Luís de Lima Pinheiro - Convenção de arbitragem (aspectos internos e transnacionais)


CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM
(ASPECTOS INTERNOS E TRANSNACIONAIS)(*)


Pelo Prof. Doutor Luís de Lima Pinheiro(**)

SUMÁRIO:

INTRODUÇÃO. I–ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA EM GERAL.
A) Convenção de arbitragem e competência do tribunal arbitral. B) Relevância da convenção de arbitragem perante os tribunais estaduais. C) Pressupostos e requisitos de validade da convenção de arbitragem em geral. D) Arbitrabilidade da controvérsia. E) Autonomia da cláusula compromissória.
II – ARBITRAGEM TRANSNACIONAL. A) Validade da convenção de arbitragem em geral. B) Validade formal da convenção de arbitragem. C) Arbitrabilidade da controvérsia. BIBLIOGRAFIA

INTRODUÇÃO

A arbitragem voluntária é um modo de resolução jurisdicional de controvérsias em que, com base na vontade das partes, a decisão é confiada a terceiro (1). Entende-se aqui por terceiro um particular distinto de qualquer das partes e que não actua como seu representante.

O acordo das partes em submeter a resolução de um ou mais litígios determinados ou determináveis a arbitragem constitui a convenção de arbitragem. Este conceito de convenção de arbitragem foi adoptado pela Convenção de Nova Iorque sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras (1958, art. 2.°/1) (2) e é comum aos principais sistemas nacionais (3).

A arbitragem voluntária baseia-se pois na convenção de arbitragem. Acresce que a constituição do tribunal arbitral e o processo arbitral podem ser em vasta medida auto-regulados pelas partes. Com efeito, os principais sistemas nacionais limitam-se a enquadrar a arbitragem, delegando nas partes (e, na sua omissão, nos árbitros) a definição da maior parte dos preceitos aplicáveis à organização da arbitragem. A autonomia das partes apenas é balizada por algumas regras e princípios que exprimem exigências mínimas de justiça processual.

O estudo do regime jurídico da convenção de arbitragem constitui assim um aspecto central da investigação científica em matéria de arbitragem e toca em muitos dos problemas que mais assiduamente são colocados pela prática arbitral.

Os problemas de regulação jurídica colocados pela convenção de arbitragem são, em parte, comuns a todas as arbitragens voluntárias e, noutra parte, específicos da arbitragem transnacional. O presente estudo ocupar-se-á, em primeiro lugar, dos aspectos comuns a todas as arbitragens voluntárias (I), examinando em seguida os aspectos específicos da arbitragem transnacional (II).

O conceito de arbitragem transnacional foi analisado em trabalho anterior dedicado ao Direito aplicável ao mérito da causa na arbitragem transnacional (4). Para o presente estudo releva uma acepção ampla de arbitragem transnacional, que abrange toda a arbitragem voluntária que em virtude de contactos juridicamente relevantes com mais de um Estado coloca um problema de determinação do Direito aplicável. Mas tem-se em primeira linha em vista a arbitragem transnacional em sentido estrito, i.e., a que põe em jogo interesses do comércio internacional.

I. ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA EM GERAL

A) Convenção de arbitragem e competência do tribunal arbitral

A generalidade dos sistemas consultados admite que a convenção de arbitragem revista as modalidades de compromisso arbitral ou de cláusula compromissória (5).

Na Convenção de Nova Iorque (art. 2.°/2), na Convenção de Genebra sobre a Arbitragem Comercial Internacional (1961, art. 1.°/2/a), na Lei-Modelo da CNUDCI (art. 7.°/1) e em parte dos sistemas consultados (6), a cláusula compromissória distingue-se do compromisso arbitral por constituir uma cláusula contratual.

Perante a lei portuguesa, diferentemente, a distinção traça-se em função do carácter actual ou futuro dos litígios que são objecto da convenção de arbitragem (art. 1.°/2 LAV) (7). Considera-se “cláusula compromissória” a convenção de arbitragem que visa litígios futuros, e que tanto pode constituir uma cláusula contratual como um negócio jurídico autónomo (8). Aliás a própria lei admite que a “cláusula compromissória” tenha por objecto os litígios eventuais emergentes de uma relação jurídica extracontratual (art. 1.°/2) (9).

As leis francesa (art. 1447.° NCPC) e brasileira (art. 9.° da Lei de arbitragem e arts. 851.° e 853.° do Código Civil de 2002) também parecem seguir este critério, mas confinam a cláusula compromissória aos litígios emergentes de um contrato (art. 1442.° NCPC fr. e art. 4.° da Lei brasileira de arbitragem).

Sucede, todavia, que a Lei brasileira de arbitragem limita a eficácia da cláusula compromissória. Na verdade, esta lei ainda denota a influência da tese tradicional segundo a qual a cláusula compromissória é um mero contrato-promessa que obriga as partes a celebrar o compromisso arbitral (contrato definitivo), também divulgada entre nós na vigência do Título I do Livro IV do Código de Processo Civil de 1961 (10).

Assim, a cláusula compromissória não é, em princípio, suficiente para a instauração do tribunal arbitral, sendo necessário que as partes celebrem um compromisso arbitral que designe o árbitro ou árbitros ou a entidade designadora (arts. 6.° e 10.°/II da Lei brasileira de arbitragem). Se a parte, convocada para celebrar o compromisso arbitral, não comparecer ou se recusar a firmá-lo, a outra parte pode promover a execução específica do compromisso arbitral (arts. 6.°/§ único e 7.°) (11).

No entanto, segundo interpretação acolhida pelo Supremo Tribunal e que conta com considerável apoio no texto legal (arts. 5.° e 6.°), a cláusula compromissória é suficiente para o início da arbitragem se incorporar um mecanismo que permita a constituição do tribunal arbitral, quer por estipulação directa das partes quer por meio de referência a um regulamento de arbitragem (12).

A Convenção de Nova Iorque (art. 2.°/1), a Lei-Modelo da CNUDCI (art. 7.°/1) e a maior parte das legislações consultadas exigem que os litígios futuros visados pela convenção de arbitragem sejam emergentes de uma relação jurídica determinada (13). O mesmo entendimento é seguido à face da lei suíça (14).

As partes podem limitar a convenção de arbitragem ao seu conteúdo essencial (submissão da resolução de um ou mais litígios determinados ou determináveis a arbitragem) ou nela incluir outros elementos. Caso as partes convencionem o recurso a um centro institucionalizado de arbitragem, poderão ser dispensáveis elementos acessórios, visto que o centro disporá, em princípio, de um regulamento de arbitragem adequado. Já na hipótese de uma arbitragem ad hoc, será avisado que as partes regulem alguns aspectos da arbitragem, designadamente a fixação da sede do tribunal arbitral e a constituição do tribunal arbitral.

Todos os sistemas consultados admitem que as partes remetam, pelo menos em matéria de processo, para um regulamento de arbitragem ou para outros complexos normativos. Tratando-se de arbitragem transnacional, se o Direito aplicável ao mérito da causa não resultar de uma convenção prévia, será sempre recomendável que as partes o designem.

A convenção de arbitragem produz essencialmente efeitos processuais (atribuição de competência ao tribunal arbitral e excepção processual perante os tribunais estaduais). Quando constitua um negócio autónomo trata-se, por isso, de um negócio jurídico-processual (15).

A competência do tribunal arbitral é um requisito de validade da decisão arbitral. A incompetência do tribunal arbitral constitui normalmente um fundamento de impugnação da decisão arbitral, de oposição à execução e de oposição ao reconhecimento da decisão arbitral “estrangeira”.

O tribunal arbitral só tem competência declarativa. Por isso é necessário recorrer aos tribunais estaduais para a execução forçada da decisão arbitral e das providências cautelares que sejam decretadas pelo tribunal arbitral (16).

A lei portuguesa enuncia os casos em que o compromisso arbitral caduca ou a cláusula compromissória fica sem efeito relativamente ao litígio submetido a arbitragem (17). O mesmo se verifica, relativamente ao compromisso arbitral, com a Lei brasileira de arbitragem (art. 12.°).

A caducidade ou ineficácia superveniente da convenção tem por consequência que a instância arbitral se extingue e que qualquer das partes pode instaurar uma acção judicial sem se ver confrontada com a excepção de preterição de tribunal arbitral.

Se, apesar disso, o processo arbitral prosseguir, a decisão arbitral que venha a ser proferida é anulável, perante a lei portuguesa, com fundamento em incompetência do tribunal (art. 27.°/1/b LAV), contanto que a anulação seja pedida por parte que, sem sucesso, tenha alegado a incompetência do tribunal no decurso da arbitragem ou que não tenha tido conhecimento deste fundamento de anulação no decurso da arbitragem (art. 27.°/2) (18).

B) Relevância da convenção de arbitragem perante os tribunais estaduais

A convenção de arbitragem pode ser invocada perante os tribunais estaduais como excepção processual deduzida em acção relativa a um litígio abrangido pela convenção de arbitragem, como fundamento de uma medida de assistência à arbitragem ou como fundamento de outro pedido relativo à arbitragem, designadamente em sistemas que admitam acções de simples apreciação da validade da convenção de arbitragem (19) ou acções de cumprimento da convenção de arbitragem (20).

Aqui interessa examinar a excepção de preterição de tribunal arbitral que, sob diferentes designações e regimes, é conhecida da maioria dos sistemas consultados.

Entre nós, trata-se de uma excepção dilatória prevista no art. 494°/j CPC que, conduzindo à absolvição do réu da instância (arts. 288.°/1/e e 493.°/2), obsta à apreciação do mérito da causa.

Esta excepção depende de invocação pela parte interessada (art. 495.° CPC). Este regime de conhecimento da excepção está em harmonia com a livre revogabilidade da convenção de arbitragem (art. 2.°/4 LAV).

O mesmo regime se encontra consagrado nas leis francesa (art. 1458.° NCPC), alemã (art. 1032.°/1 ZPO) e brasileira (arts. 267.°/VII e 301.°/IX CPC) (21) e foi desenvolvido pela doutrina e jurisprudência italianas (22). Na lei suíça, a excepção é de conhecimento oficioso, contanto que o requerido não tenha apresentado a sua defesa quanto ao fundo da causa sem fazer uma reserva sobre a incompetência do tribunal estadual (art. 7.°/a da Lei federal de Direito Internacional Privado) (23).

A lei “inglesa” não configura a preterição de tribunal arbitral como uma verdadeira excepção processual: a parte que invoca a convenção de arbitragem apenas pode requerer a suspensão da instância judicial (art. 9.° da Lei de arbitragem de 1996). O mesmo se verifica, nos EUA, face à Lei federal de arbitragem (art. 3.°).

Perante a generalidade dos sistemas consultados, considera-se que a conduta das partes pode dar corpo a uma renúncia tácita às faculdades resultantes da convenção de arbitragem. Assim, entende-se geralmente que a parte que não invoca a convenção de arbitragem perante a propositura de uma acção judicial relativa a litígio abrangido pela convenção de arbitragem renuncia tacitamente às faculdades resultantes da convenção de arbitragem com respeito ao litígio em causa. Caso se trate de um compromisso arbitral opera-se mesmo uma revogação tácita da convenção de arbitragem.

Entre nós, já se defendeu que se a acção for proposta no tribunal estadual depois de ter sido iniciado o processo arbitral o réu tanto pode invocar a excepção de preterição de tribunal arbitral como a excepção de litispendência (24). A excepção de litispendência é, porém, de conhecimento oficioso (art. 495.° CPC).

Também a jurisprudência e a doutrina suíças se mostram favoráveis à invocação da litispendência perante o tribunal judicial e, numa evolução mais recente, mesmo perante o tribunal arbitral, no caso de o tribunal judicial ter sido demandado em primeiro lugar (25).

Noutros sistemas entende-se que não há lugar a litispendência na relação entre processo arbitral e processo judicial (26). É o que se verifica designadamente em Itália (27). Também a orientação dominante na Alemanha postula que neste caso só pode ser invocada a excepção de preterição de tribunal arbitral (28).

Perante o Direito português, a celebração da convenção de arbitragem na pendência de uma acção interposta num tribunal judicial constitui uma causa de extinção da instância (arts. 287.°/b e 290.° CPC). Neste caso, as partes não podem invocar no tribunal arbitral actos praticados no processo judicial, salvo reserva expressa (art. 290.°/3 CPC).

C) Pressupostos e requisitos de validade da convenção de arbitragem em geral

Como já se assinalou, a competência do tribunal arbitral pressupõe uma convenção de arbitragem válida e eficaz. Se a convenção de arbitragem for nula, anulada ou ineficaz o tribunal arbitral é incompetente, o que constitui, perante todos os sistemas consultados, fundamento de anulação da decisão.

A convenção de arbitragem pressupõe o acordo das partes, quer constitua uma cláusula contratual ou um negócio jurídico autónomo.

Relativamente às convenções de arbitragem que constituam cláusulas contratuais gerais, haverá que contar com o controlo das cláusulas contratuais gerais estabelecido por alguns sistemas nacionais, designadamente quanto à sua inclusão no contrato, à sua interpretação e à proibição de certas cláusulas “abusivas”.

Na ordem jurídica portuguesa, o regime das cláusulas contratuais gerais é definido pelo DL n.° 446/85, de 25/10, modificado pelos DLs n.os 220/95, de 31/8 e 249/99, de 7/7) (29).

Este regime proíbe, nas relações com consumidores finais, as cláusulas contratuais gerais que “prevejam modalidades de arbitragem que não assegurem as garantias de procedimento estabelecidas na lei” (art. 21.°/h com a redacção dada pelo DL n.° 220/95). Não é inteiramente claro a que arbitragens o legislador se pretende referir. O anexo previsto no art. 3.°/3 da Directiva Relativa às Cláusulas Abusivas nos Contratos Celebrados com Consumidores 93/13/CEE), que o legislador português visou transpor, refere-se a “uma jurisdição de arbitragem não abrangida por disposições legais”. Parece razoavelmente seguro que não decorre daí qualquer limite à arbitrabilidade em matéria de litígios emergentes de contratos com consumidores. É igualmente certo que do Regulamento comunitário Relativo à Competência Judiciária, ao Reconhecimento e à Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial (Reg. CE n.° 44/2001, de 22/12/2000) não se pode extrair qualquer consequência sobre a eficácia das convenções de arbitragem celebradas com consumidores, uma vez que a arbitragem se encontra genericamente excluída do âmbito de aplicação do Regulamento (art. 1.°/2/d) (30).

O art. 19.°/g do regime das cláusulas contratuais gerais proíbe, consoante o quadro negocial padronizado, as cláusulas contratuais gerais que “Estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem”. RAÚL VENTURA defende a extensão deste preceito às convenções de arbitragem (31). Concordo com esta posição, embora deva sublinhar que só em situações verdadeiramente excepcionais isto se pode verificar.

De entre os requisitos de validade da convenção de arbitragem salientam-se a arbitrabilidade, a forma e o conteúdo da convenção.

A LAV não contém qualquer norma especial sobre a capacidade para celebração da convenção de arbitragem. A capacidade aferir-se-á pelas regras gerais (32). Relativamente às pessoas colectivas de Direito público deve entender-se que o n.° 4 do art. 1.° é uma norma relativa à arbitrabilidade subjectiva e não à capacidade (infra D).

A inobservância dos requisitos de arbitrabilidade e de forma desencadeia a nulidade da convenção (art. 3.° LAV).

A arbitrabilidade será examinada na alínea seguinte.
Quanto à forma, há assinalar uma importante influência harmonizadora exercida pelo art. 2.° da Convenção de Nova Iorque, que justifica um exame das normas aí contidas nesta sede.

Perante a Convenção de Nova Iorque, a convenção tem de ser escrita. Por convenção escrita entende-se “uma cláusula compromissória inserida num contrato, ou num compromisso, assinado pelas Partes ou inserido numa troca de cartas ou telegramas” (art. 2.°/2).

Na falta de assinatura do contrato que contém a cláusula compromissória ou do compromisso, o decisivo é que a convenção de arbitragem conste de uma proposta escrita, que esta proposta seja aceite por escrito e que a aceitação seja comunicada ao proponente (33). A aceitação não tem de se referir especificamente à convenção de arbitragem, bastando a aceitação da proposta contratual no seu conjunto (34).

VAN DEN BERG sugere ainda que se considere satisfeita a exigência de forma escrita quando o destinatário da proposta, embora não a aceite explicitamente, faça uma referência à convenção ou ao contrato que a contém num escrito posterior (35). Indo ao encontro desta sugestão, parece defensável que a aceitação possa ter tácita, desde que o facto concludente observe a forma escrita (36).

Certo é que não basta uma aceitação oral nem uma aceitação tácita que não resulte de um escrito, mesmo que tal aceitação corresponda aos usos do comércio num determinado sector da actividade económica (37).

A convenção não exige que as cartas sejam assinadas, sendo de admitir que a sua autoria possa ser estabelecida com base noutros meios de prova (38). Por analogia, parece suficiente que a proposta e/ou aceitação constem de outros documentos escritos que não são assinados pela própria mão do autor, como telexes e faxes (39) e, até, documentos electrónicos (40). A convenção só mencionou os meios de comunicação que eram conhecidos à época, mas isto não impede que a sua ratio permita abranger os novos meios de comunicação (41).

Nesta ordem de ideias, pode concluir-se que é necessário e suficiente que exista um registo das declarações escritas, seja em suporte de papel ou em suporte magnético (como uma disquete, um disco compacto ou um disco rígido). Assim, deve entender-se que constitui uma convenção escrita, no sentido da Convenção, a que resulta de uma troca de mensagens de correio electrónico ou mesmo de um “clique” num ícone contido num sítio da Internet que exprima a aceitação de uma cláusula geral aí visível.

Embora o ponto seja controverso, deve considerar-se suficiente a existência de uma remissão para um documento que contenha a convenção feita no contrato assinado pelas partes ou na troca de correspondência (42). Necessário, à luz da finalidade do art. 2.°/2, é que o aderente tenha ou deva ter consciência da sua vinculação a uma convenção de arbitragem (43).
Trata-se, portanto, de uma acepção lata de forma escrita.

A convenção que não obedeça a forma escrita é inválida (44). Todavia, deve entender-se que a parte que tenha executado ou invocado a convenção — designadamente através da nomeação de um árbitro, de participação na arbitragem ou do uso da excepção de preterição de tribunal arbitral — não pode invocar o vício de forma, porque tal constituiria um venire contra factum proprium (45).

A Lei-Modelo da CNUDCI, que reconhecidamente inspirou neste particular várias das legislações consultadas, baseou-se no art. 2.°/2 da Convenção de Nova Iorque (46).

