Parecer sobre o Projecto do Novo Código do Processo Civil

Parecer da Ordem dos Advogados

("Projecto de Novo Código do Processo Civil")

 

 

            No início deste ano de 2012, o Ministério da Justiça submeteu a consulta pública um projecto de revisão do Código do Processo Civil.

A Ordem dos Advogados pronunciou-se sobre tal projecto de revisão, nos termos que constam do parecer que foi emitido, em 27 de Março de 2012.

 

O Ministério da Justiça veio agora, em Outubro de 2012, submeter a consulta pública um novo projecto que designou como "Projecto de Novo Código do Processo Civil".

 

Este novo projecto manteve todas as alterações que já  constavam no projecto de revisão que foi apresentado, no início de 2012, e sobre as quais a Ordem dos Advogados  já se pronunciou, no mencionado parecer, de 27 de Março de 2012, mas também introduziu novas alterações, como sejam, por exemplo, a da perda de eficácia da prova se, entre cada uma das sessões de julgamento, medear um período de tempo superior a 30 dias – cfr. n.º 4 do art. 606º, e a da extinção da instância da acção executiva, se o exequente não pagar os honorários e despesas do agente de execução, no prazo de 30 dias a contar da data em que tiver sido notificado para o fazer – cfr. n.º 3 do art. 722º.

 

Esta solução de extinção da instância da acção executiva, por falta de pagamento dos honorários e despesas do agente de execução, já foi objecto de crítica e de repúdio, pela Ordem dos Advogados, no parecer que emitiu sobre o "Anteprojecto de Decreto-Lei que aprova um conjunto de medidas urgentes e transitórias de combate à pendência em atraso no domínio da acção executiva", pois, como aí se referiu, ela subordina e submete o desfecho da acção executiva aos interesses profissionais do agente de execução que, embora legítimos, não podem ser  erigidos como causa de extinção da execução, sob pena de acção executiva, que é um meio de tutela pública coerciva para a efectivação de obrigações de natureza patrimonial, se transformar, por completo e sem qualquer réstia de pudor ou vergonha, numa justiça de parceria público-privada em que o Estado permite, deliberadamente e com a chancela legal, a total prevalência dos interesses pessoais e privados do agente de execução.

 

Com o projecto de Novo Código do Processo Civil, também é suprimido o processo declarativo sumário, visto que o processo sumaríssimo já tinha sido retirado no projecto inicial, passando a existir uma única forma de processo comum – cfr. art. 549º - e o processo de inventário e de partilha também é retirado do código, não obstante ainda não ter sido aprovado e publicado o regime do inventário, cuja direcção e tramitação, pelos vistos, se persiste em cometer aos notários, conforme projecto sobre o qual a Ordem dos Advogados também já teve a oportunidade de emitir o respectivo parecer negativo.

 

São ainda suprimidos, no projecto de Novo Código do Processo Civil, os processos especiais de expurgação de hipotecas e da extinção de privilégios, da venda antecipada de penhor, da prestação de contas e de divisão de coisa comum, não se alcançando qual a razão ou razões que poderão ter servido de fundamento à supressão destes dois últimos processos especiais, dado que os mesmos comportam especificidades que justificam a manutenção da sua regulação, como processos especiais.

 

A par das referidas alterações e supressões, o novo projecto procedeu a uma nova numeração de todos os artigos, ficando o Código com o total de 1068 artigos, em vez dos actuais 1528 artigos,  e foram feitas algumas modificações na respectiva sistemática, pois os princípios da direcção e de inquisitório, da adequação formal e da cooperação e os deveres de boa fé processual e de recíproca correcção que se encontram colocados, na parte relativa ao início e desenvolvimento da instância, foram deslocados para o Título I sobre disposições e princípios fundamentais que marca o início do Livro I, relativo à acção, às partes e ao tribunal,  e a  instrução do processo que, do ponto de vista sistemático, estava inserida como uma das fases do processo de declaração, passou a ser regulada no livro imediatamente anterior, mais precisamente no Título V do Livro II, relativo ao Processo em Geral.

 

Através da renumeração de todos os artigos do código e das alterações que se preconiza introduzir-lhe, pretendeu-se ter conseguido criar um novo Código de Processo Civil, como se considerou, na exposição de motivos, quando aí se diz que " O acervo das alterações ora introduzidas permite classificar esta reforma como a mais profunda realizada no processo civil português desde 1939, o que, só por si, justifica que estejamos perante um novo código de processo civil, com nova sistematização, sendo de referir a transferência das disposições relativas aos princípios gerais para os preceitos iniciais e a deslocação das disposições relativas à instrução do processo, bem como a eliminação de processos especiais que, actualmente, já não se justificam. Tal opção tem, além do mais, a vantagem de pôr fim à autêntica “manta de retalhos” em que está transformado o diploma, pejado de preceitos revogados e preceitos aditados (muitos deles também já revogados). ".

