränkter Haftung, LZ 1907, 460 471 (465), a propósito de conflitos de interesses. Cf. STELZIG, Zur Treuepflicht des Aktionärs cit., 29 34.

(36) RG 29 Nov. 1912 (caso Sentator), RGZ 81 (1913), 37 40 (40): por via do § 226 do BGB (proibição de chicana), não se pode usar o voto de modo a só causar danos aos outros.

(37) RG 22 Fev. 1916, JW 1916, 575/I 577/II, Anot. ALBERT PINNER: a exploração da minoria seria contrária aos bons costumes (ao Anstandsgefühl) (idem, 577/II).

(38) STELZIG, Zur Treuepflicht des Aktionärs cit., 36 ss..

(39) RG 20 Out. 1923, RGZ 107 (1924), 202 207 (206).

(40) RG 23 Out. 1925, RGZ 112 (1926), 14 19 (19).

(41) RG 30 Mar. 1926, RGZ 113 (1926), 188 197 (193).

(42) RG 31 Mar. 1931, RGZ 132 (1931), 149 166 (160).

(43) RG 8-Jan.-1932, JW 1932, 720 722.

(44) RG 4-Dez.-1934, RGZ 146 (1935), 71 78 (76-77).

(45) RG 8-Fev.-1932, JW 1932, 1647 1648 (1648/I).

(46) ALBERT PINNER, Der Bericht der Aktiensrechtskommission, JW 1928, 2593 2596 (2595/II).

(47) MAX HOMBURGER, Zur Reform des Aktienrechts, DJZ 1928, 1372 1378 (1375).

(48) ALFRED HUECK, Die Sittenwidrigkeit von Generalversammlungsbeschlüssen der Aktiengesellschaften und die Rechtsprechung des Reichsgerichts, FS RG 1929, IV, 167 189 (171 ss.).

(49) DEGEN, Gegenseitiges Treuverhältnis zwischen Gesellschaftern einer GmbH oder Aktionären einer AG, JW 1929, 1346 1347 (1346/II e 1347/I).

(50) OSKAR NETTER, Die Fragebogen des Reichsjustizministeriums zur Reform des Aktienrechts, ZHB 1929, 161 171 (169/I),

(51) Idem, 169/II.

(52) MAX HOMBURGER, Die Anwaltschaft zur Aktienrechtsreform, ZHB 1930, 172 177 (176/I e 176/II).

(53) MAX HOMBURGER, anot. a RG 6 Fev. 1932, JW 1932, 1647/II.

(54) C. RITTER, Gleichmässige Behandlung der Aktionäre, JW 1934, 3025 3029 (3029/II).

(55) WOLFGANG SIEBERT, anot. a RG 22 Jan. 1935, JW 1935, 1553/I.

(56) RG 22 Jan. 1935, RGZ 146 (1935), 385 397 (396).

(57) RG 21 Set. 1938, RGZ 158 (1939), 248 256 (254).

(58) Vide o nosso Da situação jurídica laboral: perspectivas dogmáticas do Direito do trabalho, separata da ROA, 1982.

(59) HEINRICH STOLL, Gemeinschaftsgedanke und Schuldvertrag, DJZ 1936, 414 422 (415).

(60) STELZIG, Zur Treuepflicht des Aktionärs cit., 62 ss..

(61) ERICH FECHNER, Die Treubindungen des Aktionärs / Zugleich eine Untersuchung über das Verhältnis von Sittlichkeit, Recht und Treue (1942): um clássico a que teremos oportunidade de regressar.

(62) MARTIN WEBER, Vormitgliedschaftliche Treubindungen cit., 35.

(63) WALTHER RATHENAU, Vom Aktienwesen / Eine geschäftliche Betrachtung (1918).

(64) FRITZ HAUSMANN, Vom Aktienwesen und vom Aktienrecht (1928), 27; cf. ADOLF GROSSMANN, Unternehmensziele und Aktienrecht / Eine Untersuchung über Hand-lungsmassstäbe für Vorstand und Aufsichtsrat (1980), 142 e MICHAEL JÜRGENMEYER, Das Unternehmensinteresse (1984), 52 ss..

(65) Em especial: OSKAR NETTER, Zur aktienrechtlichen Theorie des “Unternehmens an sich”, FS Albert Pinner (1932), 507 612 (545 ss.).

(66) Com indicações, vide o nosso Da responsabilidade civil dos administradores das sociedades comerciais (1987), 501 502.

(67) Idem, 505 ss., onde pode ser confrontada a literatura pertinente.