São em todo o caso assinaláveis algumas diferenças entre estes textos. A Lei-Modelo introduziu duas novas hipóteses: a de a convenção de arbitragem constar “de outro meio de comunicação que prove a sua existência” ou de troca de articulados em processo arbitral em que a convenção seja alegada por uma parte e não seja contestada pela outra (art. 7.°/2) (47). A primeira hipótese vai ao encontro da interpretação da Convenção de Nova Iorque atrás preconizada. A Convenção de Nova Iorque também não parece impedir que do regime interno de alegação da incompetência do tribunal arbitral possa resultar uma convenção de arbitragem tacitamente formada no processo arbitral.

A Lei-Modelo prevê ainda expressamente que a forma escrita é satisfeita pela remissão de um contrato para um documento que contenha a cláusula compromissória, desde que o contrato obedeça à forma escrita e que a remissão incorpore a cláusula no contrato (art. 7.°/2 in fine). Também neste ponto a Lei-Modelo vai de encontro à melhor interpretação da Convenção de Nova Iorque (48).

Não surpreende, por isso, que apesar das diferenças entre a Lei-Modelo e a Convenção de Nova Iorque, a CNUDCI tenha entendido que as modificações introduzidas no texto da Convenção de Nova Iorque constituem meras concretizações deste texto e que toda a decisão que satisfaça os requisitos do art. 7.° da Lei Modelo (e o mesmo se diga do art. 2.°/2 LAV) poderá ser reconhecida ao abrigo da Convenção (49).

A grande maioria dos sistemas consultados segue a Convenção de Nova Iorque e a Lei-Modelo da CNUDCI, sujeitando a convenção de arbitragem a forma escrita, numa acepção lata.

As leis suíça (art. 178.°/1 da Lei federal de Direito Internacio-nal Privado), portuguesa (art. 2.°/2 LAV), “inglesa” (arts. 5.° e 6.°/2 da Lei de 1996) e alemã (art. 1031.° ZPO) adoptam, com variações de alcance limitado (50), as soluções da Lei-Modelo. De entre estas variações são de salientar a maior permissividade das leis alemã e inglesa, que dispensam em certas circunstâncias quer um acordo escrito quer uma troca de declarações escritas. Os tribunais dos EUA também têm entendido, perante a Lei federal de arbitragem (art. 2.°), que é suficiente a aceitação oral ou tácita de uma proposta escrita (51).

A lei alemã admite que a exigência de forma escrita seja preenchida quando a convenção de arbitragem conste de um documento transmitido por uma das partes à outra parte, ou por terceiro a ambas as partes, e, na falta de uma oposição tempestiva, seja considerada segundo os usos do comércio como elemento do contrato (art. 1031.°/2 ZPO) (52). Regista-se aqui uma óbvia aproximação ao regime de validade formal dos pactos de jurisdição consagrado no art. 17.° da Convenção de Bruxelas sobre Competência Judiciária e Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial e, mais recentemente, no art. 23.° do Regulamento comunitário Relativo à Competência Judiciária, ao Reconhecimento e à Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial (53).

Indo mais longe, a Lei “inglesa” considera escrita a convenção de arbitragem celebrada oralmente por referência a cláusulas escritas ou registada por uma das partes ou por terceiro com o acordo das partes da convenção (art. 5.°/3 e 4). Além disso, a lei não prejudica a eficácia da convenção de arbitragem oral segundo a Common Law (art. 81.°/1/b), ficando a arbitragem subtraída à Lei de arbitragem (54).

Já o Código de Processo Civil italiano se limita a exigir a “forma escrita”, precisando que esta exigência de forma é satisfeita por telegramas ou telexes (art. 807.°). Também a Lei brasileira de arbitragem determina apenas que a cláusula compromissória seja “estipulada por escrito”, esclarecendo que a cláusula pode estar “inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ela se refira” (art. 4.° § 1.°) (55).

Os Direitos italianos e brasileiro, porém, divergem marcadamente das restantes legislações consultadas ao formular especiais exigências com respeito à cláusula compromissória que conste de contrato de adesão, bem como, no que toca ao Direito brasileiro, relativamente ao compromisso arbitral (56).

Assim, o art. 1341.°/2 CC it. exige aprovação específica por escrito da cláusula compromissória que constitua uma cláusula contratual geral. No entanto, esta exigência suscita divergências de interpretação (57) e não é aplicável na arbitragem internacional (art. 833.°/1 CPC).

Perante a Lei brasileira, a cláusula só poderá ser invocada contra ao aderente se este tiver concordado expressamente com a instituição da arbitragem “por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula” (art. 4.° § 2.°). Também a interpretação deste preceito suscita algumas dúvidas na doutrina. Parece que deve ser entendido no sentido da vinculação do aderente que tenha manifestado o seu consentimento através de assinatura ou visto especial junto à cláusula escrita em documento anexo ou em negrito (58).

Por seu turno, o compromisso arbitral (extrajudicial) deve ser celebrado ou por escrito particular assinado por duas testemunhas ou por instrumento público (art. 9 § 2.°) e deve conter certas menções obrigatórias, entre as quais se contam a identificação dos árbitros ou da entidade nomeadora e o lugar em que será proferida a sentença arbitral (art. 10.°).

A lei portuguesa considera “reduzida a escrito a convenção de arbitragem constante de documento assinado pelas partes, ou de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de telecomunicação de que fique prova escrita, quer esses instrumentos contenham directamente a convenção, quer deles conste cláusula de remissão para algum documento em que uma convenção esteja contida” (art. 2.°/2 LAV).

Com esta formulação quis-se atender aos “modernos meios de comunicação, sem sacrifício da necessária segurança” (59).

As diferenças entre a lei portuguesa e a Lei-Modelo são mínimas. Por um lado, a lei portuguesa não contempla a hipótese de troca de articulados em processo arbitral em que a convenção seja alegada por uma parte e não seja contestada pela outra. Por outro lado, exige “que fique prova escrita” do meio de telecomunicação enquanto a Lei-Modelo exige que o meio de comunicação prove a existência da convenção de arbitragem. Estas diferenças são, no fundamental, aparentes.

Por um lado, à face da lei portuguesa a parte que não tenha contestado a convenção de arbitragem vê precludida a possibilidade de pedir a anulação da decisão arbitral com fundamento em incompetência do tribunal (art. 27.°/2 LAV).

Por outro lado, a Lei-Modelo também deve ser interpretada no sentido de exigir “prova escrita”, apresentando-se mais clara e conforme à intenção subjacente a versão inglesa que se refere a “means of telecommunication which provide a record of the agreement” (60).

No caso de remissão de um contrato ou declaração escrita para uma convenção contida noutro documento deve entender-se, em consonância com a Lei-Modelo, que esta remissão deve ter um sentido incorporador da convenção no contrato (61).

Em resultado, há em princípio coincidência entre as exigências de forma feitas pela Convenção de Nova Iorque, pela Lei-Modelo e pela lei portuguesa, bem como, mais limitadamente, pelas leis suíça e alemã.

A convenção de arbitragem que não seja reduzida a escrito é nula (art. 3.° LAV).
As leis suíça (art. 178.°/1 da Lei federal de Direito Internacio-nal Privado) e alemã (art. 1031.°/1 ZPO) exigem que os meios de comunicação utilizados “permitam” ou “garantam” a prova do acordo. Não é necessário que o documento seja assinado pelo autor. Por isso, perante estas leis, não se trata, em rigor, de “forma escrita”, mas de “forma de texto” (62). Isto permite abranger telegramas, telexes e mesmo documentos electrónicos. Assim, designadamente, a convenção de arbitragem pode resultar de uma troca de mensagens de correio electrónico (63).

Entendimento convergente é seguido pela doutrina italiana perante o art. 807.° CPC it. (64).
Também à face das regras gerais da lei portuguesa, os documentos electrónicos não satisfazem o requisito legal de forma escrita, uma vez que não são assinados pela própria mão do seu autor (cf. arts. 364.°/1 e 373.°/1 CC) (65).

O registo do texto da mensagem no computador do destinatário constitui “prova escrita”? A possibilidade de manipulação do conteúdo dos documentos electrónicos pode comprometer a segurança jurídica. Com efeito, por exemplo, o texto ou a origem de uma mensagem de correio electrónico podem ser alterados pelo destinatário.

O art. 3.°/1 do DL n.° 290-D/99, de 2/8, estabelece que o “documento electrónico satisfaz o requisito legal de forma escrita quando o seu conteúdo seja susceptível de representação como declaração escrita”. Relativamente à força probatória, o n.° 2 estabelece que quando “lhe seja aposta uma assinatura digital certificada por uma entidade credenciada e com os requisitos previstos neste diploma, o documento electrónico com o conteúdo referido no número anterior tem a força probatória do documento particular assinado”. O n.° 5 do mesmo artigo determina que o “valor probatório dos documentos electrónicos aos quais não seja aposta uma assinatura digital certificada por uma entidade credenciada e com os requisitos previstos neste diploma é apreciado nos termos gerais de direito.”

Também o art. 26.° do DL n.° 7/2004, de 7/1, que visou transpor para a ordem jurídica portuguesa a Directiva sobre o comércio electrónico, determina que as “declarações emitidas por via electrónica satisfazem a forma escrita quando contidas em suporte que ofereça as mesmas garantias de fidedignidade, inteligibilidade e conservação” (n.° 1) e que o “documento electrónico vale como documento assinado quando satisfizer os requisitos da legislação sobre assinatura electrónica e certificação” (n.° 2).

Os documentos particulares não provam, por si sós, a sua autoria; em caso de impugnação é ao apresentante do documento que incumbe provar a autoria contestada (art. 374.°/2 CC). Por maioria de razão, os documentos electrónicos sem assinatura digital certificada não provam a autoria nem a integridade do documento. A força probatória destes documentos é apreciada livremente pelo tribunal (art. 366.° CC).

Por isso, nos casos em que não se considerem admitidos por acordo os factos não impugnados (66), o órgão de aplicação do Direito pode exigir que a autoria e integridade do documento sejam provadas através de outros meios independentemente de impugnação pela parte contra quem o documento é apresentado.

Geralmente a prova da autoria e integridade destes documentos só será possível se houver um registo da proveniência e conteúdo do documento electrónico na posse de terceiro idóneo, por exemplo, da empresa que fornece acesso à Internet ou em que está armazenado um sítio.

Em todo o caso, parece que ao exigir “prova escrita” o art. 2.°/2 da LAV se satisfaz — em consonância com a Lei-Modelo, com o art. 3.°/1 do DL n.° 290-D/99 e com o art. 26.°/1 do DL n.° 7/2004 — com a existência de documento ou documentos contendo um texto escrito. É suficiente que cada uma das partes tenha declarado por escrito o seu consentimento na arbitragem (67).

Para haver um documento contendo um texto escrito não é necessário que o texto conste de um suporte em papel (68). Parece suficiente que o texto escrito se encontre registado num suporte magnético, como uma disquete, um disco compacto ou um disco rígido.

Daí que, à semelhança do assinalado perante a Convenção de Nova Iorque, se considere reduzida a escrito a convenção de arbitragem que resulte de uma troca de mensagens de correio electrónico ou mesmo de um “clique” num ícone contido num sítio da Internet que exprima a aceitação de uma cláusula geral aí visível.

A solução desenvolvida pela jurisprudência e doutrina francesas afasta-se da tendência manifestada nos sistemas anteriormente considerados. A lei francesa sujeita a convenção de arbitragem a forma escrita em matéria de arbitragem interna (arts. 1443.° e 1449.° NCPC), mas não formula qualquer exigência de forma no título dedicado à arbitragem internacional (69). Após algumas hesitações, a jurisprudência, com a aprovação da doutrina mais autorizada, orientou-se no sentido da consensualidade da convenção de arbitragem (70).

Perante a lei portuguesa, a nulidade da convenção de arbitragem não pode ser invocada como fundamento de anulação da decisão arbitral se não foi alegada oportunamente no decurso da arbitragem (art. 27.°/2 LAV). Deve entender-se que neste caso a nulidade também não pode ser invocada para qualquer outro efeito, designadamente perante os tribunais estaduais.

No que toca ao conteúdo, a convenção de arbitragem deve ser suficientemente determinada.
A lei portuguesa exige que o compromisso arbitral determine com precisão o objecto do litígio (art. 2.°/3). O objecto do litígio é formado pelo pedido e pela causa de pedir (71). Para “determinar com precisão o objecto do litígio” basta enunciar genericamente o pedido e individualizar a causa de pedir (72).

No caso de a convenção de arbitragem ser uma cláusula compromissória que abrange os litígios emergentes de determinada relação jurídica, o objecto do litígio deve considerar-se determinado pelo demandante na notificação inicial (73), sem prejuízo da possibilidade de ampliação do objecto do litígio pela contraparte na notificação de resposta (art. 11.°/3) (74).

A versão original da LAV mantinha a solução tradicional, estabelecendo que se as partes não chegarem a acordo sobre a determinação do objecto do litígio no prazo estabelecido para a nomeação dos árbitros a decisão cabe ao tribunal da relação do lugar fixado para a arbitragem ou, na falta de tal fixação, do domicílio do requerente (art. 12.°/4). O processo a seguir encontrava-se estabelecido nos arts. 1508.° e segs. CPC (75).

Este regime suscitava dificuldades de interpretação e prestava-se a manobras dilatórias da parte requerida (76). O novo regime elimina estas dificuldades e dispensa o recurso ao tribunal judicial para a determinação do objecto do litígio, cabendo ao tribunal arbitral decidir eventuais divergências que possam surgir entre as partes a este respeito.

Já vimos também que a Convenção de Nova Iorque (art. 2.°/1), a Lei-Modelo da CNUDCI (art. 7.°/1) e a maior parte das legislações nacionais exigem que os litígios futuros visados pela convenção de arbitragem sejam emergentes de uma relação jurídica determinada (supra A).

Mas qual a consequência da falta de determinação da convenção de arbitragem? O art. 3.° LAV não a inclui entre as causas de nulidade da convenção de arbitragem.

Se o demandado não alegar oportunamente a incompetência do tribunal a decisão não pode ser anulada (art. 27.°/2 LAV).

Se o demandado alegar a incompetência do tribunal arbitral, o tribunal deve considerar-se incompetente, uma vez que o litígio não é abrangido por uma cláusula compromissória suficientemente determinada. Isto decorre do próprio fundamento contratual da arbitragem. Se o tribunal arbitral se considerar competente, decorre do fundamento contratual da arbitragem que a decisão arbitral é inválida.

Esta solução está em consonância com a Convenção de Nova Iorque que só obriga ao reconhecimento das convenções de arbitragem em que, pelo menos, seja determinada a relação jurídica de que os litígios emergem (art. 2.°/3) (77). Acresce que, segundo a interpretação dominante, que atende à intenção do legislador internacional e que tem um mínimo de correspondência no texto da convenção, a falta de determinação da convenção de arbitragem (exigida pelo art. 2.°) constitui um fundamento de não reconhecimento da decisão arbitral estrangeira nos termos do art. 5.°/1/a (78).

Daí que a falta de determinação da convenção de arbitragem possa ser invocada pelo demandado que a alegou oportunamente para pedir a anulação a decisão nos termos do art. 27.°/1/b LAV.

Parece também claro que a excepção de preterição de tribunal arbitral não pode ser invocada quando a convenção de arbitragem manifestamente não satisfizer os requisitos do art. 1.°/2 LAV.

Em suma, a convenção de arbitragem insuficientemente determinada não produz quaisquer efeitos, constituindo uma causa de invalidade que só formalmente se distingue das causas de nulidade estabelecidas no art. 3.° LAV.

D) Arbitrabilidade da controvérsia

A controvérsia é arbitrável quando pode ser submetida a arbitragem voluntária.
Quando se fala em arbitrabilidade tem-se geralmente em vista a natureza do objecto do litígio. Trata-se, então, de uma arbitrabilidade objectiva.

Mas a arbitrabilidade também pode dizer respeito à qualidade das partes. O problema tem-se levantado relativamente às controvérsias em que são partes Estados ou entes públicos autónomos. Frequentemente encara-se este problema como uma questão de capacidade. Todavia, como justamente observam FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN, as limitações colocadas à celebração de convenções de arbitragem por Estados e entes públicos autónomos não visam a sua protecção pessoal mas outras considerações de interesse geral (79). Em particular, não se vê como é que a plenitude de poderes do Estado se poderia conciliar com esta espécie de capitis deminutio. Deve antes entender-se que se trata de uma arbitrabilidade subjectiva (80).

Principie-se pela arbitrabilidade objectiva.
Os dois critérios mais seguidos nesta matéria são o da disponibilidade do direito em causa e o da natureza patrimonial da pretensão (81).

O critério da disponibilidade do direito em causa é seguido pela lei suíça (art. 5.° Concordat sur l’arbitrage) com respeito à arbitragem interna, e, em geral, pelas leis portuguesa (art. 1.°/1 LAV) e italiana (art. 806.° CPC). A Lei brasileira de arbitragem também consagra este critério (art. 1.°), mas o novo Código Civil de 2002 veio admitir o “compromisso” para a generalidade das questões de “caráter estritamente patrimonial” (art. 852.°), não sendo claro o modo de articular os dois preceitos.

A lei francesa combina o critério da disponibilidade com o da ordem pública, segundo a qual não são arbitráveis “as matérias que interessam a ordem pública” (arts. 2059.° e seg. CC) (82). A jurisprudência evoluiu no sentida flexibilização deste critério, por forma que actualmente, mesmo na arbitragem interna, a reserva de ordem pública só constitui um limite excepcional à arbitrabilidade (83). Como adiante se assinalará, a flexibilização ainda é mais acentuada na arbitragem internacional.

Segundo a lei portuguesa é arbitrável todo o litígio que não esteja submetido por lei especial exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária e que não respeite a direitos indisponíveis (art. 1.°/1 LAV).

Perante a lei portuguesa, à semelhança do que se verifica face aos outros sistemas consultados, a arbitrabilidade não se limita a matéria civil e comercial. A supressão da referência a “matéria cível ou comercial” feita no art. 1.° da Proposta de lei n.° 34/IV torna claro que são, em princípio, arbitráveis litígios noutras matérias disponíveis, designadamente no âmbito de outros Direitos privados especiais e do próprio Direito público (dentro dos limites que adiante serão referidos com respeito à arbitrabilidade subjectiva).

São indisponíveis os direitos que as partes não podem constituir ou extinguir por acto de vontade e os que são irrenunciáveis (84). Por exemplo, os direitos familiares pessoais, os direitos de personalidade e o direito de alimentos são indisponíveis.

Em regra, os direitos patrimoniais são disponíveis e os direitos pessoais são indisponíveis. Mas há excepções, razão por que o critério da disponibilidade do direito não se identifica com o critério da natureza patrimonial da pretensão.

