Peritos querem que se torne público relatório sobre óbitos maternos
Há dois anos, anunciava-se uma investigação à mortalidade materna registada em 2020. Naquele ano, 17 mulheres morreram devido a complicações da gravidez, parto e puerpério, levando a taxa de mortalidade ao valor mais alto dos últimos 38 anos, conforme noticiou o JN na altura. A comissão encarregue de analisar aqueles óbitos entregou o seu relatório ainda ao anterior Executivo, atualizando-o há cerca de um mês, estando na Direção-Geral da Saúde (DGS). Defendendo os peritos que se torne público. Já a DGS remete esclarecimentos para aquando da sua publicação.
“A Comissão [de Acompanhamento da Mortalidade Materna] produziu o relatório ainda na altura do anterior Governo, enviou para a DGS e para o Ministério, o que se passou não lhe sei dizer”, diz, ao JN, o obstetra Diogo Ayres de Campos, que integra aquele grupo de trabalho. Posteriormente, e porque a “Dra. Rita Sá Machado [diretora-geral da Saúde] considera o assunto prioritário”, houve nova reunião, com uma “revisão das conclusões” há cerca de um mês, esclarece.
“O relatório está na DGS para ser publicado”, afirma a ginecologista e obstetra Marina Moucho , membro daquela comissão. Questionada pelo JN, a DGS apenas fez saber que “o relatório referente à mortalidade materna ainda está a ser desenvolvido” e que só prestará esclarecimentos quando o mesmo for divulgado.
Para a também diretora do serviço de obstetrícia do Centro Hospitalar Universitário de São João, “era importante que saísse o relatório para se avaliar os cuidados de saúde maternos”. Vincando que a “rede de referenciação continua a funcionar bem”. Apontando o dedo, tal como Diogo Ayres de Campos, à forma como é registado o óbito pelos médicos no SICO, fazendo com que o país, em matéria de mortalidade materna, passasse da subnotificação à sobre notificação.
Registo do óbito
“Cerca de menos de 40% das mortes não eram [maternas], eram coincidentes com a gravidez, mas não pela gravidez”, explica o obstetra. Recordando que os EUA e outros países do Norte da Europa viram a taxa disparar devido à “forma de reportar as mortes maternas”. No caso dos EUA, para 70 óbitos por 100 mil nados-vivos.
Em Portugal, em 2020, chegou-se aos 20,1/100 mil, sendo preciso recuar a 1982 para encontrar taxa superior. “Acho que a nossa taxa anda à volta dos 10 a 11 por 100 mil. Não quer dizer que não tenha havido aumento. Devia ser menor comparativamente com outros países”, diz.
Além do registo do óbito, importa perceber o impacto do local do parto, das comorbilidades, da idade da grávida, do acesso a cuidados a saúde naqueles números (ler ao lado). Razão pela qual entendem que o relatório deveria ser tornado público. Além de se estudar e analisar a morbilidade materna grave, defendem os dois obstetras. Avaliação que, no seu conjunto, “devia fazer parte da rotina”, defende Ayres de Campos.
A saber
Conceitos
A DGS segue as recomendações da Organização Mundial de Saúde, segundo a qual o óbito materno é a “morte de uma mulher enquanto grávida ou até 42 dias após o termo da gravidez”. De acordo com esta definição, foram 17 os óbitos, em 2020; e 7, em 2021, baixando a taxa de mortalidade para 8,8/100 mil nados-vivos. Se incluídos os óbitos entre os 43 dias e um ano, naquilo que se define como mortalidade materna tardia, em 2020 foram 19, em 2021 10 e em 2022 15, de acordo com os dados do INE, que não dispõe, ainda, dos dados sobre óbitos maternos em 2022.
O que se sabe
Na altura, a DGS fez saber ao JN que dos 17 óbitos registados em 2020, 13 ocorreram em instituições de saúde. Sendo que 8 ocorreram durante a gravidez, 1 durante o parto e os restantes no puerpério. No Parlamento, Graças Freitas revelou que mais de 76% das grávidas tinham uma patologia grave e que metade tinha mais de 35 anos.
A reter
20,1
Taxa de mortalidade
Chegou aos 20,1 óbitos por 100 mil nados-vivos em 2020, no valor mais alto dos últimos 38 anos. No ano seguinte, com sete óbitos maternos (ler ao lado), baixou para os 8,8 por 100 mil.
30,9
Idade das mães
No ano passado, a idade média da mãe ao nascimento do primeiro filho fixou-se nos 30,9 anos. Já a idade média ao nascimento de um filho estava nos 32,1 anos, das mais altas da União Europeia.