(68) Retomada, com cautelas, por JULIUS VON GIERKE, Das Handelsunternehmen, ZHR 111 (1948), 1 17. Cf. o nosso Da responsabilidade civil cit., 505.

(69) Recordamos o clássico de BERND RÜTHERS, Die unbegrentze Auslegung / Zum Wandel der Privatrechtsordnung im Nationalsozialismus, 2.ª ed. (1973), bem como HANS PETER HAFERKAMP, Die heutige Rechtsmissbrauchslehre / Ergebnis nationalsozialistischen Rechtsdenkens? (1995), 178 ss..

(70) Pode se referir, BGH 9 Jun. 1954, como decisão que, premonitoriamente, fez referência à lealdade, ainda que a propósito de uma sociedade por quotas. Aí se explica que a interpretação do pacto social é uma questão de Direito, devendo sujeitar se à lealdade: BGHZ 14 (1954), 25 39 (37).

(71) BGH 5 Jan. 1975, BGHZ 65 (1976), 15 21 (18 e 21) = WM 1975, 1152 1154= = BB 1975, 1450 1451 = NJW 1976, 191 192 = JZ 1976, 408 409 = AG 1976, 16 19.

(72) BGH 16 Fev. 1976, BB 1976, 721 722.

(73) BGH 25 Fev. 1982, BGHZ 83 (1982), 123 144 = BB 1982, 827 832 = DB 1982, 795 799 = NJW 1982, 1703 1708 = WM 1982, 388 394 = AG 1982, 158 164 = JZ 1982, 602 608.

(74) BGH 13 Mai. 1985, NJW 1985, 2839 2831.

(75) BGH 1 Fev. 1988, BGHZ 103 (1988), 184 193 = NJW 1988, 1579 1582 = JR 1988, 505 509.

(76) BGH 20 Mar. 1995, NJW 1995, 1739 1749 (1741/II ss., com muitas indicações jurídico científicas).

(77) ERICH FECHNER, o já citado Die Treubindungen des Aktionärs / Zugleich eine Untersuchung über das Verhältnis von Sittlichkeit, Recht und Treue (1942), 106 pp..

(78) Idem, 12.

(79) Idem, 21 e 22.

(80) Idem, 24 a 28.

(81) Idem, 34 ss.; este aspecto é desenvolvido na segunda parte do livro de FECHNER.

(82) ALFRED HUECK, Der Treuegedanke im modernen Privatrecht (1947), 28 pp..

(83) Idem, 9.

(84) Idem, 9-12.

(85) Idem, 13, 14 e passim.

(86) Idem, 14.

(87) ALFRED HUECK, Der Treuegedanke im Recht der offenen Handelsgesellschaft, FS Hübner (1935), 71 92 (80): obra anterior.

(88) HERBERT WIEDEMANN, Minderheitenschutz und Aktienhandel (1968), 73 ss., com elementos comparatísticos norte americanos e Gesellschaftsrecht / Ein Lehrbuch des Unternehmens und Verbandsrechts 1 – Grundlagen (1980), § 8 (412 ss. e passim): aspectos retomados, p. ex., em FRANK ROITZSCH, Der Minderheitenschutz im Verbandsrecht (1981), 25 ss. (36).

(89) ULRICH IMMENGE, Der personalistische Kapitalgesellschaft / eine rechtsvergleichende Untersuchung nach deutschem GmbH Recht und dem Recht der Corporations in den Vereinigten Staaten (1970), 443 pp.; vide, aí, 132 ss. e passim.

(90) ULRICH IMMENGE, Aktiengesellschaft, Aktionärsinteressen und Institutionelle Anleger (1971), 8 e 21 ss..

(91) FRANK ROITZSCH, Der Minderheitenschutz im Verbandsrecht cit., 36 ss., como exemplo.

(92) WOLFGANG SCHILLING, BB 1975, 1451 1452, PETER ULMER, NJW 1976, 192 193 e VOLKER EMMERICH, JuS 1976, 54.

(93) HERBERT WIEDEMANN, Die Bedeutung der ITT Entscheidung, JZ 1976, 392 397.

(94) MARTIN WINTER, Mitgliedschaftliche Treuebindungen im GmbH Recht (1988), 1 ss..

(95) PETER ULMER, Der Gläubigerschutz im faktischen GmbH Konzern beim Fehlen von Minderheitsgesellschaftern, ZHR 148 (1984), 391 427 (404 ss.).

(96) WALTER STIMPEL, Die Rechtsprechung des Bundesgerichtshofs zur Innenhaftung des herrschenden Unternehmens im GmbH Konzern, AG 1986, 117 123.