O critério da disponibilidade do Direito é justificado, porquanto é nas relações que dependem da vontade das partes, e só nestas, que se deve admitir o exercício de uma actividade jurisdicional por particulares (85). A sujeição a arbitragem de relações indisponíveis permitiria facilmente às partes tornear a indisponibilidade legal através da designação de árbitros que actuassem de acordo com a sua vontade.

O critério da natureza patrimonial da pretensão encontra-se consagrado na lei alemã (art. 1030.°/1 ZPO) e, relativamente à arbitragem internacional, na lei suíça (n.° 1 do art. 177.° da Lei federal de Direito Internacional Privado). A lei alemã, porém, combina este critério com o da disponibilidade do direito em causa ao admitir a arbitrabilidade de pretensões não patrimoniais quando as partes possam celebrar uma transacção sobre o objecto do litígio.

Como foi assinalado, o Direito francês parte de uma concepção mais restritiva, mas a jurisprudência flexibilizou esta concepção, especialmente em matéria internacional, evoluindo no sentido de admitir, em princípio, a arbitrabilidade das causas de natureza patrimonial, desde que não haja violação da ordem pública internacional francesa (86).

Entende-se que a pretensão tem natureza patrimonial quando é susceptível de ser objecto de uma avaliação pecuniária (87).

Isto inclui, à face da Lei suíça, os litígios relativos a direitos de propriedade intelectual, da concorrência e da falência, bem como o essencial dos litígios relativos ao Direito das Sociedades.

Os Direitos inglês e estadounidense não desenvolveram um critério geral de arbitrabilidade.
No Direito inglês, a arbitrabilidade é regulada essencialmente pelo Common Law (cf. art. 81.°/1/a da Lei de Arbitragem de 1996), que não estabelece limites claros a este respeito. A doutrina sugere que não são arbitráveis questões extra-jurídicas ou relativas a deveres que o Estado, actuando no interesse público, tutela através dos seus próprios mecanismos (88). É controverso até que ponto as questões suscitadas por contratos nulos devido a ilegalidade ou imoralidade são arbitráveis (89). As matérias jurídico-familiares não se encontram genericamente excluídas.

Nos EUA, a arbitrabilidade é regulada pelo Direito federal quando a Lei federal de arbitragem for aplicável, o que se verifica em matéria interestadual e internacional. Sucede, porém, que esta lei não regula a arbitrabilidade; as soluções desenvolvidas pela jurisprudência também não permitem estabelecer quaisquer limites precisos à arbitrabilidade (90). Atendendo à finalidade de favorecer a arbitragem que subjaz à Lei federal de arbitragem, presume-se a arbitrabilidade, colocando a cargo da parte que se opõe à arbitragem o ónus de demonstrar que a finalidade de outra lei federal justifica a exclusão da arbitrabilidade no caso concreto (91). Os tribunais têm entendido que são arbitráveis não só os litígios “contratuais”, mas também os relativos a pretensões “extracontratuais” [statutory], tais como as pretensões indemnizatórias fundadas em violação da legislação sobre concorrência ou de normas protectoras dos investidores em valores mobiliários (92).

Existem alguns domínios em que a arbitrabilidade é controversa ou suscita dúvidas.
Assim, entende-se que são em princípio arbitráveis os litígios de Direito das Sociedades entre a sociedade e os sócios ou entre os sócios (93). No entanto, relativamente à anulação de deliberações sociais, RAÚL VENTURA, seguindo a jurisprudência da Cassação italiana, sugere que não serão arbitráveis as controvérsias relativas à impugnação de deliberações da assembleia que respeitem a direitos de terceiros ou ao interesse geral da sociedade no regular desenvolvimento das actividades sociais em conformidade com a lei ou com os estatutos (94).

No que toca à responsabilidade dos gerentes, administradores ou directores perante a sociedade, parece que os requisitos estabelecidos para a disponibilidade do direito de indemnização (designadamente para a renúncia ou transacção) devem constituir também requisitos da arbitrabilidade (95).

Registam-se importantes divergências entre os sistemas nacionais relativamente à arbitrabilidade dos litígios laborais (96).

Entre nós, a concepção tradicional nega a arbitrabilidade dos litígios que dizem respeito a relações individuais de trabalho (97). Também os tribunais franceses têm entendido que a cláusula compromissória inserida num contrato de trabalho não é oponível ao trabalhador que recorra à jurisdição estadual (98).

No entanto, duas decisões relativamente recentes das Relações portuguesas admitiram a validade de cláusulas de arbitragem contidas em contratos de trabalho desportivo, por entenderem que os créditos laborais passam a ser disponíveis após a cessação do contrato de trabalho (99).

Em minha opinião a disponibilidade deve verificar-se no momento da celebração da convenção de arbitragem e, por isso, só serão válidas as convenções de arbitragem celebradas depois da cessação do contrato de trabalho (100).

O Código do Trabalho estabelece expressamente a arbitrabilidade das questões laborais relativas a convenções colectivas de trabalho, nomeadamente as que resultem da sua interpretação, integração, celebração ou revisão (arts. 564.°), e os conflitos colectivos de trabalho (art. 590.°) (101).

Apesar de existirem alguns limites à arbitrabilidade das controvérsias relativas à propriedade intelectual, a tendência de evolução, perante a maioria dos sistemas, é favorável a uma ampla arbitrabilidade destas controvérsias (102). Uma atitude marcadamente restritiva, porém, subsiste ainda em França e na Itália (103).

O Direito português acompanhou esta tendência de evolução.
Os direitos morais de autor — que têm por objecto a paternidade, genuinidade e integridade da obra — não são arbitráveis visto que são inalienáveis e irrenunciáveis (art. 56. ° C. Dir. Aut.). Já resulta expressamente do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos que os litígios que não incidam sobre direitos indisponíveis são arbitráveis (art. 217.°). É o caso dos litígios relativos a contratos de licença.

Na vigência do anterior Código da Propriedade Industrial, alguns autores defenderam limites à arbitrabilidade das controvérsias relativas à propriedade industrial: as questões relativas à titularidade ou validade de um direito de propriedade industrial não seriam arbitráveis, porque o registo tem carácter constitutivo e tem efeitos erga omnes; afirmou-se ainda que qualquer decisão que implique a alteração do registo tem de ser proferida pelo tribunal estadual (104). Já se admitia que os árbitros decidam a questão da violação de um direito de propriedade industrial que se suscite como questão prejudicial (105).

O novo Código da Propriedade Industrial admite a sujeição a arbitragem de todas as questões susceptíveis de recurso judicial (art. 48.°/1), o que abrange as decisões do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que concedam ou recusem direitos de propriedade industrial ou relativas a transmissões, licenças, declarações de caducidade ou a quaisquer outros actos que afectem, modifiquem ou extingam direitos de propriedade industrial (art. 39.°). Coloca-se, porém, um limite: se existirem contra-interessados estas questões só são arbitráveis se estes aceitarem o compromisso arbitral (art. 48.°/2) (106).

Segundo uma opinião (107), as questões falimentares não seriam arbitráveis. Esta opinião não pode ser seguida. Por certo que, tratando-se de procedimentos colectivos, haverá limites à arbitrabilidade que são inerentes ao âmbito pessoal de vinculação da convenção de arbitragem. Mas nada obsta, em tese geral, à arbitrabilidade de muitas questões falimentares, designadamente as relativas à verificação dos créditos reclamados por credores ou à separação de bens da massa falida (108). O art. 144.° C. Rec. Emp./Falência admitia expressamente que o liquidatário judicial fosse autorizado pelo juiz a celebrar convenções de arbitragem (109). O novo C. Insolv./Rec. Emp. é omisso a este respeito.

Os litígios relativos ao arrendamento urbano são, em princípio, arbitráveis. Existem, no entanto, formas de cessação do contrato que só podem ser operadas por via judicial (resolução e denúncia pelo senhorio nos termos dos arts. 55.°, 63.°/2 e 70.° RAU), o que exclui o recurso à arbitragem (110). Também é duvidoso que nos casos referidos no art. 55.°/2 RAU (designadamente a acção de despejo fundada em caducidade do arrendamento) seja admissível o recurso à arbitragem (111).

Em minha opinião a arbitrabilidade só é de excluir com fundamento em indisponibilidade do direito, em disposição legal que exclua a arbitrabilidade ou em incompatibilidade da arbitragem com o regime legal do direito (112).

Seguindo a opinião dominante, entendo que a existência de uma competência internacional exclusiva em certa matéria não exclui, por si, a sua arbitrabilidade (113). Assim, o art. 1.°/1 LAV, quando exige que o litígio não esteja submetido exclusivamente por lei especial a tribunal judicial, não se refere à competência internacional exclusiva, mas à lei especial que exclua a arbitragem voluntária em determinada matéria (114).

As matérias disponíveis abrangidas por competências legais exclusivas são, em princípio, arbitráveis.
Com efeito, o fundamento das competências legais exclusivas não coincide com o critério da indisponibilidade. As competências legais exclusivas estabelecidas pela lei portuguesa visam principalmente a salvaguarda da aplicação de certos regimes imperativos contidos no Direito material português perante o risco de um pacto privativo da competência dos tribunais portugueses ou de ser pedido o reconhecimento de uma decisão estrangeira que não aplicou esse Direito. O critério da indisponibilidade, porém, permite a arbitrabilidade em matérias que são regidas por esses regimes imperativos, desde que os direitos em causa não estejam subtraídos à vontade das partes.

Pode sem dúvida ser questionada, de iure condendo, a inadmissibilidade de pactos privativos de jurisdição em matérias disponíveis. De iure constituto, porém, importa reconhecer que são claramente diferentes os critérios aplicáveis à admissibilidade de pactos de jurisdição e à arbitrabilidade.

Em princípio, os árbitros têm competência para decidir as questões prévias relativas a situações não arbitráveis suscitadas pelo julgamento de situações arbitráveis (115). Constitui excepção a Lei brasileira de arbitragem, que manda suspender o procedimento arbitral até que o tribunal judicial decida a questão prévia (art. 25.°).

Uma outra questão que se relaciona com a arbitrabilidade objectiva é a possibilidade de confiar a árbitros a integração e adaptação de contratos. Esta questão coloca-se com particular acuidade nos contratos de “longa duração”.

Nos contratos de execução duradoura assumem frequentemente importância as cláusulas relativas à adaptação do contrato por alteração de circunstâncias externas (cláusulas de hardship) e à renegociação do contrato com vista à sua renovação no fim do período inicialmente definido (116).

O conteúdo destas cláusulas é muito variável quanto ao estabelecimento de procedimentos que requeiram a intervenção de terceiros. O significado jurídico desta intervenção de terceiros também é variável. Nuns casos o terceiro deverá actuar como um mero conciliador a que incumbirá promover o acordo das partes. Noutros casos o terceiro terá um poder decisório cujo exercício vincula as partes. Nesta segunda hipótese, importa ainda distinguir conforme este poder é exercido por conta das partes, valendo a decisão tomada como negócio jurídico obrigacional celebrado pelas partes ou constitui uma competência decisória de carácter jurisdicional. Só neste último caso é que estamos perante uma convenção de arbitragem.

Como já se assinalou, a determinação do significado da intervenção de terceiro constitui uma questão de interpretação da cláusula que a determina.

Para além disso, é frequente que surjam tanto mais problemas de integração e complemento dos contratos de execução duradoura quanto mais complexa for a operação subjacente e mais prolongada for a duração do contrato (117). De certo tipo de contratos, designadamente os contratos-base de empreendimento comum, constam usualmente cláusulas sobre a negociação e celebração de acordos complementares e, assiduamente, cláusulas relativas aos procedimentos de superação de impasses deliberativos [dead-lock] (118). No caso das empresas comuns de cooperação interempresarial, também tem sido recomendada a inclusão de cláusulas sobre os critérios e os procedimentos a seguir no processo de liquidação do património comum e a sujeição a arbitragem das controvérsias que lhe digam respeito (119).

A realização de arbitragens com respeito a estas questões tem sido discutida perante diversos sistemas nacionais, em especial o recurso à arbitragem como “modo de adaptação do contrato” e a competência dos árbitros na resolução dos diferendos relativos a obrigações de renegociar o contrato ou de celebrar acordos complementares (120).

A tendência de evolução verificada nos principais sistemas nacionais é favorável à arbitrabilidade das questões relativas à integração e à adaptação dos contratos de “longa duração” (121). É o que ocorre, pelo menos em presença de uma cláusula de integração ou adaptação, perante os sistemas português (art. 1.°/3 LAV) (122), alemão (123), francês (124), holandês (art. 1020.°/4 CPC), suíço (125), inglês (art. 48.°/1 da Lei de arbitragem de 1996) (126), estadounidense (127) e brasileiro (128).

À face do Direito português são arbitráveis não só as questões de natureza contenciosa em sentido estrito, mas também quaisquer questões jurídicas reais (129), designadamente as relacionadas com a necessidade de precisar, completar, actualizar ou mesmo rever os contratos ou as relações jurídicas que estão na origem da convenção de arbitragem (art. 1.°/3 LAV).

Passemos agora à arbitrabilidade subjectiva.
A tendência dominante nos principais sistemas jurídicos vai no sentido de admitir a arbitrabilidade de litígios em que são partes Estados ou outras pessoas colectivas de Direito público (130). Nalguns destes sistemas vigora um regime material especial favorável à arbitrabilidade de litígios com sujeitos públicos em matéria internacional (131).

Perante a lei suíça, admite-se que os litígios de direito público são em princípio arbitráveis, contanto que se trate de direitos disponíveis (na arbitragem interna) ou de causas de natureza patrimonial (na arbitragem internacional — art. 177.°/1 da Lei federal de Direito Internacional Privado) (132).

Na Alemanha, tende a admitir-se que os litígios jurídico-administrativos sobre pretensões patrimoniais são arbitráveis (133).

Na ordem jurídica italiana é geralmente aceite a arbitrabilidade dos litígios relativos à actividade administrativa de Direito privado, mas tem sido largamente controvertida a arbitrabilidade de litígios abrangidos pela competência exclusiva dos tribunais administrativos (134). A Lei n.° 205, de 21/7/2000, resolveu em parte esta controvérsia, ao estabelecer a arbitrabilidade das controvérsias relativas a direitos subjectivos que são da competência exclusiva dos tribunais administrativos (art. 6.°/2). Assim, designadamente, são arbitráveis os litígios emergentes de contratos administrativos, tais como empreitadas, fornecimentos e serviços públicos.

Também perante o Direito brasileiro o ponto é controverso (135). A doutrina dominante entende que são arbitráveis os litígios entre o Estado ou as empresas públicas e os particulares (136), pelo menos quando o litígio resulta de uma actuação iure gestionis e quando a lei permite a arbitragem de litígios públicos (o que se verifica designadamente com os empréstimos internacionais e com as concessões de serviço público) (137).

Já se assinalou que perante o Direito inglês não se encontra consagrado um critério geral de delimitação das matérias arbitráveis. Admite-se, em princípio, a celebração de convenções de arbitragem pela Coroa e pelos entes públicos autónomos (art. 106.° da Lei de arbitragem) (138). Alguns autores admitem limites específicos em certas matérias de Direito público (139).

Também o Direito português admite amplamente que o Estado e outras pessoas colectivas de Direito público celebrem convenções de arbitragem.

Isto já resulta, quanto a litígios respeitantes a relações de Direito privado, do art. 1.°/4 LAV. O mesmo preceito remete para lei especial a autorização para celebração de convenções de arbitragem com respeito a litígios de Direito público. O Código de Processo dos Tribunais Administrativos admite que sejam submetidos a arbitragem os litígios relativos a contratos administrativos, responsabilidade civil extracontratual por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública e actos administrativos que possam ser revogados sem fundamento na sua invalidade, nos termos da lei substantiva (art. 180.°/1) (140).

Existe aliás uma Resolução do Conselho de Ministros (n.° 175/2001) que determina e recomenda a resolução de litígios por meios alternativos, como a mediação e a arbitragem, nas relações entre o Estado, ou entes públicos autónomos, e os particulares (141). O Código de Processo dos Tribunais Administrativos veio atribuir ao interessado que pretenda recorrer à arbitragem a faculdade de exigir a celebração de compromisso arbitral (art. 182.°) (142).

A arbitragem destes litígios públicos está submetida à LAV, sem prejuízo das adaptações que haja que introduzir neste regime no que se refere a arbitragens relativas ao contencioso administrativo (art. 181.°/1 do Código de Processo dos Tribunais Administrativos) (143).

Os Direitos francês e dos EUA divergem até certo ponto da tendência dominante, ao assumirem uma atitude algo restritiva quanto à arbitrabilidade de litígios com pessoas colectivas públicas.

Nos contratos internos, a ordem jurídica francesa proíbe o recurso a arbitragem por pessoas colectivas públicas, salvo lei especial (art. 2060.° CC).

Em matéria internacional, porém, a jurisprudência francesa veio admitir que os árbitros podem decidir litígios que põem em causa disposições de ordem pública e desenvolveu progressivamente uma regra segundo a qual, na arbitragem comercial internacional, são susceptíveis de arbitragem litígios em que sejam partes pessoas colectivas públicas francesas (144). Como veremos, esta regra material especial foi estendida às pessoas colectivas públicas estrangeiras (infra II C).

Nos EUA, é correntemente afirmado que, apesar de algumas oscilações jurisprudenciais, se tem verificado uma tendência de desenvolvimento no sentido do abandono das restrições que anteriormente eram colocadas à arbitrabilidade em certas matérias ditas “públicas”. Na verdade, porém, esta evolução diz principalmente respeito a matérias que são nos sistemas romanogermânicos consideradas como jurídico-privadas, embora submetidas a regimes legais predominantemente imperativos, tais como as questões de responsabilidade civil por violação do Direito da Concorrência.

A evolução é menos visível no que toca à arbitrabilidade subjectiva. Com efeito, entende-se que o Estado federal não é, em princípio, vinculado por uma convenção de arbitragem e as leis de alguns Estados federados também excluem a “capacidade” destes Estados e dos respectivos entes públicos autónomos para celebrarem convenções de arbitragem (145). Segundo a opinião de um autor, o Estado e entes públicos autónomos só são vinculados por uma convenção de arbitragem quando actuam na qualidade de sujeitos privados [in a commercial capacity], i.e., quando celebram um negócio jurídico que também poderia ser celebrado por um particular (146).

E) Autonomia da cláusula compromissória

Quando a convenção de arbitragem constitui cláusula de um contrato principal coloca-se a questão de saber se a validade e eficácia da cláusula depende da validade e eficácia do contrato em que se integra.

Esta questão tem muita importância prática uma vez que a competência do tribunal arbitral depende da validade da convenção de arbitragem. Se a validade da cláusula compromissória dependesse da validade do contrato, bastaria que uma das partes invocasse a invalidade do contrato para justificar a intervenção do tribunal estadual. Neste caso, o tribunal arbitral só seria competente se o tribunal estadual concluísse pela validade do contrato.