 

A obsessão desta reforma é, pois, em termos psicanalíticos freudianos, a de o filho matar o pai, pois, para os mentores da reforma agora proposta, todos os males da justiça cível derivariam do Código de Processo Civil de 1939 e do pensamento processualista do respectivo autor.

 

Porém, apesar de a reforma pretender banir do processo civil os quadros de pensamento do processo civil produzidos e concretizados, por José Alberto dos Reis, afigura-se que não se conseguiu libertar da sombra tutelar do finado professor, pois  as soluções que propõe filiam-se ainda numa ideia de dirigismo autoritário do processo, agora já não através de normas da lei processual que  regulamentavam tal dirigismo, como o preconizava o velho mestre, mas sim através de decisões casuísticas e "ad hoc", proferidas no uso de poderes discricionários e irrecorríveis que são conferidos ao juiz em matéria de adequação formal e de direcção e gestão processuais – cfr. n.º 3 do art. 7º e n.º 2 do art. 8º, e bem assim pela outorga de poderes inquisitórios, para investigar livremente factos instrumentais ou que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado – cfr. n.º 2 do art. 5º, em nome de uma suposta procura da verdade material, retirando o juiz da posição de imparcialidade e de terzietà relativamente aos intertesses de natureza privada que as partes discutem entre si, para o colocar na posição de entidade  dirigista e inquisitória que sabe sempre o que será melhor para a resolução dos litígios que são submetidos à sua apreciação e decisão, pelos respectivos concidadãos.

 

            E, quer se queira, quer não, é esta visão de juiz dirigista e inquisitório que continua a pairar nas opções e nas soluções preconizadas, pelos autores da reforma, e da qual os mesmos  não se conseguiram libertar, apesar das proclamações de morte ao pai fundador,  pois as soluções que conseguiram pensar e adoptar têm sempre como ponto de partida e de inspiração a reacção e a subversão das soluções criadas e implementadas, pelo  mestre de Coimbra.

 

Isto é, querendo libertar-se da sombra tutelar do mestre fundador, não conseguem  engendrar uma nova formade pensar o processo civil, apesar de insistentemente repetirem que a alcançaram, e, à míngua de tal, querem produzir um Novo Código do Processo Civil,  reescrevendo o original do velho mestre que alteram e desfiguram,  dado que as soluções que propõem têm como único propósito depôr e destronar as antigas soluções, as quais, sendo questionáveis nos tempos actuais, pois foram fruto de um pensamento político, social e jurídico da época, apresentavam, no entanto, coerência e operatividade que o bisturi dos reformadores actuais não consegue repôr e alcançar, nas alterações que preconizam. Veja-se, a este propósito, a exaltação e as virtualidades salvíficas que, na exposição de motivos do projecto inicial, foram atribuídas ao "novo figurino da audiência preliminar", agora designada, no projecto final, como audiência prévia – cfr. art. 592º.

 

Na verdade,  o Projecto do Novo Código do Processo Civil mais não é do que uma "vulgata" do pensamento que encara o juiz, como uma espécie de entidade iluminada e infalível que sabe sempre tudo o que mais convém e é o melhor e o mais adequado para a resolução das disputas e dos litígios que lhe sejam submetidos, pelos seus concidadãos.

 

Veja-se, a este propósito, a solução preconizada no n.º 3 do art. 595.º do projecto do Novo Código do Processo Civil, no qual se determina, sem qualquer pudor ou timidez pela inevitável maculação com que se fere a posição de imparcialidade e de terzietà do juiz, que este deve  empenhar-se ativamente na obtenção da solução de equidade mais adequada aos termos do litígio, precrevendo-se, no n.º 4 subsequente, que, frustrando-se, total ou parcialmente, a conciliação, ficam consignadas em ata as concretas soluções sugeridas pelo juiz, bem como os fundamentos que, no entendimento das partes, justificam a persistência do litígio. ( sublinhados nossos).

 

É caso para dizer que um juiz que assim proceder ficará ferido de suspeição para intervir na apreciação e decisão dos termos subsequentes da causa, pois se o mesmo se teve de empenhar activamente, na obtenção de soluções de equidade para o litígio, o mesmo não se encontra nas devidas condições de imparcialidade para, subsequentemente, apreciar e julgar a causa, segundo o direito que lhe fôr aplicável.