(97) HARM PETER WESTERMANN, Organzuständigkeit bei Bildung, Erweiterung und Umorganisation des Konzerns, ZGR 1984, 352 382 (352 ss.), WOLFGANG ZÖLLNER, Die sogennanten Gesellschafterklagen in Kapitalgesellschaftsrecht, ZGR 1988, 392 440 (420), HARTWIN VON GERKAN, Die Gesellschafterklage, ZGR 1988, 441 452 (441 ss.), KLAUS BRONDICS, Die Aktionärsklage (1988), 45 ss. e THOMAS RAISER, Das Recht der Gesellschafterklagen, ZHR 153 (1989), 1 34 (4 ss.).

(98) BERNHARD GROSSFELD/KLAUS BRONDICS, Die Aktionärsklage / Nun auch im deutschen Recht, JZ 1982, 589 592 (592), concluindo que, para além das vantagens, esta orientação também tem riscos e ECKART SÖNNER, Aktionärsschutz und Aktienrecht / Anmerkungen zur Seehofenbetriebe Entscheidung BGH, AG 1983, 169 173 (173), manifestando receios.

(99) WINFRIED WERNER, Zuständigkeitsverlagerung in der Aktiengesellschaft durch Richterrecht?, ZHR 147 (1987), 429 453 (450 e 453).

(100) JOAHNNES SEMLER, Einschränkungen der Verwaltungsbefugnisse im einem Aktiengesellschaft, BB 1983, 1566 1578.

(101) HEINRICH GÖTZ, Die Sicherung der Rechte der Aktionäre der Konzernobergesellschaft bei Konzernbildung und Konzernleitung, AG 1984, 85 94.

(102) ECKARD REHBINDER, Zum konzernrechtlichen Schutz der Aktionäre einer Obergesellschfat / Besprechung der Entscheidung BGHZ 83, 112 “Holzmüller”, ZGR 1983, 92 108 (103 ss.).

(103) KLAUS PETER MERTENS, Die Entscheidungsautonomie des Vorstands und die “Basisdemokratie” in der Aktiengesellschaft (Anmerkung zu BGHZ 83, S. 122, “Holzmüller”), ZHR 147 (1983), 377 428 (427 428).

(104) Assim sucedeu com BGH 25 Nov. 2002, AG 2003, 273 276 = BGHZ 153 (2003), 47 61 (caso Macroton) e com BGH 26 Abr. 2004, AG 2004, 384 389 (caso Gelatine): na primeira, entendeu se que a assembleia geral podia remeter para a decisão a decisão quanto ao eventual delisting; na segunda, frisou se a excepcionalidade da doutrina Holzmüller, exigindo se maioria qualificada na assembleia.

(105) WOLFRAM TIMM, NJW 1988, 1582 1583 e R. BOMMERT, JR 1988, 509 511.

(106) MARCUS LUTTER, Die Treuepflicht des Aktionärs / Bemerkungen zur Linotype. Entscheidung des BGH, ZHR 153 (1989), 446 471.

(107) HOLGER ALTMAPPEN, NJW 1995, 1749/II a 1750/I e MARCUS LUTTER, Das Girmes Urteil, JZ 1995, 1053 1056 (1054 ss.).

(108) HERBERT WIEDEMANN, Zu den Treuepflichten im Gesellschaftsrecht, FS Heinsius 1991, 949 966.

(109) MARINA WELLENHOFFER KLEIN, Treuepflichten im Handels Gesellschafts und Arbeitsrecht / Eine Untersuchung zum deutschen, ausländischen und europäischen Recht, RabelsZ 64 (2000), 564 594.

(110) WIEDEMANN, Zu den Treuepflichten cit., 949.

(111) Idem, 953 ss..

(112) Idem, 957 ss..

(113) Idem, 960 ss..

(114) WELLENHOFFER KLEIN, Treuepflichten cit., 594.

(115) Idem, 571 ss. (quanto a sociedades alemãs), 575 ss. (quanto às outras) e 594 (a sistematização).

(116) Na origem, ainda que com terminologia incipiente: ROBERT FISCHER, Die Grenzen bei der Ausübung gesellschaftliche Mitgliedschaftslehre, NJW 1954, 777 780.

(117) IMMENGE, Die personalistische Kapitalgesellschaft cit., 261 ss..