A fim de evitar este bloqueamento do processo arbitral os principais sistemas jurídicos consagraram a regra da autonomia da convenção de arbitragem (147).

Em França, trata-se de uma regra material do Direito francês da arbitragem internacional desenvolvida pela jurisprudência (148). As oscilações desta jurisprudência suscitam dúvidas sobre os limites da autonomia da cláusula compromissória (149).

A autonomia da cláusula compromissória também se encontra acolhida no art. 5.°/3 da Convenção de Genebra de 1961 (150), no art. 16.°/1 da Lei-Modelo da CNUDCI, no art. 5.° do Acordo sobre Arbitragem Comercial Internacional do Mercosul (1998) e nas leis suíça (art. 178.°/3 da Lei federal de Direito Internacional Privado), alemã (art. 1040.°/1 ZPO), brasileira (art. 8.° da Lei de arbitragem), “inglesa” (art. 7.° da lei de 1996, ressalvando a convenção das partes em contrário) e italiana (art. 808.°/3 CPC it.). Nos EUA, esta regra foi consagrada pela jurisprudência federal, após o leading case Prima Paint, de 1967 (151).

Esta regra significa que a validade e eficácia da cláusula compromissória deve ser apreciada separadamente da validade e eficácia do contrato em que está inserida. Daí decorre que o tribunal arbitral tem competência para apreciar a validade e eficácia da cláusula compromissória mesmo que se discuta a validade e eficácia do contrato, e que, caso considere a cláusula válida e o contrato inválido, tem competência para decidir sobre as consequências da invalidade do contrato.

Por outras palavras, a cláusula compromissória é tratada, para o efeito de fundamentar a competência do tribunal arbitral, como um negócio jurídico autónomo (152). Por isso, a regra da autonomia da cláusula compromissória está intimamente relacionada com a competência do tribunal arbitral para decidir sobre a sua própria competência.

Esta autonomia não resulta da própria natureza da cláusula compromissória, mas de normas que a estabelecem com vista à realização de uma determinada função (153). Por conseguinte, nada impede que para outros efeitos a cláusula compromissória seja entendida como um elemento acessório do contrato (154).

Nem se pode excluir que a validade da cláusula compromissória seja especificamente atingida pelo mesmo vício que causa a invalidade do contrato, caso em que será igualmente inválida (155). Por exemplo, a invalidade do conjunto do contrato pode decorrer de vício da vontade de um contraente ou da falta de poderes de representação da pessoa que celebrou o contrato em nome doutrem. Da autonomia da cláusula compromissória decorre apenas, como expressa claramente o art. 16.°/1 da Lei-Modelo, que a invalidade do contrato não implica automaticamente a invalidade da cláusula compromissória.

A regra da autonomia da cláusula compromissória foi consagrada pela jurisprudência arbitral e pelos principais regulamentos de arbitragem (156), por forma que integra hoje o Direito Transnacional da Arbitragem (157).

A lei portuguesa introduz uma limitação importante à regra da autonomia da cláusula compromissória (art. 21°/2 LAV): a nulidade do contrato não acarreta a nulidade desta, salvo quando se mostre que ele não teria sido concluído sem a referida convenção.

A norma contida no art. 21.°/2 LAV é aplicável a todas as arbitragens regidas por esta Lei, sejam internas sejam internacionais. Por conseguinte, não se trata de uma regra de Direito material especial, mas de uma regra de Direito comum que é aplicável dentro da esfera espacial traçada pelo art. 37.° LAV (i.e., sempre que a arbitragem “tenha lugar” em Portugal). Trata-se, por isso, de uma norma de Direito material comum “autolimitada” (158).

A reserva à autonomia da cláusula compromissória relativamente ao contrato principal feita na última parte do art. 21.°/2 — “salvo quando se mostre que ele não teria sido concluído sem a referida convenção” — suscita algumas dificuldades de interpretação.

Esta passagem evoca a disposição do art. 292.° CC segundo o qual “a nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o negócio salvo quando se mostre que este não teria sido concluído sem a parte viciada”. Há todavia uma diferença importante entre os dois preceitos (159): no art. 292.° a nulidade de todo o negócio depende da demonstração de que este não teria sido concluído sem a parte viciada; no art. 21.°/2 LAV é a nulidade de uma cláusula (a cláusula compromissória) que depende da demonstração de que o contrato principal nulo não teria sido concluído sem esta cláusula.

Este regime tem como efeito prático que a cláusula compromissória será considerada nula se o contrato principal for nulo e o demandado provar que o contrato não teria sido concluído sem a cláusula compromissória. Não encontrei paralelo nos outros sistemas consultados.

II. ARBITRAGEM TRANSNACIONAL

A) Validade da convenção de arbitragem em geral

Já atrás se tratou dos aspectos da validade da convenção de arbitragem que são comuns à arbitragem interna e à arbitragem transnacional (I). Interessa agora examinar as regras especiais da arbitragem transnacional que versam sobre aspectos já tratados e as soluções para problemas específicos da arbitragem transnacional.

O problema da validade da convenção de arbitragem pode colocar-se perante um tribunal estadual ou perante o próprio tribunal arbitral. Esta diferença de perspectivas é potencialmente relevante no plano do regime aplicável; no mínimo, quando a questão se coloque no tribunal arbitral há que ter em conta as soluções do Direito Transnacional da Arbitragem.

Os tribunais dos Estados que são partes na Convenção de Nova Iorque estão vinculados à aplicação do regime especial contido nesta convenção. Nas ordem jurídica portuguesa também vigora o regime especial da Convenção Interamericana sobre a Arbitragem Comercial Internacional (Panamá, 1975) (160). O mesmo se verifica na ordem jurídica brasileira.

A Convenção de Nova Iorque não define o âmbito espacial de aplicação das suas normas sobre o reconhecimento da convenção de arbitragem. Segundo a opinião dominante, estas normas só se aplicam às convenções de arbitragem que comportam um elemento de estraneidade significativo (161).

Assim, em primeiro lugar, as normas sobre o reconhecimento da convenção de arbitragem aplicam-se às convenções que estão ou previsivelmente estarão na base de decisões arbitrais que são objecto de reconhecimento ao abrigo da Convenção (162). Nas ordens jurídicas dos Estados que, como Portugal, fizeram a reserva prevista no art. 1.°/3/1.ª parte da Convenção, ficam abrangidas as convenções de arbitragem que estão ou previsivelmente estarão na base de sentenças arbitrais que tenham sido proferidas no território de outro Estado contratante ou devam aí ser proferidas (163).

As normas sobre o reconhecimento da convenção de arbitragem aplicam-se também às arbitragens cuja decisão tenha sido proferida ou deva ser proferida no Estado contratante do foro contanto que a convenção de arbitragem seja internacional (164).

A convenção de arbitragem tem de ter por objecto litígios que surjam ou possam surgir entre as partes relativamente a uma determinada relação jurídica, respeitante a uma questão susceptível de ser resolvida por via arbitral (art. 2.°/1).

Em consequência do reconhecimento da convenção de arbitragem o tribunal de um Estado contratante solicitado a resolver um litígio que esteja abrangido pela convenção de arbitragem remeterá as partes para a arbitragem (art. 2.°/3).

O tribunal pode não reconhecer a convenção de arbitragem se constatar “a caducidade da referida convenção, a sua inexequibilidade ou insusceptibilidade de aplicação” (art. 2.°/3). Nas versões francesa e inglesa (duas das versões autênticas) este último preceito refere-se a “caduque, inopérante ou non susceptible d’être appliquée” e a “null and void, inoperative or incapable of being performed”. Parece ser a versão inglesa que exprime melhor o sentido do preceito.

A “caducidade” da convenção verifica-se quando a convenção é inválida (165).
A referência à “inexequibilidade” deve ser entendida no sentido de ineficácia, designadamente devido a revogação da convenção de arbitragem, a anulação da decisão arbitral, à circunstância de o mesmo litígio entre as mesmas partes já ter sido decidido por árbitros ou por um tribunal estadual (caso julgado) ou à verificação de uma causa de caducidade da convenção segundo a lei do lugar da arbitragem (166).

A “insusceptibilidade de aplicação” abrange casos excepcionais em que a arbitragem não pode funcionar, designadamente quando as regras processuais definidas pelas partes ou, na sua omissão, pela lei do lugar da arbitragem, não permitam resolver problemas criados pela obstrução feita por uma das partes, pela escusa do árbitro designado no compromisso ou pela recusa de designação por parte da autoridade indicada na convenção de arbitragem (quando tal não constitua uma causa de caducidade da convenção) (167).

Embora o n.° 3 do art. 2.° se refira apenas ao reconhecimento da convenção de arbitragem pelo tribunal estadual em que tenha sido proposta acção relativa a um litígio abrangido por essa convenção, deve entender-se que as normas do art. 2.° se dirigem igualmente ao tribunal estadual que noutras circunstâncias tenha de apreciar a validade da convenção de arbitragem, designadamente o tribunal em que a decisão for impugnada com fundamento na invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem (168).

O art. 2.° não impede a parte interessada de invocar o Direito interno do Estado contratante em causa, se este for mais favorável à validade e eficácia da convenção de arbitragem (art. 7.°/1) (169). Em sede de reconhecimento da decisão, porém, não pode ser invocada a validade formal da convenção de arbitragem segundo o Direito interno quando o reconhecimento seja pedido com base na Convenção de Nova Iorque (170). Face a todos os regimes, a validade da convenção de arbitragem depende da capacidade das partes para celebrarem a convenção de arbitragem segundo a lei que lhes é aplicável. Isto encontra se expressamente estabelecido no art. 5.°/1/a da Convenção de Nova Iorque, em sede de reconhecimento da decisão arbitral estrangeira.

A Convenção de Nova Iorque regula directamente a forma da convenção de arbitragem e a sua eficácia processual perante os tribunais estaduais, bem como certos aspectos da sua validade substancial. É o que se verifica com a admissibilidade da convenção de arbitragem e com a exigência de determinação da relação jurídica de que emergem os litígios abrangidos pela convenção (art. 2.°). Como a Convenção de Nova Iorque delega na vontade das partes a regulação da constituição do tribunal arbitral e do processo de arbitragem (art. 5.°/1/d), só muito limitadamente se pode suscitar um problema de determinação do Direito aplicável quanto à validade substancial. Será o caso de requisitos do conteúdo da convenção da arbitragem que não digam respeito à determinação da relação jurídica, nem à constituição do tribunal, nem ao processo de arbitragem (171).

O mesmo se diga da Convenção Interamericana (arts. 1.°, 2.°, 3.° e 5.°/1/d).
A Convenção de Nova Iorque e a Convenção Interamericana submetem a arbitrabilidade ao Direito do foro, como adiante se verá.

Em suma, à face destas Convenções os problemas de determinação do Direito aplicável à convenção de arbitragem colocam--se essencialmente com respeito à formação e validade do consentimento, à interpretação, à eficácia obrigacional, ao âmbito pessoal e material de vinculação e à transferência da convenção de arbitragem (172). Em todo o caso, parece que também devem ser respei-tadas as regras interpretativas específicas contidas no Direito do foro.

O mesmo se deve entender à face do regime interno vigente nas ordens jurídicas suíça (173) e portuguesa e parece defensável perante as leis alemã, “inglesa” e italiana, embora nem sempre seja pacífica a exclusão de certas questões (como a arbitrabilidade) do âmbito da lei reguladora da convenção de arbitragem (174).

As normas gerais da LAV sobre a forma e o conteúdo da convenção de arbitragem, bem como sobre a arbitrabilidade, são directamente aplicáveis a todas as arbitragens abrangidas por este regime (175). A inobservância destes requisitos constitui fundamento de anulação da decisão arbitral (arts. 21.°/4 e 27.°/a e /b) e de oposição à execução (arts. 21.°/4 e 31.° e art. 815.° CPC). A eficácia da convenção de arbitragem também é regulada directamente pela LAV.

Abstraindo aqui dos problemas do âmbito pessoal e material de vinculação e da transferência da convenção de arbitragem, que constituem temas específicos, o problema que se coloca é, portanto, o da lei aplicável à formação e validade do consentimento, à interpretação e à eficácia obrigacional das convenções de arbitragem internacionais.

Em França, FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN (176), com apoio na jurisprudência da Capp. de Paris, defendem o recurso pelos tribunais franceses a regras materiais do foro em matéria de interpretação e validade do consentimento na convenção de arbitragem. Trata-se de regras mínimas que devem ser respeitadas por uma convenção de arbitragem no contexto da arbitragem transnacional. Também aqui não se colocaria, portanto, um problema de Direito aplicável (177).

Este alargamento da regulação directa da arbitragem transnacional a matérias que são geralmente reguladas pelo Direito de Conflitos afigura-se excessivo. A aplicação do Direito material do foro a convenções de arbitragem que não têm qualquer conexão com o Estado do foro compromete a previsibilidade jurídica, uma vez que, antes da questão se suscitar nos tribunais deste Estado, as partes não podem contar com a aplicação do seu Direito. Além disso, a aplicação do Direito material do foro à formação e validade do consentimento e à interpretação de uma cláusula compromissória que esteja inserida num contrato regido por outro Direito põe em causa a unidade do contrato (178).

Os tribunais dos Estados que são partes na Convenção de Nova Iorque têm de resolver o problema de determinação do Direito aplicável aos aspectos da convenção de arbitragem excluídos da regulação directa no contexto desta Convenção e, fora do âmbito de aplicação deste tratado, com base no Direito interno (se não forem aplicáveis outras convenções internacionais).

Dentro do domínio de aplicação da Convenção de Nova Iorque, o melhor entendimento é o que extrai do art. 5.°/1/a (relativo aos fundamentos de oposição ao reconhecimento e execução da sentença) a norma de conflitos que determinará o Direito aplicável à convenção de arbitragem, quando invocada como excepção processual. Com efeito, não seria sistematicamente coerente que a questão fosse apreciada segundo critérios diferentes, conforme se suscitasse a propósito da invocação da convenção de arbitragem como excepção processual ou do reconhecimento e execução da sentença (179).

Pela mesma razão, esta norma de conflitos deve também ser aplicada pelo tribunal estadual em que a decisão arbitral seja impugnada (180).

Seguindo-se este entendimento, será competente a lei escolhida pelas partes e, na falta de escolha, a lei do país em que for proferida a sentença. A sentença considera-se, em princípio, como proferida no país da sede da arbitragem. Também a Lei-Modelo da CNUDCI remete, em primeiro lugar, para a lei escolhida pelas partes e, na falta de escolha, manda atender à lei do lugar da arbitragem (art. 34.°/2/a/i).

Solução semelhante é adoptada na Convenção de Genebra de 1961, embora aqui se disponha que na falta de designação pelas partes e não sendo possível prever qual será o país em que a decisão virá a ser proferida se deverá aplicar a lei competente segundo o Direito de Conflitos do foro (art. 6.°/2).

Já o Acordo sobre Arbitragem Comercial Internacional do Mercosul (1998) manda atender apenas ao Direito do Estado em que o tribunal arbitral tem sede (art. 7.°/2).

Quando a questão da validade da convenção de arbitragem se coloque antes de realizada a arbitragem deverá atender-se à sede da arbitragem fixada pelas partes ou, na sua omissão, pelos árbitros. Se esta sede não se encontrar fixada haverá que recorrer ao Direito de Conflitos de fonte interna, adiante examinado.

A designação pelas partes do Direito aplicável ao contrato principal também vale, em princípio, para a cláusula compromissória (181). Com efeito, não se vê razão para apreciar a formação e a validade do consentimento e a interpretação da cláusula compromissória segundo um Direito diferente daquele que rege essas questões com respeito ao conjunto do contrato. Alguns autores pronunciam-se em sentido contrário (182), mas a sua argumentação não toma em conta que estão essencialmente em causa questões relativas à formação e validade do consentimento, à interpretação e à eficácia obrigacional das convenções de arbitragem internacionais. Claro que o problema se colocaria a uma outra luz se a admissibilidade ou a eficácia da convenção colocassem um problema de Direito aplicável. Mas não é isso, como vimos, que se verifica.

Em todo o caso, nada impede que as partes submetam a cláusula compromissória a um Direito diferente daquele que rege o conjunto do contrato (183).

Já se defendeu que só é relevante, neste contexto, uma designação expressa (184). Por minha parte não vejo razão alguma para negar a relevância de uma vontade real tacitamente manifestada (185).

A este respeito é de observar que a estipulação da sede da arbitragem não constitui um indício importante de uma vontade tácita de aplicação do Direito da sede da arbitragem à cláusula compromissória (186).

Quando a Convenção de Nova Iorque não for aplicável temos de recorrer ao regime interno da arbitragem transnacional (na falta de outro regime de fonte supraestadual que seja aplicável).

A Convenção de Roma sobre a Lei Aplicável às Obrigações Contratuais exclui do seu âmbito de aplicação as convenções de arbitragem (art. 1.°/2/d).

Alguns sistemas dispõem de uma norma de conflitos específica sobre o Direito aplicável aos aspectos da convenção de arbitragem que não são regulados directamente. É o caso da Lei federal suíça de Direito Internacional Privado, que considera substancialmente válida a convenção de arbitragem que satisfaça as condições colocadas seja pelo Direito escolhido pelas partes, seja pelo Direito regulador do objecto do litígio e, designadamente, o Direito aplicável ao contrato principal, seja ainda pelo Direito suíço (art. 178.°/2). Adopta-se aqui uma conexão alternativa com vista a favorecer a validade substancial da convenção de arbitragem (187).

Nos restantes sistemas consultados não encontramos uma norma de conflitos específica sobre o Direito aplicável aos aspectos da convenção de arbitragem que não são regulados directamente.

A tendência verificada na generalidade dos principais sistemas é favorável à escolha pelas partes do Direito aplicável, indo ao encontro do estabelecido na Convenção de Nova Iorque (188). As partes têm a mesma liberdade na designação do Direito aplicável à convenção de arbitragem que na escolha do Direito aplicável ao mérito da causa, e poderão escolher o Direito aplicável à convenção de arbitragem independentemente do Direito que rege o mérito da causa (189). Se não o fizerem, porém, deve entender-se que a designação do Direito aplicável ao contrato principal abrange a cláusula compromissória (190).

No que se refere ao Direito português, a letra do art. 33.° LAV abrange quaisquer questões de determinação do Direito aplicável pelos árbitros. Por certo que o preceito foi pensado em primeira linha para a determinação do Direito aplicável ao mérito da causa. Mas mesmo que se entenda que a norma do art. 33.° LAV não é directamente aplicável aos aspectos da convenção de arbitragem excluídos da regulação directa, é defensável a sua aplicação analógica, visto que as razões que justificam este regime especial procedem igualmente em relação a essas questões (191).