 

Esta solução  não constava do projecto de revisão do CPC apresentado, no início de 2012, mas consta agora do projecto de novo código do processo civil e demonstra bem qual o entendimento que os autores da reforma têm sobre o papel do juiz na resolução dos litígios cíveis.

 

Por outro lado, a tantas vezes repetida divisa da reforma que proclama, como seu intento primordial, o primado da substância sobre a forma, mais não é do que uma falácia, pois aquilo que se considera ser soluções de primado da substância sobre a forma são soluções em que a forma continua presente, como não podia deixar, pois forma e substância são dois elementos essenciais e incindíveis de toda e qualquer realidade, dado que não existe substância sem forma e não há forma sem substância.

 

Porém, aquilo que se considera primado da substância sobre a forma não é senão o primado de soluções, cuja forma é criada e ditada, pela decisão casuística e discricionária do juiz, substituindo-se a regulação legal dos aspectos formais  por uma regulação casuística e criada  "ad hoc", por decisão discricionária do próprio juiz.

 

Ou seja, à forma e formalidades legalmente previstas e reguladas substitui-se a forma e formalidades que o juiz entenda criar ou substituir.

 

O que se pretende é substituir esses formalismos que estavam antecipadamente previstos e regulados, na e pelalei, por outros formalismos não cognoscíveis, prévia e antecipadamente, pois só serão conhecidos das partes e dos respectivos mandatários, quando o juiz  os decidir e decretar, no processo.

 

Portanto, a  proclamada divisa do primado da substância sobre a forma é, na realidade, um disfarce que se destina a ampliar o poder discricionário de o juiz criar e ditar, no processo, as formalidades processuais que bem entender.

 

Veja-se, por exemplo, as controvérsias e as incertezas que se irão desencadear com o cumprimento e a execução do despacho destinado a "enunciar os temas da prova" a que se alude no n.º 1 do art. 597º do projecto final.

 

Os autores da reforma não precisam minimamente o que sejam "temas da prova", limitando-se a dizer, na exposição de motivos, que " Relativamente aos temas da prova a enunciar, não se trata mais de uma quesitação atomística e sincopada de pontos de facto, outrossim de permitir que a instrução, dentro dos limites definidos pela causa de pedir e pelas excepções deduzidas, decorra sem barreiras artificiais, com isso se assegurando a livre investigação e consideração de toda a matéria com atinência para a decisão da causa. Quando, mais adiante, o juiz vier a decidir a vertente fáctica da lide, aquilo que importará é que tal decisão expresse o mais fielmente possível a realidade histórica tal como esta, pela prova produzida, se revelou nos autos. Estamos perante um novo paradigma que, por isso mesmo, tem necessárias implicações, seja na eliminação de preclusões quanto à alegação de factos, seja na eliminação de um nexo directo entre os depoimentos testemunhais e concretos pontos de facto pré-definidos, seja ainda na inexistência de uma decisão judicial que, tratando a vertente fáctica da lide, se limite a “responder” a questões (não formuladas, aliás). "  (sublinhado nosso).

 

Mas o que são então os "temas da prova" ?

 

Trata-se de uma expressão que não tem qualquer tradição, no nosso ordenamento jurídico, e que, por isso mesmo, os mentores da reforma deveriam ter definido e precisado, pois, a fazer fé no que é declarado na exposição de motivos,  não se trata mais de uma quesitação atomística e sincopada de pontos de facto,  devendo, por isso, definir e precisar o que é pretendem significar com a enunciação dos temas da prova.

 

Mas se se olhar para o que é declarado a este respeito, na exposição de motivos, não restam dúvidas que os próprios autores da reforma também não têm ideias minimamente claras, precisas e operatórias sobre o que sejam "temas da prova", dado que se limitam a preconizar que a sua enunciação há-de permitir que a instrução decorra sem barreiras artificiais, com isso se assegurando a livre investigação e consideração de toda a matéria com atinência para a decisão da causa.

 

 A apregoada ideia de extirpar o processo de tudo o que seja dilatório e inútil transbordará assim num "voyeurismo" total conduzido, pelo juiz, através da livre investigação e consideração de toda a matéria com atinência para a decisão da causa, ou seja, transformando a audiência final num folhetim  probatório sobre todos os factos com ou sem relevância para a resolução do litígio.

 

Ou seja, se o que a reforma pretende é que na altura do julgamento se possam carrear para o processo todas as questões da realidade fáctico-histórica do litígio, independentemente da sua atempada alegação e da aquilatação da respectiva relevância segundo as várias soluções plausíveis da causa, então o resultado será um maior improviso e indisciplina sobre o acervo factual relevante e carecido de prova.