(118) MARCUS LUTHER, Theorie der Mitgliedschaft / Prolegomena zu einem Allgemeiner Teil des Korporationsrechts, AcP 180 (1980), 84 159 (103) e THOMAS ZWISSLER, Treuegebot – Treuepflicht – Treuebindung / Die Lehre von den Anwendungsfelder im Recht der Aktiengesellschaft (2002), especialmente 45 ss. e 117 ss.. No plano dos grandes comentários, é essa a sistematização hoje adoptada; cf. GEORG WIESNER, no Münchener Handbuch des Gesellschaftsrechts, 4 – Aktiengesellschaft, 2.ª ed. (1999), § 17 (145 ss.), especialmente Nr. 14 ss. (150 ss.).

(119) MARCUS GEISSLER, Der aktienrechtliche Auskunftsanspruch im Grenzbereich des Missbrauchs, NZG 2001, 539 545 (542 e 545/II).

(120) VOLKER BEUTHIEN, Zur Mitgliedschaft als Grundbegriff des Gesellschaftsrechts – Subjektiven Recht oder Stellung im pflichthaltigen Rechtsverhältnis?, FS Wiedemann 2002, 755 768 (767).

(121) Vide o nosso SA: assembleia geral e deliberações sociais (2007), 135 ss..

(122) Vide TOBIAS TRÄGER, Treupflicht im Konzernrecht (2000), 378 pp..

(123) Cf., além das obras já referidas: MICHAEL AXHAUSEN, no Beck’sches Handbuch der GmbH, 3.ª ed. (2002), § 5, Nr. 170 (258).

(124) GEORG WIESNER, Münchener Handbuch des Gesellschaftsrechts, 2.ª ed., 3 (2003), § 17, III, Nr. 14 (150).

(125) Quanto à natureza jurídica da administração das sociedades, com indicações, vide os nossos Da responsabilidade civil cit., 335 ss. e Manual de Direito das sociedades 1 (2004), 699 ss..

(126) RG 23 Mai. 1919, RGZ 92 (1919), 53 57 (54).

(127) BGH 11 Jul. 1953, BGHZ 10 (1953), 187 196 (192).

(128) BGH 26 Mar. 1962, WM 1962, 578 579 (579/I).

(129) BGH 9 Nov. 1967, BGHZ 49 (1968), 30 33 (31).

(130) BGH 21 Dez. 1979, NJW 1980, 1629 1630 (1629 1630) e BGH 21 Fev. 1983, WM 1983, 498 500.

(131) Vide, como derivação da boa fé: ANDREAS PENTZ, em HEINZ ROWEDDER/CHRISTIAN SCHMIDT LEIHOFF, GmbHG, 4.ª ed. (2002), § 13, Nr. 35 ss., especialmente Nr. 72 (465) e MARCUS LUTTER/WALTER BAYER, em PETER HOMMELHOFF/MARCUS LUTTER, GmbH Gesetz Kommentar, 16.ª ed. (2004), § 14, IV (348 ss.), especialmente Nr. 24 (350).

(132) WILHELM F. BAYER, Kreditgewährung an Mitglieder der Geschäftsleitung und leitende Angestellte im Konzernrecht, BB 1956, 871 875, MARTIN PELTZER, Probleme

bei der Kreditgewährung der Kapitalgesellschaft an ihre Leitungspersonen, FS Rowedder 1994, 325 345 e HOLGER FLEISCHER, Aktienrechtliche Zweifelsfragen der Kreditgewährung an Vorstandsmitglieder, WM 2004, 1057 1067, com elementos de Direito comparado relativos ao Reino Unido, à França, à Itália e aos Estados Unidos.

(133) FRIEDRICH KÜBLER, Erwerbschancen und Organpflichten / Überlegungen zur Entwicklung der Lehre von den “corporate opportunities”, FS Werner 1984, 437 448 (referindo, 442, também o Direito norte americano), MAXIMILIAN SCHIESSL, Die Wahrnehmung von Geschäftschancen der GmbH durch ihren Geschäftsführen, GmbHR 1988, 53 56 (53/II); a proibição da concorrência, no Direito alemão, decorre legalmente para as sociedades em nome colectivo (§ 112 HGB) e para as sociedades anónimas (§ 88 AktG); há lacuna quanto às sociedades por quotas, o que obriga à competente integração, FRIED-RICH KÜBLER/JENS WALTERMANN, Geschäftschancen der Kommanditgesellschaft, ZGR 1991, 161 174 (165), HOLGER FLEISCHER, Zur organschaftlichen Treuepflicht der Ge-schäftsleiter im Aktiens und GmbH Recht, WM 2003, 1045 9158 (1054/II) e Gelöste und ungelöste Probleme der gesellschaftsrechtlichen Geschäftschancenlehre, NZG 2003, 985 992 (992/I), sublinhando o estar se perante um aspecto importante do dever de lealdade e THOMAS RAISER/RÜDIGER VEIL, Recht der Kapitalgesellschaften, 4.ª ed. (2006), § 14, Nr. 81 (167), com indicações.