Na falta de designação pelas partes, a doutrina e a jurisprudência dividem-se entre a aplicação do Direito do Estado da sede da arbitragem e o recurso ao Direito regulador do contrato principal (192). Por minha parte, entendo que tratando-se de uma cláusula compromissória, a sua inserção no contrato principal justifica que a formação e validade do consentimento, interpretação e eficácia obrigacional sejam regidas pelo Direito aplicável ao contrato principal (193). No mesmo sentido dispõe o art. 3121.° do Código Civil do Quebeque que, porém, estabelece uma conexão alternativa com a lei do Estado em que a arbitragem se realiza por forma a favorecer a validade da convenção de arbitragem.

Perante o art. 33.°/2 LAV, os árbitros têm a maior liberdade na determinação do Direito aplicável ao contrato principal, com base no critério do Direito mais apropriado ao litígio (194). Esta solução apresenta-se mais adequada que a remissão para o Direito do país em que for proferida a sentença feita pela Convenção de Nova de Iorque (195).

Em matéria extracontratual já não há razão para supor que o Direito mais apropriado seja o mesmo que rege o mérito da causa. Aqui haverá que atender aos laços que a convenção de arbitragem estabeleça com os Estados em presença e numa avaliação objectiva do conteúdo dos respectivos Direitos. Se as partes não tiverem sede, estabelecimento ou residência habitual no mesmo Estado, a sede da arbitragem constituirá o laço objectivo mais importante (196).

Relativamente às convenções de arbitragem que constituam cláusulas contratuais gerais, o regime português das cláusulas contratuais gerais, atrás referido (supra I C) será aplicável em duas hipóteses:

— quando o contrato for regido pela lei portuguesa;
— nas relações com consumidores finais, quando apesar da escolha de uma lei diferente, “o mesmo apresente uma conexão estreita com o território português” (art. 23.°/1).

Com respeito à arbitragem comercial internacional esta segunda hipótese não se verifica normalmente, razão por que será desnecessário entrar no problema de interpretação suscitado pelo art. 23.° do DL n.° 446/85 (197).

Afora esta segunda hipótese, coloca-se a questão de saber, no que se refere à convenção de arbitragem, se o regime das cláusulas contratuais gerais será aplicável quando o contrato principal for regido pela lei portuguesa ou quando a convenção de arbitragem for regida pela lei portuguesa, visto que pode não haver coincidência (198).

Por minha parte entendo que os aspectos da cláusula compromissória que não forem regulados directamente são em princípio regidos pelo Direito aplicável ao contrato principal. Quando, porém, isto não se verifique, nas relações entre empresários o Direito positivo só fundamenta a aplicação do regime português das cláusulas contratuais gerais à cláusula compromissória regida pelo Direito português.

Foi atrás defendido que o art. 19.°/g do regime das cláusulas contratuais gerais, que proíbe, consoante o quadro negocial padronizado, as cláusulas contratuais gerais que “Estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem”, é extensível às convenções de arbitragem (supra I C).

Creio que este preceito será aplicável quando a cláusula compromissória for regida pela lei portuguesa, mesmo dentro de âmbito de aplicação do art. 2.° da Convenção de Nova Iorque, uma vez que se trata de uma norma relativa à validade substancial da convenção que não diz respeito aos aspectos regulados pela Convenção.

Nos casos residuais de convenções de arbitragem internacionais que estejam fora do âmbito da arbitragem internacional no sentido da LAV (199), o Direito aplicável aos aspectos da convenção de arbitragem que não são regulados directamente terá de ser determinado com base na aplicação do art. 35.° CC e na aplicação directa ou analógica dos arts. 41.° e 42.° CC (200).

As normas de conflitos dos arts. 41.° e 42.° CC não são directamente aplicáveis à convenção de arbitragem que constitua um negócio autónomo, porque não se trata de um negócio obrigacional, mas jurídico-processual (supra I A). Mas a natureza jurídico--processual não obsta à aplicação analógica destas normas de conflitos, que é justificada pela ligação do negócio a uma relação transnacional (201).

No que toca à capacidade das partes para celebrarem a convenção de arbitragem, os tribunais estaduais devem aplicar o Direito de Conflitos do foro (202).

Passe-se agora à apreciação das questões relativas à validade da convenção de arbitragem pelos tribunais arbitrais.

A jurisprudência arbitral não parece ter desenvolvido soluções materiais autónomas em matéria de validade da convenção de arbitragem, salvo no que diz respeito à autonomia da cláusula compromissória (supra I E) e a alguns aspectos da arbitrabilidade (supra I D).

Os principais regulamentos dos centros de arbitragem também não regulam directamente, em princípio, a validade substancial da convenção de arbitragem (203). Não obstante, estes regulamentos contêm preceitos sobre a constituição do tribunal arbitral e o funcionamento da arbitragem. A maior parte destes preceitos tem natureza supletiva, mas parece certo que alguns deles são imperativos, vindo a traduzir-se em requisitos de validade substancial da convenção de arbitragem que devem ser aplicados pelos árbitros.

Na falta de soluções materiais autónomas, resulta das regras e princípios do Direito Transnacional da Arbitragem sobre a determinação do Direito aplicável que os árbitros têm uma ampla liberdade na apreciação destas questões.

Os árbitros devem respeitar a designação feita pelas partes do Direito aplicável à convenção de arbitragem. As partes tanto podem fazer referência a um Direito estadual como a regras não-estaduais. A remissão para um regulamento arbitral pode, na falta de indicações em contrário contidas no contrato, ser entendida no sentido de uma escolha das regras deste regulamento que disciplinem a validade da convenção de arbitragem, mesmo que não se trate do regulamento do centro que organiza a arbitragem (por exemplo, quando as partes estipulem a aplicação do Regulamento CNUDCI).

Na omissão das partes, os árbitros tanto podem recorrer a Direito estadual como apreciar os pressupostos e requisitos da convenção de arbitragem e interpretá-la segundo usos e costumes do comércio internacional, regras desenvolvidas pela jurisprudência arbitral e, na sua falta, “princípios comuns” aos sistemas nacionais (204).

Quando escolhem um Direito estadual, os árbitros procuram geralmente favorecer a validade da convenção de arbitragem (205). Mas frequentemente os tribunais arbitrais fazem exclusivamente apelo a critérios de decisão de “fonte” autónoma (206), atitude que pode exprimir a mesma preocupação.

Os principais sistemas nacionais não parecem conter directrizes que cerceiem significativamente esta liberdade dos árbitros.

Na maioria destes sistemas, a omissão de regra específica sobre o Direito aplicável à convenção de arbitragem deixa aos árbitros a mais ampla liberdade na resolução do problema.

Perante a Lei suíça, a regra de conflitos nesta matéria é interpretada pela doutrina dominante no sentido de admitir que as partes submetam a convenção de arbitragem a Direito não-estadual, designadamente regulamentos de centros de arbitragem, usos do comércio internacional e princípios gerais de Direito (207); independentemente de designação pelas partes do Direito aplicável à validade substancial da convenção de arbitragem, é suficiente que a convenção de arbitragem seja válida perante o Direito aplicável ao mérito da causa e tanto as partes como os árbitros gozam, perante a Lei suíça, da mais ampla liberdade na determinação do Direito aplicável ao mérito da causa.

Quando se tenha de atender ao art. 33.° LAV na determinação do Direito aplicável aos aspectos da convenção de arbitragem que não são regulados directamente, haverá que levar em conta alguns limites à liberdade das partes e dos árbitros na escolha dos critérios de decisão. Remeto a este respeito para o meu estudo sobre o Direito aplicável ao mérito da causa na arbitragem transnacional (208). De um ponto de vista prático, a decisão que respeitar a vontade das partes será, em princípio, válida; na omissão das partes, os árbitros estão adstritos ao dever de aplicar Direito positivo (estadual ou transnacional).

Um última questão que se pode suscitar neste contexto é a da vinculação dos árbitros ao disposto na Convenção de Nova Iorque quando vigore em todos os Estados que têm uma ligação especialmente significativa com a arbitragem, ou em que seja previsível que a decisão arbitral careça, em caso de necessidade, de ser executada (209).

Não sendo possível aprofundar aqui este ponto, deixarei apenas duas notas.
Penso que se deve negar a vinculação directa dos árbitros a convenções internacionais de unificação do Direito da Arbitragem. As normas destas convenções podem relevar como normas vigentes na ordem jurídica dos Estados contratantes envolvidos, no mesmo pé que as normas de fonte interna, na medida em que tenham vocação a ser aplicadas na arbitragem. Quanto a este último aspecto é de observar que a Convenção de Nova Iorque limita-se a regular o reconhecimento da convenção de arbitragem pelos tribunais dos Estados Contratantes e o reconhecimento e a execução das decisões arbitrais estrangeiras na ordem jurídica dos Estados contratantes. Mas isto não obsta a que os árbitros devam, nessas circunstâncias, ter em conta as normas da Convenção de Nova Iorque na apreciação da sua competência, uma vez que a sua observância pode ter influência na validade e eficácia da decisão arbitral.

B) Validade formal da convenção de arbitragem

Também a este respeito importa distinguir a perspectiva dos tribunais estaduais da perspectiva dos tribunais arbitrais.

A tendência que se manifesta nos principais sistemas vai no sentido de uma regulação directa da validade formal da convenção de arbitragem, mesmo que esta tenha um carácter internacional. Quer isto dizer que em lugar do recurso à norma de conflitos reguladora da forma dos negócios jurídicos, com vista a designar o Direito aplicável, se formula uma norma material sobre a forma da convenção de arbitragem.

Ficou atrás assinalado que alguns sistemas estabelecem um regime comum para a forma da convenção de arbitragem na arbitragem interna e na arbitragem transnacional, enquanto outros dispõem de um regime especial exclusivamente aplicável à arbitragem transnacional (supra I C).

A lei portuguesa segue a primeira via, mas há que ter em conta os regimes especiais de fonte internacional, designadamente o regime especial da Convenção de Nova Iorque, que inspirou outros instrumentos internacionais, tais como a Convenção de Genebra de 1961 e a Convenção Interamericana. O mesmo se verifica perante o ordenamento brasileiro.

Na alínea anterior foi observado que a Convenção de Nova Iorque regula o reconhecimento da convenção de arbitragem no art. 2.° e foi indagado do âmbito espacial de aplicação das regras aí vertidas.

Estas regras foram atrás examinadas, tendo-se concluído que, em resultado, há em princípio coincidência entre as exigências de forma feitas pela Convenção de Nova Iorque e pela lei portuguesa (supra I C).

O art. 1.°/2/a da Convenção de Genebra de 1961 é inspirado no art. 2.°/2 da Convenção de Nova Iorque, com aprimoramentos de formulação que vão ao encontro da interpretação dada a este preceito (210).

O art. 1.° da Convenção Interamericana contém regras semelhantes às do art. 2.° da Convenção de Nova Iorque. A única diferença substantiva é que a Convenção Interamericana apenas obriga ao reconhecimento da convenção de arbitragem que tenha por objecto divergências relativas a um “negócio de natureza mercantil” [affaire commerciale/commercial transaction nas versões francesa e inglesa]. De resto aplicam-se as considerações formuladas com respeito à Convenção de Nova Iorque.

O Acordo sobre Arbitragem Comercial Internacional do Mercosul (1998) segue uma via algo diversa, ao combinar normas de Direito material especial com soluções conflituais. Exige-se que a convenção de arbitragem seja escrita (art. 6.°/1) e estabelece-se que a convenção arbitral celebrada entre ausentes poderá concretizar-se pela troca de cartas ou telegramas com recebimento comprovado (art. 6.°/3). Simultaneamente, porém, estabelece-se uma conexão alternativa, segundo a qual a convenção de arbitragem será considerada formalmente válida se cumprir os requisitos exigidos seja pela lei do lugar da celebração seja pela lei de algum dos Estados com o qual o contrato principal tem contactos objectivos (art. 6.°/2 e /5). Assim, embora o Acordo exija que uma convenção de arbitragem celebrada através de troca de faxes ou mensagens de correio electrónico seja confirmada por documento original, esta exigência pode ser dispensada se a convenção for considerada formalmente válida pela lei de algum dos Estados com o qual o contrato principal tem contactos objectivos (art. 6.°/3/2.ª parte).

Passando agora à perspectiva dos tribunais arbitrais, cumpre reconhecer que a jurisprudência arbitral não desenvolveu soluções autónomas em matéria de validade formal da convenção de arbitragem. Algumas decisões arbitrais submeteram a forma da convenção de arbitragem à lei do Estado da sede da arbitragem ou à lei do lugar da celebração, o que mereceu reparos críticos na doutrina (211).

No que toca aos regulamentos dos principais centros de arbitragem, verifica-se que a maior parte exige forma escrita (212). Afora este requisito de validade formal, que deve ser aplicado pelos árbitros nas arbitragens realizadas sob a égide dos respectivos centros de arbitragem, o Direito Transnacional da Arbitragem permite aos árbitros a mesma margem de apreciação que foi assinalada, na alínea anterior, com respeito à validade da convenção de arbitragem em geral.

C) Arbitrabilidade da controvérsia

Mais uma vez importa distinguir conforme o problema da arbitrabilidade se coloca perante os tribunais estaduais ou perante os tribunais arbitrais.

Os tribunais estaduais aplicam o Direito vigente na respectiva ordem jurídica.
Todos os sistemas consultados regulam directamente a arbitrabilidade objectiva, nos termos de uma regra comum à arbitragem interna e à arbitragem transnacional ou de uma regra especial privativa da arbitragem transnacional (supra I D). Não se coloca, por isso, à face destes sistemas, um problema de determinação do Direito aplicável à arbitrabilidade.

No que toca aos tribunais portugueses, o art. 1.° LAV é aplicável à arbitragem internacional que tenha ou deva ter lugar em Portugal, uma vez que não é afastado pelas normas especiais contidas no Cap. VII da LAV (213).

Também em caso de invocação da excepção de preterição de tribunal arbitral que funcione ou deva funcionar no estrangeiro e de reconhecimento de decisão arbitral “estrangeira” a arbitrabilidade deve ser aferida segundo o Direito material do foro. É também esta a posição à face do art. 6.°/2/c in fine da Convenção de Genebra de 1961 e do art. 5.°/2/a da Convenção de Nova Iorque.

Embora o art. 2.°/1 da Convenção de Nova Iorque não se pronuncie sobre a lei aplicável à arbitrabilidade quando a convenção de arbitragem seja invocada como excepção processual, a coerência interna da Convenção justifica a aplicação analógica do art. 5.°/2/a relativo ao reconhecimento da decisão arbitral “estrangeira” (214). Este preceito submete a questão ao Direito do foro.

O mesmo entendimento é seguido pela doutrina dominante perante as leis francesa (215), suíça (216) e alemã (217) e foi consagrado, nos EUA, pela decisão do Supremo Tribunal no caso Mitsubishi v. Soler Chrysler-Plymouth (1985) (218).

Claro que a aplicação da lei do foro à questão da arbitrabilidade, quando ela se suscite como excepção processual, pode conduzir a uma desarmonia internacional de soluções, que encerra o risco de conflitos positivos e negativos de competências. Por exemplo, a acção é proposta no Estado A, em violação de uma convenção de arbitragem que fixa o lugar da arbitragem no Estado B. Se o Direito do Estado A considerar o litígio arbitrável e o Direito do Estado B excluir a arbitrabilidade, o tribunal do Estado A, aplicando a lei do foro, considerar-se-á incompetente, mas existe o risco de o tribunal arbitral também se considerar incompetente por aplicação do Direito do Estado B ou, caso não se considere incompetente, que a decisão seja anulada pelos tribunais do Estado B.

Por isso, alguns autores defendem a aplicação do Direito da sede da arbitragem à questão da arbitrabilidade suscitado no quadro da excepção de preterição de tribunal arbitral (219).

Mas esta solução traria consigo graves dificuldades e inconvenientes.
Por um lado, o risco de uma desarmonia interna de soluções conforme a questão da arbitrabilidade se suscite no quadro de uma excepção processual ou no estádio de reconhecimento e execução. Assim, por exemplo, os tribunais de um Estado poderiam considerar-se incompetentes em relação a um litígio, com base na aplicação da lei estrangeira da sede da arbitragem à questão da arbitrabilidade, e, posteriormente, o reconhecimento da decisão poderia ser negado no mesmo Estado por se tratar de litígio que não pode ser submetido a arbitragem perante o Direito do foro.

Por outro lado, o Estado da sede da arbitragem pode não ter qualquer ligação significativa com o objecto do litígio, dificilmente se justificando a aplicação da lei estrangeira da sede da arbitragem, com as dificuldades inerentes à determinação e aplicação da lei estrangeira.

Com a arbitrabilidade objectiva se relaciona ainda a questão de saber se as cláusulas que confiem a integração, complemento ou adaptação do contrato a terceiros podem valer como convenções de arbitragem. A este respeito haverá que atender fundamentalmente ao Direito aplicável ao contrato e ao estatuto da arbitragem.

Apreciar-se-á segundo o Direito regulador do contrato a possibilidade de confiar a terceiro a integração, complemento ou adaptação do contrato. Na omissão das partes, pertence igualmente ao Direito regulador do contrato definir se, e em que termos, os árbitros devem proceder à integração, complemento ou adaptação do contrato (220).

Já cabe ao estatuto da arbitragem determinar se os árbitros têm competência para realizar uma actividade conformadora do contrato, o processo a seguir nesta conformação jurídica e se a conformação pode conduzir a uma decisão com valor e eficácia jurisdicional (221).

O ponto também poderia suscitar alguma dúvida com relação à arbitrabilidade subjectiva, por tradicionalmente se entender que se trata de uma questão de capacidade regida pela lei pessoal (222). Também a este respeito, porém, se manifesta uma tendência para a regulação directa ou material, que exclui, ou pelo menos limita, o recurso à lei pessoal (223).

Esta tendência manifestou-se, antes do mais, na Convenção de Genebra de 1961, que no seu art. 2.°/1 determina que as “pessoas colectivas de Direito público” têm a faculdade de celebrar validamente convenções de arbitragem.

A jurisprudência francesa também deu um contributo importante nesta direcção. Já se observou que no Direito francês é proibido o recurso a arbitragem por pessoas colectivas públicas nos contratos internos, salvo lei especial (art. 2060.° CC). Em matéria internacional, porém, a jurisprudência francesa veio admitir que os árbitros podem decidir litígios que põem em causa disposições de ordem pública e desenvolveu progressivamente uma regra segundo a qual, na arbitragem comercial internacional, são susceptíveis de arbitragem litígios em que sejam partes pessoas colectivas públicas francesas (supra I D). Esta regra material especial foi estendida às pessoas colectivas públicas estrangeiras, por forma que um Estado (ou um ente público autónomo) não se pode prevalecer das disposições do seu Direito para contestar a validade de uma convenção de arbitragem que tenha livremente celebrado (224).