 

Na verdade, tal propiciará  não só a discussão sobre questões fácticas, cuja relevância ou irrelevância só se ficará a saber,  na decisão da matéria de facto,  como ainda permite  que sejam carreados factos instrumentais ou complementares sobre  cuja prova uma ou ambas as partes poderão não ter contado, quando, no momento dos articulados, já foram obrigadas a apresentar e a requerer os respectivos meios de prova, pois o despacho que enuncia os temas da prova é proferido depois do momento em que as partes já devem ter apresentado e requerido os respectivos meios de prova.

 

Além disso, a um facto instrumental destinado a demonstrar um facto essencial à pretensão ou à excepção pode ser oposto um outro facto instrumental destinado a neutralizá-lo ou a infirmá-lo e assim sucessivamente, o que quer dizer que, perante um determinado tema de prova, se pode seguir e suceder um carrear infindável de factos instrumentais que nunca nenhuma das partes havia carreado para o processo, antes da audiência final.

 

            Acresce que, após a enunciação de temas de prova e atento o poder inquisitório, o juiz poderá  investigar livremente quaisquer factos instrumentais ou compelementares e carreá-los para o processo, mesmo que a parte a quem esses factos sejam favoráveis se não queira aproveitar dos mesmos, o que também fere de morte o princípio do dispositivo.

 

            Sob o pretexto da invocação do juiz das liberdades, o legislador tem colocado este último na posição de juiz inquisitorial, ao atribuir-lhe a missão de investigar livremente, leia-se arbitrária e discricionariamente, a chamada  verdade material, como se a função do juiz fosse a de investigar e não de julgar com serenidade e imparcialidade os feitos e factos que lhe são submetidos a julgamento, deixando a pairar a ideia de que o paradigma de "juiz das liberdades" que o legislador cultiva é o de juiz da Inquisição.

 

Antes de concluir,  far-se-ão ainda algumas observações.

 

A primeira é para assinalar que, conforme resulta dos n.ºs 3 e 4 do art. 607º do projecto final, a decisão da matéria de facto passa a ser feita na própria sentença, o que não constava do projecto inicial, suprimindo-se, por isso, a possibilidade de reclamar sobre a obscuridade, contradição ou deficência da decisão sobre a matéria de facto.

E, quando não fôr possível proferir a sentença, no prazo de 30 dias, a fim de impedir a perda de eficácia da prova, o juiz deve proferir a decisão da matéria de facto em despacho autónomo, no prazo de 30 dias, sob pena de a produção de prova perder eficácia, mas, em relação a tal despacho, também não é prevista a possibilidade de reclamação, dado que a correspondente decisão "se incorpora na sentença" – cfr. art. 613º do projecto final.

 

A segunda observação é também para assinalar que, nos termos do n.º 3 do art. 158º do projecto final, o juiz deve consignar no processo a concreta razão da inobservância do prazo, sempre que tenham decorrido três meses sobre o termo do prazo fixado para a prática de ato próprio do juiz, sem que o mesmo tenha sido praticado .

O mesmo é determinado em relação aos actos da secretaria, pelo n.º 4 do art. 164º do projecto final, que impõe a abertura de conclusão com a indicação da concreta razão da inobservância do prazo, sempre que tenham decorrido 10 dias sobre o termo do prazo fixado para a prática de ato próprio da secretaria, sem que o mesmo tenha sido praticado.

 

A terceira observação  diz respeito ao conceito de acção executiva adoptado no n.º 3 do art. 27º do projecto final, segundo o qual "  Dizem-se ações executivas aquelas em que o autor requer as providências adequadas à reparação efetiva do direito violado. " (sublinhado nosso).

 

            Ora, salvo o devido respeito e de acordo com o disposto no art. 817º do Código Civil, a acção executivo tem por objecto a realização coactiva da obrigação ou das obrigações que não foram cumpridas voluntariamente e tal é feito, através da execução do património do devedor.

 

Por isso, não se afigura acertado dizer que a acção executiva se destina à obtenção das providências adequadas para reparação do direito violado, pois tal reparação há-de resultar e já estar decretada ou estabelecida, no título executivo que serve de base à execução.

 

            A quarta observação refere-se à manutenção da norma do n.º 4 do art. 32º do actual CPC e que é reproduzida no n.º 3 do art. 57º do projecto final, segundo a qual quando não haja advogado na comarca, o patrocínio pode ser exercido por solicitador.

 

            Trata-se de causas em que é obrigatória a constituição de advogado e em que, face à facilidade de comunicação e à consequente proximidade, não se justifica a manutenção de tal regra que afasta a obrigatoriedade de patrocínio por advogado, nas acções e procedimentos em que a lei o impõe, para o permitir a solicitador, com a consequente menor preparação que legalmente se exige à profissão de solicitador, para esse efeito.