(134) Cf. WOLFRAM TIMM, Wettbewerbsverbote und “Geschäftschancen” / Lehre im Recht der GmbH, GmbHR 1981, 177 186 (178/II ss. e 185/II).

(135) BGH 27 Jun. 1957, WM 1957, 1128 1131 (1130/I, referindo a boa fé e 1130/II, reportando a lealdade), BGH 16 Fev. 1981, GmbHR 1981, 189 191, quanto à permissão da concorrência e BGH 8 Mai. 1985, ZGR 1991, 162 163.

(136) Além de KÜBLER, Erwerbschancen cit., 442, cabe citar a monografia de JOHANNES WEISSER, Corporate opportunities / zum Schutz der Geschäftschancen des Unternehmens im deutschen und im US amerikanische Recht (1991), 293 pp..

(137) THOMAS M. J. MÖLLERS, Treuepflichten und Interessenkonflikte bei Vor-stands und Aufsichtsratsmitgliedern, em HOMMELHOFF/HOPT/VON WERDER, Handbuch Corporate Governance (2003), 405 427 (414 ss.).

(138) JOHANNES SEMLER, Geschäfte einer Aktiengesellschaft mit Mitgliedern ihres Vorstands, FS Rowedder 1994, 441 447.

(139) KONRAD DUDEN, Gleibehandlung bei Auskünften an Aktionäre, FS von Caemmerer 1978, 499 515 e KLAUS J. HOPT, Aktionärskreis und Vorstandsneutralität, ZGR 1993, 534 566 (embora sem referir, de modo expresso, a lealdade).

(140) MICHAEL KURT, Rechte und Pflichten des Vorstands der Zielgesellschaft bei Übernahmeversuchen, FS Marcus Lutter 2000, 1421 1447, KLAUS J, HOPT, Verhaltenspflichten des Vorstands der Zielgesellschaft bei feindlichen Übernahmen, idem, 1361 1400 e ROLAND HENS, Vorstandspflichten bei feindlichen Übernahmeangebote (2004).

(141) UWE HÜFFER, Aktiengesetz, 7.ª ed. (2006), § 93, Nr. 5 (485).

(142) ALFRED HUECK/LORENZ FASTRICHT, em BAUMBACH/HUECK, GmbH Gesetz, 18.ª ed. (2006), § 13, Nr. 27 ss. (248 ss.), especialmente Nr. 32 (250).

(143) Já GOTTFRIED KNÖPFEL, Die Treupflicht im Recht der GmbH (1954, dact.), 24 ss. (32).

(144) RAISER/VEIL, Recht der Kapitalgesellschaften, 4.ª ed. cit., § 14, Nr. 80 (166).

(145) HOLGER FLEISCHER, Wettbewerbs und Betätigungsverbote für Vorstandsmitglieder im Aktienrecht, AG 2005, 336 348.

(146) Avoque se o § 675 do BGB (Geschäftsbesorgung), a cujo propósito ocorre um específico dever de lealdade: HARTWIG SPRAU, no Palandts BGB, 66.ª ed. (2007), § 675, Nr. 5 (1047).

(147) MÖLLERS, Treuepflichten und Interessenkonflikte cit., 409 410 e RAISER/VEIL, Recht der Kapitalgesellschaften, 4.ª ed. cit., § 14, Nr. 81 (167).

(148) Vide o nosso Os deveres fundamentais dos administradores das sociedades (artigo 64.º/1 do CSC), ROA 2006, 443 488 (480 ss.). (149) Idem, 448 ss..

(150) Vide o nosso Da boa fé cit., 832 ss., com indicações.

(151) KLAUS J. HOPT, Die Haftung der Vorstand und Aufsichtsrat / Zugleich ein Beitrag zur corporate governance – Debate, FS Mestmäcker 1996, 909 931 (914 ss.).

(152) DETLEF KÖNIG, Gewinnhaftung, FS von Caemmerer (1978), 179 207 (179) e KONRAD RUSCH, Gewinnhaftung bei Verletzung von Treuepflichten cit., 1.

(153) KÖNIG, Gewinnhaftung cit., 207 e RUSCH, Gewinnhaftung bei Verletzung von Treuepflichten cit., 2.

(154) ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, A grande reforma das sociedades comerciais, O Direito 2006, 445 453.

(155) ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Os deveres fundamentais dos administradores das sociedades cit., 444 ss..

11/02/2025 15:02:59