A Lei federal suíça, além de estabelecer a arbitrabilidade de todos os litígios de natureza patrimonial em matéria de arbitragem internacional (art. 177.°/1), determina que “se uma parte na convenção de arbitragem é um Estado, uma empresa dominada ou um organismo por ele controlado, esta parte não pode invocar o seu próprio Direito para contestar a arbitrabilidade de um litígio ou a sua capacidade para ser parte numa arbitragem” (n.° 2).

Noutros sistemas, entre os quais se contam o alemão, o inglês, o italiano e o português, a lei é omissa quanto susceptibilidade de pessoas colectivas públicas estrangeiras invocarem o seu Direito para contestarem a validade da convenção de arbitragem e ainda não se desenvolveu uma regra de outra fonte que resolva a questão.

No Direito português, como se assinalou anteriormente (I D), o art. 1.°/4 LAV determina que o “Estado e outras pessoas colectivas de direito público podem celebrar convenções de arbitragem, se para tanto forem autorizados por lei especial ou se elas tiverem por objecto litígios respeitantes a relações de direito privado”. Enquanto as soluções estrangeiras anteriormente referidas são específicas da arbitragem transnacional, trata-se aqui de definir as “condições em que o Estado e outras pessoas de direito público podem recorrer ao instituto da arbitragem” com respeito a todas as arbitragens regidas pela LAV, tanto internas como internacionais (225). Parece claro o sentido do preceito quando sujeita a autorização de lei especial os litígios de Direito público português em que sejam partes pessoas colectivas de Direito público português.

Aparentemente, a segunda parte do preceito também se refere apenas à possibilidade das pessoas colectivas públicas portuguesas celebrarem convenções de arbitragem com respeito a litígios privados nada se dispondo sobre as pessoas colectivas públicas estrangeiras, em relação aos litígios privados ou aos litígios que relevem de Direito público estrangeiro (226).

Não creio que se possa ver neste preceito a manifestação de um princípio geral, segundo o qual a capacidade de um sujeito público para celebrar uma convenção de arbitragem se aprecie segundo a sua lei pessoal (227). No art. 1.°/4 LAV parece estar contida uma mera regra material, que não contém em si um elemento de conexão, e cujo âmbito de aplicação no espaço é delimitado por outras regras. Por um lado, a generalidade das normas materiais de Direito comum português sobre a actividade de pessoas colectivas públicas aplica-se apenas às pessoas colectivas públicas nacionais. Por outro, as normas contidas na LAV só disciplinam as arbitragens que tenham lugar em Portugal. Por conseguinte, aparentemente, aquele preceito só regula a possibilidade de pessoas colectivas públicas nacionais celebrarem convenções de arbitragem quando a arbitragem se deva realizar em Portugal.

A lei é omissa quanto à susceptibilidade de pessoas colectivas públicas estrangeiras celebrarem convenções de arbitragem e não é reconhecível um princípio geral que vincule os órgãos de aplicação (estaduais ou arbitrais) a resolverem a questão segundo a lei pessoal desses entes. Por conseguinte, os órgãos de aplicação têm uma margem de apreciação na integração da lacuna, que lhes permite ter em conta o princípio da confiança e as necessidades do comércio internacional.

Os tribunais portugueses podem ter em conta estes critérios de valoração na formulação de uma solução “dentro do espírito do sistema”. Entendo que neste quadro os tribunais portugueses devem adoptar uma solução idêntica à que foi desenvolvida pelos tribunais franceses e adoptada pela Lei federal suíça.

Por seu turno, nas arbitragens transnacionais que se realizem em Portugal, os árbitros não estão impedidos de aplicar ou desenvolver soluções autónomas sobre a arbitrabilidade subjectiva com respeito a pessoas colectivas públicas estrangeiras.

Embora o critério da arbitrabilidade seja definido pela lex fori, pode ser necessário ter em conta Direito estrangeiro. Assim, sendo o critério da arbitrabilidade a disponibilidade do direito, surge um problema de substituição quando o direito é regulado por uma lei estrangeira (228). O conceito relevante de disponibilidade é definido pela lex fori. A caracterização do direito em causa tem de ser feita à face da lex causae (229).

Perante os tribunais arbitrais, a apreciação da questão da arbitrabilidade suscita algumas dúvidas.
Sem dúvida que, em princípio, pertence às ordens jurídicas estaduais determinar os limites da arbitrabilidade (230). Mas como os tribunais da arbitragem transnacional não estão exclusivamente sujeitos a uma particular ordem jurídica estadual, e podem ser destinatários de directrizes estaduais contraditórias, é inevitável reconhecer que os tribunais arbitrais dispõem de uma margem de apreciação das directrizes estaduais. Por acréscimo, na medida em que tal seja compatível com as concepções largamente dominantes nas ordens jurídicas estaduais, parece possível que se formem regras e princípios transnacionais em matéria de arbitrabilidade (231).

No que toca à arbitrabilidade objectiva, a jurisprudência arbitral tende a considerar arbitráveis todos os litígios contratuais e, frequentemente, não faz depender a arbitrabilidade de um particular Direito estadual. Nesta medida, parece defensável que a arbitrabilidade dos litígios contratuais constitui hoje um princípio transnacional reconhecido pelos árbitros e pelos operadores do comércio internacional (232).

Indo mais além, poderá porventura defender-se que o Direito Transnacional da Arbitragem permite aos árbitros ocuparem-se de todas as matérias que não sejam inarbitráveis por força da ordem pública transnacional (233). No que toca às directrizes estaduais, os árbitros devem tomar em conta a posição que os Direitos dos Estados que apresentam uma ligação especialmente significativa com a arbitragem ou em que previsivelmente a decisão careça, em caso de necessidade, de ser executada tomam sobre a arbitrabilidade.

Quanto à arbitrabilidade subjectiva, deve entender-se que a regra segundo a qual o Estado ou ente público autónomo estrangeiro não pode contestar a validade da convenção de arbitragem ou, em particular, a arbitrabilidade do litígio com base no seu Direito interno integra hoje o Direito Transnacional da Arbitragem (234).

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NOTAS:

(*) O presente trabalho foi elaborado com vista aos Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor André Gonçalves Pereira.

(**) Professor da Faculdade de Direito de Lisboa.

(1) Em sentido próximo ver JARROSSON [1987: 367 segs., maxime 372 e 2001: 19 e segs.], PIERRE LALIVE/GAILLARD [911 e seg.] e LALIVE/POUDRET/REYMOND [271]. Ver também BERNARDINI [1998: 5 e 17] que, porém, distingue, com base na lei italiana, entre arbitragem “ritual” e arbitragem “irritual”.

(2) Sobre esta Convenção ver LIMA PINHEIRO [2002b: 410 e segs.] com mais referências.

(3) Ver art. 7.°/1 da Lei-Modelo da CNUDCI, arts. 1442.° e 1447.° NCPC, art. 1.°/2 LAV, art. 1029.° ZPO, art. 6.° da Lei “inglesa” de arbitragem de 1996, arts. 807.°/1 e 808.°/1 CPC it.

(4) Ver LIMA PINHEIRO [2003: 159 e segs.].

(5) BORN [2001: 152] informa que alguns Estados dos EUA só reconhecem eficácia às convenções de arbitragem que tenham por objecto um litígio actual, mas esta restrição é, em princípio, afastada pelo Direito federal em todos os casos internacionais.

(6) Art. 1029.°/2 ZPO e art. 808.°/1 CPC it.

(7) A Lei da Arbitragem Voluntária (LAV) é a Lei n.° 31/86, de 29/8, modificada pelo DL n.° 38/2003, de 8/3.

(8) Cf. Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.° 34/IV [Diário da Assembleia da República II s. n.° 83, de 2/7/86] n.° 8.

(9) No caso da responsabilidade extracontratual que não seja conexa com uma relação contratual só existe uma “relação jurídica determinada” depois da ocorrência do facto causador de prejuízo.

(10) Ver ANSELMO DE CASTRO [1982 I: 94 e segs.] e RAÚL VENTURA [1986b: 296 e segs.], com mais referências.

(11) Ver também RECHSTEINER [2001: 124] e NEHRING NETTO [II.1].

(12) Ver PINHEIRO CARNEIRO [1999: 291 e segs.], BOSCO LEE [2002: 70 e segs.] e DOLINGER/TIBURCIO [2003: 33 e seg.].

(13) Art. 1442.° NCPC, art. 1.°/2 LAV, art. 1029.°/1 ZPO e 808.°/1 CPC it.

(14) Cf. LALIVE/POUDRET/REYMOND [49], BUCHER [1989: 48] e POUDRET/BESSON [125 e seg.].

(15) Cf. SCHWAB/WALTER [2000: 76]; RAÚL VENTURA [1986b: 298 e segs.], TEIXEIRA DE SOUSA [1997b: 193] e LEBRE DE FREITAS [2002: 627 e seg.]. Cp. BASEDOW [1987: 5 e segs.].

(16) Cf. BENTO SOARES/MOURA RAMOS [381 e seg.]; SCHLOSSER [1989: 309 e segs.]; FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [733 e seg.]; BORN [2001: 920 e segs.]; FERNÁNDEZ ROZAS [2002: 146 e seg. e 161 e segs.]; PAULA COSTA E SILVA [2003: 222 e segs.], excluindo que o tribunal arbitral possa decretar medidas cautelares que impliquem o exercício de poderes de autoridade. Ver ainda TEIXEIRA DE SOUSA [1993: 118]. Cp. LEBRE DE FREITAS [2002: 625].
O art. 17.° da Lei-Modelo da CNUDCI dispõe expressamente no sentido de o tribunal arbitral poder decretar injunções dirigidas às partes com carácter provisório ou conservatório. No mesmo sentido, art. 183.° da Lei suíça de Direito Internacional Privado (embora, na arbitragem interna, o art. 26.°/1 do Concordat sur l’arbitrage disponha em sentido contrário) e art. 1041.°/1 ZPO. Cp. Art. 818.° CPC it. e art. 22.°/§ 4.° da Lei brasileira de arbitragem que suscita divergências na doutrina — cp. RECHSTEINER [2001: 121 e segs.] e PINHEIRO CARNEIRO [1999: 310].
Contrariamente ao sustentado por BENTO SOARES/MOURA RAMOS, não parece que à face do Direito interno, na falta de norma que o preveja, os tribunais arbitrais só possam decretar estas providências cautelares quando as partes lhes confiram expressamente esse poder. Por outro lado, deve entender-se que a competência do tribunal arbitral não obsta ao recurso aos tribunais estaduais para a obtenção de providências cautelares, à semelhança do que dispõe o art. 9.° da Lei-Modelo da CNUDCI — ver BENTO SOARES/MOURA RAMOS [357 e seg.] — e o art. 19.° do Acordo de Buenos Aires sobre a Arbitragem Comercial Internacional (1998). Neste sentido, ver art. 6.°/4 da Convenção de Genebra de 1961, art. 1033.° ZPO, art. 44.°/1 da Lei de arbitragem “inglesa” de 1996, LALIVE/POUDRET/REYMOND [369], FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [725 e segs.] e, entre nós, ac. 31/7/1997 do 15.° Juízo Cível de Lisboa [CJ (1997-II) 297], RCb 9/4/2002 [CJ (2002-II) 14] e PAULA COSTA E SILVA [2003: 234]. As partes podem solicitar estas providências aos tribunais estaduais quer antes de o tribunal arbitral estar constituído quer depois da sua constituição. Neste segundo caso, o recurso directo ao tribunal estadual pode ser recomendável, visto que o tribunal estadual pode executar imediatamente a providência — neste sentido MORAIS LEITÃO/MOURA VICENTE [17].
Sobre a adopção de providências cautelares pelos árbitros ver actas do colóquio organizado pelo International Arbitration Institute, em Maio de 2002, na página http://www.iaiparis.com/pdf/actes_colloque.pdf.

(17) A lei portuguesa enuncia três causas de caducidade da convenção de arbitragem. Primeiro, se algum dos árbitros designados falecer, se escusar ou ficar impossibilitado permanentemente para o exercício da função ou se a designação ficar sem efeito, desde que não seja substituído nos termos previstos na lei (art. 4.°/1/a LAV). Segundo, se, tratando-se de tribunal colectivo, não puder formar-se maioria na deliberação dos árbitros (b). Terceiro, se a decisão não for proferida no prazo estabelecido de acordo com o disposto na lei (c). A morte ou extinção das partes não faz caducar a convenção de arbitragem, salvo convenção em contrário (art. 4.°/2). Sobre a transmissão da posição da parte que morre ou é extinta ver RAÚL VENTURA [1986b: 395 e segs.].
No plano dos princípios, não se justifica a caducidade da convenção de arbitragem em caso de insolvência das partes — ver, perante o Direito francês, FOUCHARD [1998: 486 e segs.] e, em geral, HANOTIAU [2002: 186 e segs.]. No entanto, o art. 87.°/1 do novo C. Insolv./Rec. Emp. determina a suspensão da “eficácia das convenções arbitrais em que o insolvente seja parte, respeitantes a litígios cujo resultado possa influenciar o valor da massa, sem prejuízo do disposto em tratados internacionais aplicáveis”. Esta disposição não se aplica aos processos arbitrais em curso, em que se opera, na maioria dos casos, a substituição do insolvente pelo administrador da insolvência (art. 87.°/2).

(18) Cf. RAÚL VENTURA [1986b: 407 e seg.].

(19) No Direito alemão, decorre do art. 1032.°/2 ZPO que pode ser requerida ao tribunal estadual, até à constituição do tribunal arbitral, a determinação da admissibilidade ou inadmissibilidade de um processo arbitral. A lei “inglesa” de 1996 também admite, posto que excepcionalmente, estas acções nos termos dos arts. 32.° e 72.°. Em princípio, estas acções não são admissíveis em sistemas que reconhecem o chamado efeito negativo da regra competência-competência — cf. Cass. fr. 5/1/1999, no caso Zanzi [R. arb. (1999) 260] e an. de FOUCHARD [loc. cit.]. Perante o Direito brasileiro, PINHEIRO CARNEIRO [1999: 302 e seg.] pronuncia-se pela inadmissibilidade destas acções depois de instituído o tribunal arbitral.

(20) Como se verifica nos EUA, em que o tribunal judicial pode emitir injunções sobre a execução da convenção de arbitragem pelas partes (arts. 4.°, 206.° e 303.° da Lei federal de arbitragem) — ver BORN [2001: 381 e segs.].

(21) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [457], SCHLOSSER [1989: 302 e 333], SCHWAB/WALTER [2001: 78 e seg.] e RECHSTEINER [2001: 68].

(22) Ver RUBINO-SAMMARTANO [2002: 334 e segs.].

(23) Cf. LALIVE/POUDRET/REYMOND [284 e seg.]. Não é pois exacta a afirmação, feita por FERNÁNDEZ ROZAS [2002: 93], segundo a qual a necessidade de invocação pela parte interessada constituiria regra comum.

(24) Cf. RAÚL VENTURA [1986b: 388].

(25) Ver decisão do Tribunal Federal de 14/5/2001, no caso Fomento de Construcciones [R. arb. (2001) 835 an. POUDRET] e POUDRET/BESSON [466 e segs.], com mais referências.

(26) No mesmo sentido, em tese geral, FERNÁNDEZ ROZAS [2002: 95 e segs. e 210 e segs.]. Independentemente da posição que se assuma a este respeito, parece claro que, na arbitragem transnacional, a pendência de uma acção no tribunal de um determinado Estado não deve obstar a que o tribunal arbitral se considere competente. Não é, esta, todavia, a posição do Tribunal Federal suíço, como resulta da supracit. decisão no caso Fomento de Construcciones.

(27) Ver RUBINO-SAMMARTANO [2002: 604 e segs.].

(28) Cf. SCHWAB/WALTER [2000: 163], com mais referências, e SCHLOSSER [2001a: 17 e 2002 § 1044 n.° 3], com base na competência do tribunal judicial para apreciar a validade e eficácia da convenção de arbitragem. Este autor entende que a litispendência num tribunal judicial também não pode ser invocada perante o tribunal arbitral [2002 § 1044 n.° 6].

(29) Cf., sobre a aplicabilidade deste regime à convenção de arbitragem, RLx 6/11/1990 [CJ (1990-V) 103] e 14/11/1996 [CJ (1996-V) 93].

(30) Ver LIMA PINHEIRO [2002b: 64 e segs.], com mais referências. Cp. MOURA VICENTE [2002: 396 e seg.].

(31) Cf. RAÚL VENTURA [1986a: 44]. Ver também MENEZES CORDEIRO [2000: 447].

(32) Ver RAÚL VENTURA [1986b: 305 e segs.].

(33) Cf. VAN DEN BERG [1981: 196 e segs.].

(34) Cf. VAN DEN BERG [1981: 199].

(35) 1981: 201.

(36) Como resulta, no Direito português, do art. 217.°/2 CC.

(37) Cf. VAN DEN BERG [1981: 206], REMIRO BROTÓNS [1984: 227], SCHLOSSER [1989: 279 e seg. e 2002 Anhang § 1061 n.os 50 e 52] e, relativamente à Lei-Modelo da CNUDCI, HOLTZMAN/NEUHAUS [260 e segs.]. Cp. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [392].

(38) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [391 e seg.] e SCHWAB/WALTER [2000: 464].

(39) Cf. VAN DEN BERG [1981: 204 e seg. e 1996: 13] e FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [391] com referências jurisprudenciais.

(40) Em sentido convergente PIMENTA COELHO [47 e seg.], RICHARD HILL [1999: 200 e segs.], SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 52] e POUDRET/BESSON [157]. Cp. SCHWAB/WALTER [2000: 464].

(41) Ver também SANDERS [1996 n.° 105].

(42) Cf. VAN DEN BERG [1981: 210], FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [292 e 391] e SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 55]. Cp. SCHWAB/WALTER [2000: 465]. Para uma panorâmica comparativa sobre a celebração de convenções de arbitragem através da adesão a cláusulas contratuais gerais ver VERA VAN HOUTTE [2000].

(43) Cf. VAN DEN BERG [1981: 210]. Sobre as exigências que devem ser postas a esta remissão ver VAN DEN BERG [1981: 215 e segs.], seguido por PIMENTA COELHO [48], RAÚL VENTURA [1986a: 19 e segs.], FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [290 e segs.] e POUDRET/BESSON [175 e segs.].

(44) Cf. SCHWAB/WALTER [2000: 463].

(45) Cf. VAN DEN BERG [1981: 182 e segs.] e PIMENTA COELHO [47].

(46) Cf. HOLTZMANN/NEUHAUS [260].

(47) Sobre este preceito ver HOLTZMANN/NEUHAUS [260 e segs.] e BENTO SOARES/MOURA RAMOS [350 e segs.].