 

            A quinta observação decorre do facto de o art. 68º do projecto final, que reproduz o que consta do  art. 43º do actual CPC, permitir a nomeação oficiosa de advogado, pelo Presidente do Conselho Distrital da Ordem dos Advogados, se a parte não encontrar na circunscrição judicial quem aceite voluntariamente o seu patrocínio.

            Esta solução deixou de fazer sentido, em face de alterações legislativas posteriores.

 

            Em primeiro lugar, porque está estabelecido e regulamentado um sistema de acesso ao direito e, por isso, não é justificado que se efectuem nomeações oficiosas que não se encontrem compaginadas e compreendidas, nesse regime legal.

            E, em segundo lugar, porque as normas dos referidos arts. 43º e 68º, respectivamente, do actual CPC e do projecto final, são omissas sobre quem é responsável pelo pagamento da remuneração e despesas do advogado oficioso, cuja nomeação é aí prevista.

 

            A sexta observação resulta, certamente, de haver um lapso no projecto final, dado que o estabelecido no n.º 2 do art. 553º, para a petição inicial, e depois na alínea d) do art. 573º, para a contestação, obrigando a requerer a gravação da audiência, quando seja admissível recurso ordinário da decisão final, não se conjuga e coaduna com o já previsto, a esse respeito, no n.º 1 do art. 157º , no qual se estabelece que "A audiência final de ações, incidentes e procedimentos cautelares é sempre gravada, devendo apenas ser assinalados na ata o início e o termo de cada depoimento, informação, esclarecimento, requerimento e respetiva resposta, despacho, decisão e alegações orais. "  ( sublinhado nosso).

 

            Também se afigura ter existido lapso, quando no n.º 1 do art. 915º do projecto final, referente ao processo especial de consignação em depósito, se remete para a subsequente aplicação do processo ordinário ou sumário, dado que, nos termos do art. 549º do dito projecto final, o processo comum segue forma única.

 

            Por último, também não se afigura justificado permitir o recurso de revisão, sem limite de qualquer prazo, em relação a decisões respeitantes a direitos de personalidade, como se afigura resultar da alteração já preconizada no projecto inicial, em relação ao n.º 2 do art. 772º do actual CPC, e que agora consta do disposto no n.º 2 do art. 698º do projecto final, cujo teor se transcreve:

" 2 -  O recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, salvo se respeitar a direitos de personalidade, e o prazo para a interposição é de 60 dias, contados:

a) No caso da alínea a) do artigo anterior, do trânsito em julgado da sentença em que se funda a revisão;

b) No caso da alínea f) do artigo anterior, desde que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva;

c) Nos outros casos, desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão.  "  ( sublinhado nosso).

 

            Na verdade, embora os direitos de personalidade possam justificar um alargamento do prazo de 5 anos sobre o trânsito em julgado da decisão a rever, não se crê que a segurança jurídica resultante de uma decisão transitada em julgado e que também  representa um valor essencial para o Direito, possa ser  posta em causa a todo o tempo, caso a mesma diga respeito a direitos de personalidade.

 

CONCLUSÃO

 

A Ordem dos Advogados dá aqui como reproduzido o teor do parecer que emitiu, em 27 de Março de 2012, sobre o projecto de revisão do Código de Processo Civil que foi submetido a consulta pública, no início do ano de 2012, dado que, no  "Projecto de Novo Código do Processo Civil" ora em apreço, foram mantidas as alterações já preconizadas, no mencionado projecto incial.

 

 No tocante a este "Projecto de Novo Código do Processo Civil", a Ordem dos Advogados  considera, salvo melhor opinião, que não se justificam as alterações sistemáticas e a renumeração dos artigos do actual Código de Processo Civil, bem com a supressão dos processos especiais que tal projecto pretende levar por diante, dado que, salvo o devido respeito e ao contrário do que se afirma, na exposição de motivos, " O acervo das alterações ora introduzidas NÃOpermite classificar esta reforma como a mais profunda realizada no processo civil português desde 1939, NEM afirmarque estejamos perante um novo código de processo civil ", pois o Novo Código do Processo Civil  agora proposto não é mais do que um trabalho de reescrita do original que, com todas as críticas e defeitos de que padece e que lhe podem ser assacados, é sempre preferível a uma cópia desfigurada.

 

Lisboa, 18 de Outubro de 2012

 

 

A Ordem dos Advogados

António Marinho e Pinto


Relator: Conselho Geral

25/07/2025 23:29:18