(48) No Capítulo dedicado à arbitragem internacional, o art. 833.°/2 CPC it. admite expressamente a convenção de arbitragem por remissão de um acordo escrito para cláusulas gerais, em termos que se conformam com a Lei-Modelo: “desde que as partes tenham tido consciência da cláusula ou devessem conhecê-la usando a diligência normal”. Ver também art. 1031.°/3 ZPO, art. 6.°/2 da Lei “inglesa” de 1996 e jurisprudência dos tribunais dos EUA referida por BORN [2001: 189 e seg.].

(49) Cf. HOLTZMANN/NEUHAUS [262].

(50) A lei suíça apenas contempla expressamente a primeira hipótese referida no art. 7.°/2 da Lei Modelo.

(51) Cf. BORN [2001: 138 e 336].

(52) Além disso a lei alemã contempla o caso do conhecimento de carga que faça expressa referência à cláusula compromissória contida numa carta-partida e estabelece uma regra mais exigente para as convenções de arbitragem celebradas com consumidores. Alterando a orientação seguida anteriormente pelos tribunais alemães, os trabalhos preparatórios indicam que não basta uma referência global à carta-partida — cf. BERGER [2001b: 33]. Sobre a posição dos tribunais estadounidenses e franceses a este respeito ver GOUTAL [1996].

(53) Sobre este preceito ver LIMA PINHEIRO [2002b: 139 e segs.], com mais referências. À semelhança do que se verifica relativamente ao art. 23.°/1/c do Regulamento comunitário, a disposição que consta do art. 131.°/2 ZPO transcende a regulação da validade formal da convenção de arbitragem, projectando-se sobre a própria formação do consentimento.

(54) Cf. MUSTILL/BOYD [2001: 20 e seg. e 371 e segs.] e SUTTON/GILL [45].

(55) BOSCO LEE [2002: 69] pronuncia-se no sentido de uma interpretação liberal deste requisito de forma, de modo a abranger os modernos meios de comunicação.

(56) A Lei alemã também exige que a convenção de arbitragem celebrada com consumidor conste de um documento separado (a menos que sujeito a forma autêntica) assinado pelas partes (art. 1031.°/5 ZPO).

(57) Ver RUBINO SAMMARTANO [2002: 314 e segs.]. FRIGO [in TARZIA/LUZZATTO/RICCI Art. 833.° n.° 3], por seu turno, entende que esta exigência seria afastada pelo art. 2.° da Convenção de Nova Iorque que, aparentemente, considera aplicável mesmo na arbitragem interna.

(58) Ver DOLINGER/TIBURCIO [2003: 496 e seg.]. Ver ainda SAMTLEBEN [1999: 90].

(59) Cf. Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.° 34/IV [Diário da Assembleia da República II s. n.° 83, de 2/7/86], n.° 10.

(60) Cf. HOLTZMANN/NEUHAUS [260 e 263].

(61) Cf. HOLTZMANN/NEUHAUS [264].

(62) Cf. LALIVE/POUDRET/REYMOND [318], SCHWAB/WALTER [2000: 44 e seg.] e KÖHLER/ARNDT [83].

(63) Cf. SCHWAB/WALTER [2000: 44 e seg.] e VISCHER/HUBER/OSER [652 e seg.].

(64) Cf. BRIGUGLIO/FAZZALARI/MARENGO [15 e seg.], relativamente aos telegramas, telexes e telefaxes.

(65) Cf. KÖHLER/ARNDT [2.ª ed. 46].

(66) Ver art. 490.°/2 CPC.

(67) Cf. HOLTZMANN/NEUHAUS [260].

(68) Cf. HOLTZMANN/NEUHAUS [263].

(69) Cp., em todo o caso, o art. 1499.° NCPC e, sobre ele, FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [384 e seg.]. Mesmo no domínio da arbitragem interna a exigência de forma escrita é entendida em sentido muito amplo — ver Cass. 17/6/1997 [R. arb. (1998) 539.

(70) Ver FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [384 e segs.], e referências aí contidas.

(71) Cf. LEBRE DE FREITAS [2002: 629]. Ver também TEIXEIRA DE SOUSA [2000: 32].

(72) Cf. LEBRE DE FREITAS [2002: 631].

(73) Ver RAÚL VENTURA [1986b: 355].

(74) Cf. LEBRE DE FREITAS [2002: 633]. Ver também STJ 16/12/1986 [BMJ 362: 509].

(75) Revogados pelo DL n.° 38/2003, de 8/3.

(76) A interpretação do art. 12.°/4 LAV suscitava a questão de saber se era necessário, para o início do processo arbitral, um acordo sobre a determinação do objecto do litígio — entendimento adoptado por CORTEZ [570 e seg.] e seguido por RLX 13/3/1997 [ROA 59 (1999) 225] (ver ainda STJ 9/11/1995 [CJ/STJ (1995-III) 107] que não é inequívoco neste ponto) — ou se bastava que o requerido, notificado para a arbitragem, não manifestasse o seu desacordo no prazo estabelecido para a nomeação de árbitros — como defende LOPES DOS REIS [1999: 302 e segs.] (ver ainda Id. [1998a: 492 n.° 6], sustentando que se o litígio indicado na notificação se inscreve “no próprio objecto da cláusula, o desacordo é expediente meramente dilatório e em absoluto irrelevante, cabendo aos árbitros decidir sobre a sua própria competência”.
Por minha parte entendia que este segundo entendimento era de preferir, visto que a LAV manifesta a clara intencionalidade de evitar desnecessários formalismos e de limitar a intervenção do tribunal judicial ao indispensável. O recurso ao tribunal da relação para a determinação do objecto do litígio só se compreendia quando no fim do prazo para a nomeação dos árbitros se mantivesse uma divergência entre as partes e como meio para superar esta divergência. Além disso, parece que o art. 12.°/4 devia ser considerado supletivo (neste sentido, LOPES DOS REIS [1999: 288 e seg. e 312]), razão por que as partes podiam estabelecer que o objecto do litígio se considere determinado com a notificação inicial do requerido ou que, em caso de divergência, seja determinado pelos árbitros.

(77) Cf. VAN DEN BERG [1981: 155].

(78) Cf. VAN DEN BERG [1981: 285].

(79) 333.

(80) Ver também HANOTIAU [2002: 43 e 45 e segs.].

(81) Ver também HANOTIAU [2002: 95 e segs. e 107 e segs.].

(82) Do art. 2061.° CC conjugado com o art. 631.°/§ 2.° C.Com. resultava que a cláusula compromissória só era admitida nas relações comerciais. Todavia, o art. 2061.° CC foi alterado pela L n.° 2001-420, de 15/5/2001, admitindo agora a cláusula compromissória nos contratos celebrados no exercício de uma actividade comercial.

(83) Cf. RACINE [1999: 29 e segs. e 41 e segs.].

(84) Ver CASTRO MENDES [1987: 210 e segs.] e TEIXEIRA DE SOUSA [1993: 117]. Perante o Direito brasileiro, ver FONTOURA COSTA/TUSA [333 e segs.].

(85) Creio, por isso, que são injustificadas as dúvidas formuladas por RAÚL VENTURA [1986b: 321] e SÉRVULO CORREIA [1995: 234 e seg. n.° 10].

(86) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [345 e segs.] e Cass. fr. 5/1/1999, no caso Zanzi [R. arb. (1999) 260 an. FOUCHARD].

(87) Cf. Zürcher Komm./VISCHER [Art. 177 n.° 3], LALIVE/POUDRET/REYMOND [306] e SCHLOSSER [2000: 180].

(88) Cf. MUSTILL/BOYD [2001: 75].

(89) Cp. SUTTON/GILL [48 e seg.] e MUSTILL/BOYD [2001: 74].

(90) Ver CARBONNEAU [1997c: 883 e segs. e 891].

(91) Cf. decisão do Supremo Tribunal no caso Rodriguez de Quijas et al. v. Shearson/American Express Inc (1989) [490 U.S. 477], à p. 483.

(92) Ver CARBONNEAU [loc. cit.] e BORN [2001: 257 e seg. e 280 e segs.]. Cf. decisão do caso Mitsubishi Motors Corporation v. Soler Chrysler-Plymouth, Inc. (1985) [473 U.S. 614], em que o Supreme Court sublinhou o carácter disponível da pretensão fundada em violação da legislação sobre concorrência, e, sobre ela, VISCHER [1992: 148] e PETER BEHRENS [1993: 31 e segs.]. Ver também decisão do USDC D. Arizona no caso PPG Industries, Inc. v. Pilkington PLC (1993) [825 F.Supp. 1465].
Nos casos Shearson/American Express Inc. et. al. v. McMahon et al. (1987) [482 U.S. 220], e Rodriguez de Quijas et al. v. Shearson/American Express Inc. [supracit.] o Supreme Court afirmou a arbitrabilidade de pretensões indemnizatórias fundadas em violação das disposições legais protectoras dos investidores em valores mobiliários. Ver ainda decisão do USCA District of Columbia Circuit no caso National Railroad Passenger Corporation v. Consolidated Rail Corporation (1990) [892 F.2d 1066], relativo à arbitrabilidade de uma pretensão indemnizatória fundada em responsabilidade extracontratual.

(93) Ver, em geral, HANOTIAU [2002: 157 e segs.]. Perante o Direito português, cf. STJ 12/3/1963 [BMJ 125: 397] e RLx 18/5/1977 [CJ (1977) 619] e 15/4/1986 [CJ (1986 II) 110] e RAÚL VENTURA [1986b: 340 e segs.]. No mesmo sentido, perante o Direito alemão, SCHWAB/WALTER [2000: 36 e seg.], assinalando divergências relativamente à arbitrabilidade de alguns litígios; perante o Direito suíço, BUCHER [1989: 41] e Zürcher Komm./VISCHER [Art. 177 n.° 5]. Sobre os problemas suscitados pela inclusão de cláusulas compromissórias em contratos de sociedade ver ainda ROTH [1987].

(94) Op. cit. 342 e seg. Ver a jurisprudência referida por RUBINO-SAMMARTANO [2002: 250 e segs.]. Cp. HANOTIAU [2002: 160] e, na jurisprudência portuguesa, RLx 15/4/1986 [CJ (1986-II) 110] em que se admite a arbitrabilidade da anulação de deliberações sociais sem qualquer limitação.

(95) Ver RAÚL VENTURA [1986b: 344 e seg.] e art. 74.° C. Soc. Com.

(96) Ver HANOTIAU [2002: 224 e segs.].

(97) Ver RAÚL VENTURA [1986b: 337 e segs.] e MOURA RAMOS [1996: 51 e seg.].

(98) Cf. Cass. 16/2/1999 e 4/5/1999 [R. arb. (1999) 290 an. MOREAU]; Cass. 19/1/2001 [R. arb. (2002) 347 an. CLAY]. Ver ainda HANOTIAU [2002: 227 e segs.].

(99) RPT 24/11/1997 [CJ (1997-V) 246] e REv. 27/10/1998 [CJ (1998-IV) 292]. A primeira decisão é aprovada por ROMANO MARTINEZ [2002: 1135], assinalando que a cláusula de arbitragem não impedia o recurso judicial da decisão arbitral.

(100) Ver também HANOTIAU [2002: 226 e seg.].

(101) O Código inclui algumas normas sobre o funcionamento da arbitragem e os efeitos da decisão arbitral (arts. 565.° e 566.°). Ver MOURA VICENTE [2003].

(102) Ver, em geral, HANOTIAU [2002: 205 e segs.] e, relativamente ao Direito alemão, SCHLOSSER [2000: 182 e seg.] e BERGER [2001b: 38 e seg.].

(103) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [366 e seg.] e RUBINO-SAMMARTANO [2002: 275 e seg.].

(104) Ver CÉSAR MONTEIRO [1998: 15].

(105) Ver MORAIS LEITÃO/MOURA VICENTE [9].

(106) O art. 49.°/1 deste diploma suscita dúvidas quando confere ao interessado que pretenda recorrer à arbitragem no âmbito do art. 48.°/1 a faculdade de “requerer a celebração de compromisso arbitral, nos termos da lei de arbitragem voluntária”, uma vez que esta lei não contempla tal faculdade. Da conjugação com o n.° 3 do mesmo artigo e com o art. 39.°, parece resultar que se tem em vista o exercício desta faculdade perante o Instituto Nacional da Propriedade Industrial, em sintonia com o disposto, relativamente à arbitragem de litígios administrativos, no art. 182.° do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, adiante referido.

(107) Ver MORAIS LEITÃO/MOURA VICENTE [9].

(108) Cf., perante o Direito alemão, SCHWAB/WALTER [2000: 37] e, perante o Direito suíço, LALIVE/POUDRET/REYMOND [54], BUCHER [1989: 41] e Zürcher Komm./VISCHER [Art. 177 n.° 7].

(109) Sobre a celebração de convenção de arbitragem depois da instauração de procedimento colectivo ver FOUCHARD [1998: 492 e segs.].

(110) Cf. TEIXEIRA DE SOUSA [1995: 17 e 29 e seg.]; JANUÁRIO GOMES [1996: 230 e 278]; MARQUES DOS SANTOS [2002b: 580 e segs.]. Em sentido contrário, defendendo a arbitrabilidade de todos os litígios emergentes da relação de arrendamento — PINTO FURTADO [2001: 1046 e segs.].

(111) Neste sentido, porém, TEIXEIRA DE SOUSA [1995: 30] e MARQUES DOS SANTOS [2002b: 584].

(112) Cf. RPT 24/11/1997, supracit.

(113) Cf. FERRER CORREIA [1989: 199 e seg. n.° 58], SCHWAB/WALTER [2000: 37], LALIVE/POUDRET/REYMOND [307], POUDRET/BESSON [312 e seg.] e, relativamente às competências exclusivas estabelecidas pelas Convenção de Bruxelas sobre Competência Judiciária e Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial ou pelo Regulamento n.° 44/2001, do Conselho, de 22/2/2000, Relativo à Competência Judiciária, ao Reconhecimento e à Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial, SCHLOSSER [1990 n.° 63], GOTHOT/HOLLEAUX [1985: 83], KROPHOLLER [2002 Art. 1 n.° 41] e LIMA PINHEIRO [2002b: 66 e seg.]. Ver ainda HANOTIAU [2002: 111 e segs.]. Cp. BUCHER [1989: 42 e seg.]; MOURA VICENTE [1996: 611 e seg.]; TEIXEIRA DE SOUSA [1997a: 127]. Excluindo apenas a arbitrabilidade quando a competência exclusiva se destina a proteger uma das partes, Zürcher Komm./VISCHER [Art. 177 n.° 13]. Questão diferente, que se poderia levantar, é a de saber se é válida uma convenção de arbitragem que fixa o lugar de arbitragem no estrangeiro quando os tribunais portugueses são exclusivamente competentes. ALBERTO DOS REIS [1960: 296], entendia que não, e a sua doutrina foi seguida pelo STJ no ac. 30/5/1961 [BMJ 107: 527] em sede de reconhecimento de decisão estrangeira. Não se trata, então, de um problema de arbitrabilidade. Mas também a este respeito é de sublinhar que à face do Direito positivo a validade da convenção de arbitragem não depende de forma alguma do regime aplicável à competência internacional dos tribunais portugueses, nem haveria razão para tal, visto que se trata de questões diferentes a cuja resolução presidem considerações diferentes.

(114) Cf. RAÚL VENTURA [1986b: 317 e seg.], que entende ser este o caso dos litígios em matéria de contrato individual de trabalho [337 e segs.].

(115) Cf. SCHLOSSER [1989: 417] e Zürcher Komm./VISCHER [Art. 177 n.° 11].

(116) Ver HORN [1985a e 1985b], BUXBAUM [1985], BÖCKSTIEGEL [1985], HINSCH [1985], PETER [1986: 33 e segs. e 148 e segs.], BARTELS [11 e segs.] e, entre nós, RAÚL VENTURA [1986b: 330 e segs.] e LIMA PINHEIRO [2004: 247 e segs.].

(117) A importância da arbitragem integradora do contrato internacional de empreendimento comum tem sido assinalada pelos autores — cf., por exemplo, ZWEIGERT/VON HOFFMANN [209 e segs.] e PENNETA [1988: 146 e 244 e segs.].

(118) Ver CARBONE/D’ANGELO [1991: 157 e segs.] e PENNETTA [1988: 92 e seg.].

(119) Ver MOECKE/SCHANZE [16 e seg.] com referência à elaboração de um balanço final para a distribuição dos bens, designadamente para determinar o valor destes bens e da empresa no seu conjunto, procedimentos que poderiam assumir carácter arbitral. Também MORERA [1993: 100], assinalando que, segundo a jurisprudência italiana, nem todas as questões relativas à dissolução são consideradas disponíveis e, portanto, arbitráveis (refere o caso das questões relativas a deliberações sociais sobre a dissolução da sociedade e a nomeação de liquidatários).

(120) Ver, em geral, BERNINI/HOLTZMANN [28 e segs.] e CRAIG/PARK/PAULSSON [2000: 114 e segs.].

(121) Ver SCHLOSSER [1989: 23 e segs.], RESCIGNO [1991: 31 e seg.] e BERGER [2001a]. Cp. RAÚL VENTURA [1986b: 330 e segs.],

(122) Das questões relativas à integração e adaptação do contrato cabe distinguir a de saber se a intervenção de terceiro na própria formação do contrato — mediante a atribuição do poder de fixar certos elementos do conteúdo do contrato — pode ser enquadrada pelo instituto da arbitragem. RAÚL VENTURA [1986b: 335 e seg.] entende que a “gama de exemplos dados neste n.° 3 mostra a intenção de abranger todas as possíveis modalidades de conflitos de formação”, e que, por conseguinte, as partes poderão fazê-lo, ficando ao abrigo do regime aplicável às restantes arbitragens. No entanto, em sua opinião, trata-se de duas instituições diferentes: enquanto as verdadeiras arbitragens se destinam “à solução de verdadeiros litígios, tendo verdadeira natureza contenciosa”, sendo “equiparadas à função judicial do Estado”, as arbitragens que se ocupam de questões de formação substituem as partes na formação das suas relações jurídicas. A seguir-se este entendimento, haverá que determinar a natureza dos poderes atribuídos a terceiros, em paralelo com o anteriormente assinalado com respeito à adaptação do contrato. Se as partes submeterem a questão a arbitragem, a decisão de terceiro tem o valor e eficácia de um acto jurisdicional, e não o que corresponderia à estipulação celebrada pelas partes. Por conseguinte, e sem entrar aqui no problema da delimitação das questões de formação que as partes possam submeter a arbitragem, o regime aplicável às arbitragens que se ocupem destas questões é o mesmo que rege as restantes arbitragens.
No que toca aos contratos internacionais de empreendimento comum, caberá apreciar, segundo o Direito regulador do contrato-base, as consequências da inexecução das obrigações de contratar que este porventura gere e, designadamente, a susceptibilidade de execução específica da promessa. Se, perante o Direito aplicável ao contrato-base, os acordos complementares celebrados entre as partes puderem ser considerados como modelando uma relação unitária, não parece de excluir que as partes submetam a arbitragem as questões que se relacionem com a necessidade de precisar e completar o disposto no contrato-base com respeito ao conteúdo destes acordos complementares. Embora no quadro de concepção própria anteriormente exposta, chega à mesma conclusão RAÚL VENTURA [1986b: 332 e segs.].
A jurisprudência arbitral tem entendido que a cláusula compromissória contida no contrato-base abrange os litígios relativos a acordos de execução e contratos conexos entre as partes do contrato-base, e que prevalece sobre as cláusulas compromissórias naqueles negócios — ver designadamente casos CIRDI Benvenuti (1980) [ILR 67: 345], Holiday Inns S.A. (1972/1977) [Brit. YBIL 51 (1980) 123] e Klöckner (1983/1985) [Clunet 111 (1984) 409 e 114 (1987) 137].
Embora não seja esse o sentido que deve ser normalmente atribuído a cláusulas que estabeleçam a intervenção de terceiros na resolução de impasses deliberativos que ocorram no funcionamento de órgãos de entes com ou sem personalidade jurídica, também não parece de excluir a possibilidade de a questão ser submetida a arbitragem, admitida, perante o Direito italiano, por CARBONE/D’ANGELO [1991: 157 e segs.]. Mas estes autores assinalam que, frequentemente, a arbitragem prevista na cláusula compromissória para a resolução dos litígios emergentes do contrato não permite superar o impasse com a celeridade necessária. Outro problema, que não cabe examinar aqui, é o dos limites que sejam postos à actividade integradora e complementadora do contrato por parte dos árbitros, quando a convenção de arbitragem lhes não confie especificamente esse encargo.

(123) Cf. SCHLOSSER [1989: 23] e BERGER [2001a: 10 e seg.].

(124) Segundo a doutrina dominante — cf. JARROSSON [1987: 321 e segs.), FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [33] e OPPETIT [1998: 76 e seg.].

(125) Face ao regime da arbitragem internacional de Direito suíço, a “arbitragem” é entendida na mais ampla concepção: modo de resolver controvérsias fundado sobre a convenção das partes e caracterizado pela submissão de um “litígio” à decisão de simples particulares escolhidos pelas partes. O “litígio” pode consistir em questões relativas à adaptação ou integração do contrato — cf. LALIVE/POUDRET/REYMOND [271] e PIERRE LALIVE/GAILLARD [911 e seg.].

(126) Cf. MUSTILL/BOYD [2001: 151 e 330] e, aparentemente, SUTTON/GILL [261 e seg.].

(127) Cf. HOLTZMANN/DONOVAN [II.3b e c].

(128) Cf. NEHRING NETTO [II.3b e c].

(129) Cp. MARQUES DOS SANTOS [1987: 23] que se refere a uma divergência de opiniões actual ou potencial.

(130) Ver, em geral, HANOTIAU [2002: 54 e segs.]. Ver ainda, sobre a evolução histórica da arbitragem de litígios administrativos, ESQUÍVEL PEREIRA [111 e segs.].

(131) Ver PIERRE LALIVE/GAILLARD [925 e segs.].

(132) Cf. LALIVE/POUDRET/REYMOND [306].

(133) Ver SCHLOSSER [2000: 195 e 2002 vor § 1025 n.° 20 e § 1030 n.° 3], BERGER [2001b: 38] e SCHWAB/WALTER [2000: 2 e seg. e 37], estes últimos autores defendendo que embora as disposições contidas no livro X do ZPO sejam exclusivamente aplicáveis aos litígios cíveis, são arbitráveis muitos litígios jurídico-públicos, que emergem de relações de coordenação estabelecidas pela Administração.

(134) Cp. FAZZALARI [1987 n.° 9] e RUBINO-SAMMARTANO [2002: 177 e segs.]. Ver ainda ESQUÍVEL PEREIRA [126 e segs.].

(135) Ver DOLINGER/TIBURCIO [2003: 398 e segs. e 426 e segs.].

(136) Cf. RECHSTEINER [2001: 145], com mais referências, e NEHRING NETTO [II.2b].

(137) Cf. BOSCO LEE [2002: 67 e seg.] e DOLINGER/TIBURCIO [2003: 409].

(138) Cf. SUTTON/GILL [89].

(139) Cf. MUSTILL/BOYD [2001: 73 e segs.].

(140) Sobre a eventual exclusão da arbitrabilidade relativamente a actos administrativos praticados na fase de formação do contrato, ver ESQUÍVEL PEREIRA [210 e segs.].

(141) DR I Série-B, n.° 299, de 28/12/2001.

(142) O art. 49.°/3 C. Prop. Ind. determina que a outorga de compromisso arbitral por parte do Estado é objecto de despacho do Ministro da Economia, a proferir no prazo de 30 dias contado da data da apresentação do requerimento.

(143) Ver arts. 181.°/2 e 186.° do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, ESQUÍVEL PEREIRA [163 e seg.] e, antes da sua entrada em vigor, SÉRVULO CORREIA [1995: 254 e segs.].

(144) Cf. acs. Cass. proferidos em 2/5/66, no caso Galakis, [R. crit. (1967) 553 an. GOLDMAN; Clunet 93 (1966) 648 an. LEVEL] analisado por MARQUES DOS SANTOS [1991: 632 e segs. e 2001: 244 e segs.] e GAUDEMET [1992: 244 e 254]; 20/12/93, no caso Comité populaire de la municipalité de Khoms vs. Sté Dalico Contractors [Clunet 121 (1994) 690 com an. LOQUIN; an. GAUDEMET-TALLON R. arb. (1994) 124], confirmando ac. Capp. de Paris 26/3/91 [R. arb (1991) 456, an.GAUDEMET-TALLON]. GAUDEMET [op. cit. 255] e FOUCHARD [1992: 207] entendem que a distinção entre Direito privado e público não deverá ser relevante, para o efeito, em matéria de arbitragem internacional, e que, por conseguinte, devem ser arbitráveis a generalidade dos litígios emergentes de contratos celebrados por pessoas colectivas públicas em “matéria internacional”. Ver ainda FERRER CORREIA [2000: 157 e seg.], afirmando que a orientação da jurisprudência francesa “equivale à criação de uma regra de DIP material”.

(145) Cf. BORN [2001: 238]. Algumas decisões de tribunais inferiores têm entendido que estas limitações estabelecidas pelas leis dos Estados federados só não cedem perante o Direito federal se forem claras e expressas.

(146) Cf. CARBONNEAU [1997: 891].

(147) Ver SANDERS [1978: 33 e seg. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN] e FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [219 e segs.]. Ver também BENTO SOARES/MOURA RAMOS [377 e seg.] e MAYER [1998: 362 e seg.], este último autor salvaguardando a vontade exprimida pelas partes em sentido contrário. .

(148) Ver FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [214 e segs.]. Ver ainda FERRER CORREIA [1981: 82 e seg.] e MARQUES DOS SANTOS [1991: 628 e segs. e 2001: 237 e segs.].

(149) Ver decisão da Cass. no caso Cassia [R. arb. (1990) 857 an. MOITRY/VERGNE] e FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [375 e segs.].

(150) Cp. HASCHER [1995: 1024 e seg.].

(151) 388 U.S. 395. Ver também CARBONNEAU [1997: 891] e BORN [2001: 56].

(152) Isto mesmo que esteja em causa a existência do contrato — ver RAÚL VENTURA [1986b: 374 e segs.], FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [226 e seg.] e SCHLOSSER [2001b: 704 e segs.]. Cp., em sentido contrário, SANDERS [1978: 34 e seg.] e BROCHES [1990 Art. 16 n.os 15 e seg.].

(153) Ver também MAYER [1998: 360 e segs.].

(154) Cf. RESCIGNO [1991: 27 e seg.] e MAYER [1998: 362 e seg.].

(155) Cf. RAÚL VENTURA [1986b: 370], MAYER [1998: 365 e seg.] e REDFERN/HUNTER [156].

(156) Cf. art. 6.°/4 do Regulamento de Arbitragem da CCI e art. 21.°/2 do Regulamento de Arbitragem CNUDCI; na jurisprudência arbitral, ver por exemplo a decisão preliminar 14/1/82, arbitragem ad hoc Elf Aquitaine Iran v. National Iranian Oil Company [Rev. arb. (1984) 397, an. FOUCHARD, op. cit. 333], que se baseou em “princípios fundamentais da arbitragem internacional”, considerados como princípios de Direito Internacional.

(157) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [216 e segs.].

(158) Sobre o conceito de norma “autolimitada” ver LIMA PINHEIRO [2001: 193 e segs.].

(159) Como observa MARQUES DOS SANTOS [1987: 34 n.° 80].

(160) À data da elaboração deste estudo ainda não tinha sido publicado o aviso sobre o depósito do instrumento de adesão.

(161) Ver autores referidos nas notas seguintes. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [148] pronunciam-se no sentido de estas regras se aplicarem “sem limitações no espaço, que resultariam da localização destas convenções ou da arbitragem que elas prevêem”, e KESSEDJIAN [2000] entende tratar-se de uma regra material de aplicação uniforme, não sendo claro se isso significa apenas que a aplicação dessas regras não depende de normas de conflitos — como assinala SCHLOSSER [2002 Anhang §1061 n.° 33] — ou também a sua aplicação a convenções de arbitragem meramente internas.

(162) Cf. REMIRO BROTÓNS [1984: 250] e SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 27].

(163) Em princípio, a decisão arbitral considera-se proferida no Estado da sede da arbitragem.

(164) Cf. VAN DEN BERG [1981: 61 e segs.], BORN [2001: 119 e 124 e segs.] e PIMENTA COELHO [45]. Cp. REMIRO BROTÓNS [1984: 250] e SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 27].

(165) Ver VAN DEN BERG [1981: 155 e segs.].

(166) Cf. VAN DEN BERG [1981: 155 e segs.]. Contrariamente ao defendido por este autor, a caducidade da convenção, quando diga respeito à constituição do tribunal arbitral ou ao processo de arbitragem, tem de ser determinada à face da lei designada, na falta de convenção das partes, pelo art. 5.°/1/d da Convenção (a lei do lugar da arbitragem), e não segundo a lei aplicável à convenção de arbitragem, que vê o seu âmbito de aplicação limitado essencialmente aos pressupostos e requisitos do consentimento.

(167) Cf. VAN DEN BERG [1981: 159].

(168) Neste sentido, VAN DEN BERG [1983: 347] (relativamente à acção de simples apreciação); BUCHER [1989: 51]; FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [151 e seg.]; SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 30]; POUDRET/BESSON [153]; cp. LALIVE/POUDRET/REYMOND [316 e seg.].

(169) Cf. VAN DEN BERG [1981: 86 e segs. e 2001: 138 e seg.], seguido por PIMENTA COELHO [52], FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [388 e seg.] e SCHLOSSER [Anhang § 1061 n.° 34]; cp. REMIRO BROTÓNS [1984: 228 e seg. ] e POUDRET/BESSON [155].

(170) Cf. VAN DEN BERG [1981: 180]. Em sentido contrário, FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [155 e seg.] com mais referências.

(171) Ver, relativamente ao “controlo do conteúdo”, SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 42].

(172) Ver, também em sentido limitativo, VAN DEN BERG [1981: 290] e, com mais desenvolvimento, SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.os 41 e segs.].

(173) Cf. LALIVE/POUDRET/REYMOND [321 e segs.] e BUCHER [1989: 45 e segs.].

(174) Cp. SUTTON/GILL [69] incluindo genericamente a “validade” no âmbito de aplicação da lei reguladora da convenção de arbitragem. Assinale-se que a regra sobre a autonomia da cláusula compromissória contida na Lei de 1996 (art. 7.°) só é aplicável quando o Direito inglês reger a convenção de arbitragem (art. 2.°/5). Ver ainda BORN [2001: 107 e segs.].

(175) Cf. Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.° 34/IV [Diário da Assembleia da República II s. n.° 83, de 2/7/86] n.os 3 e 8 e segs. e ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO [1991: 58 e segs.].

(176) 250 e segs. e 276 e seg.

(177) Contrariamente ao sugerido por alguns autores, não se trata da apreciação da convenção de arbitragem perante Direito Transnacional, com afastamento de todo o Direito estadual, mas de uma regulação directa da validade da convenção de arbitragem por normas de fonte estadual. Cf. acs. Cass. proferidos em 2/5/1966, no caso Galakis [R. crit. (1967) 553 an. GOLDMAN e Clunet 93 (1966) 648 an. LEVEL] e em 20/12/1993, no caso Dalico [Clunet 121 (1994) 690 com an. LOQUIN; an. H. GAUDEMET-TALLON R. arb. (1994) 124], confirmando ac. Capp. de Paris 26/3/1991 [R. arb (1991) 456, an. H. GAUDEMET-TALLON]. Ver ISABEL VAZ [1990: 133 e seg.], MARQUES DOS SANTOS [1991: 626 e seg. e 2001: 235 e segs.] e GAUDEMET [1992: 244 e 254].
A segunda decisão da Cass. afirma, a este respeito, que “por força de uma regra material de Direito Internacional da arbitragem, a cláusula compromissória é independente do contrato principal que a contém directamente ou por referência e a sua existência e eficácia apreciam-se, com reserva das regras imperativas de Direito francês e da ordem pública internacional, segundo a vontade comum das partes, sem que seja necessário fazer referência a uma lei estadual”. LOQUIN [1994] entende esta jurisprudência no sentido de as condições de validade da cláusula compromissória serem subtraídas aos Direitos estaduais e apreciadas exclusivamente com “base na análise da vontade comum das partes”. Cp. GAUDEMET-TALLON [1991: 123 e seg.]. Para LOQUIN a referência às “regras imperativas de Direito francês” só pode ser entendida como abrangendo as que tiverem o valor de “lois de police”, i.e. “regras imperativas da ordem jurídica francesa nas relações internacionais”. Diferentemente, GAUDEMET-TALLON sugere que se trata de regras francesas que regem os vícios do consentimento e a arbitrabilidade. Ao que LOQUIN replica que, de acordo com esta jurisprudência, a autonomia das partes só é limitada pelas regras francesas em matéria de arbitrabilidade. Quanto à ordem pública internacional, não se trata aqui, como ambos os autores assinalam, de um limite à aplicação do Direito estrangeiro.
Perante este aresto, LOQUIN considera reafirmado que a regra da autonomia da cláusula compromissória se aplica “sem a mediação de uma regra de conflitos”. Além disso, em seu entendimento, a decisão contrapõe o “Direito Internacional da Arbitragem” aos Direitos estaduais, indicando que é uma regra exterior à ordem jurídica francesa, que na jurisprudência francesa é de há muito aplicada como parte da lex mercatoria; i.e., invocando o ac. Cass. 22/10/1991 [Clunet 119 (1992) 177], “Direito consuetudinário internacional”. No entanto, a posição que tem dominado na doutrina é a de que se trata de regras especiais da ordem jurídica francesa — cf. BATIFFOL/LAGARDE [II 557], DERAINS [1994: 271] e FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [215]. Sobre o conceito de regra de Direito Internacional Privado material ver LIMA PINHEIRO [2001: 51 e segs.].

(178) Ver também, em sentido crítico, SCHLOSSER [1989: 293], GAUDEMET-TALLON [1994], SANDROCK [2001: 663 e segs.] e POUDRET/BESSON [149 e seg.].

(179) Cf. VAN DEN BERG [1981: 126 e seg.], REMIRO BROTÓNS [1984: 250 e seg.], SCHLOSSER [1989: 189 e segs.] e SCHWAB/WALTER [2000: 456]. Ver também FERRER CORREIA [1989: 210] e LEBRE DE FREITAS [2002: 637].

(180) Cp. POUDRET/BESSON [273].

(181) Cf. MAYER [1998: 367 e seg.] e REDFERN/HUNTER [157 e seg.].

(182) Ver FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [239], VAN DEN BERG [1981: 293], SCHLOSSER [1989: 192 e seg. e 2002 Anhang § 1061 n.° 77] e VON HOFFMANN [1994: 150 e seg.].

(183) Cf. MAYER [1998: 367].

(184) Neste sentido, REMIRO BROTÓNS [1984: 224].

(185) Cf. SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 77].

(186) Cp. VAN DEN BERG [1981: 293].

(187) Cf. BUCHER [1989: 45] e LALIVE/POUDRET/REYMOND [322 e seg.].

(188) Ver também SCHLOSSER [1989: 192], JONATHAN HILL [1997: 296] e BORN [2001: 109].

(189) Cf. Dicey & Morris [597].

(190) Cf. Dicey & Morris [loc. cit.] e REDFERN/HUNTER [158]. Cp., em sentido contrário, SCHLOSSER [1989: 192 e 2002 § 1029 n.° 41].

(191) Sobre o ponto cp., entre nós, FERRER CORREIA [1989: 211 e seg.], que aplica os arts. 41.° e 42.° CC, mas em texto elaborado antes da publicação da LAV e, na doutrina estrangeira, além das obras previamente citadas, BASEDOW [1987: 4 e segs. e 8 e segs.], PIERRE LALIVE/GAILLARD [927 e segs.] e SCHWAB/WALTER [5.ª ed., 407 e segs. e 6.ª ed., 458].

(192) No primeiro sentido, ver SCHLOSSER [1989: 184 e segs. e 192], VON HOFFMANN [1994: 151], SCHWAB/WALTER [2000: 458], com referência ao Direito do Estado em que a decisão é proferida, e JONATHAN HILL [1997: 296]. Ver ainda, em sentido convergente, FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [240].

(193) Em sentido convergente, MAYER [1998: 368] e SCHWAB/WALTER [5.ª ed., 409 cp. 6.ª ed., 458]. Ver ainda LEBRE DE FREITAS [2002: 639].

(194) Ver ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO [1991: 64 e seg.] e LIMA PINHEIRO [2003: 183 e segs.] com mais referências.

(195) Ver também o art. 48.° da Lei sueca sobre arbitragem de 1999 e Dicey & Morris [598].

(196) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [242 e segs.].

(197) Ver LIMA PINHEIRO [2002a: 223 e segs.].

(198) Ver RAÚL VENTURA [1986a: 45 e seg.].

(199) Ver LIMA PINHEIRO [2003: 161 e segs.].

(200) Ver FERRER CORREIA [1989: 211 e seg.] e a crítica da solução contida no art. 42.°/2 CC em LIMA PINHEIRO [2002a: 219].

(201) Cf. SCHWAB/WALTER [2000: 77] e também, em resultado, BASEDOW [1987: 8 e segs.].

(202) Cf. FERRER CORREIA [1989: 210 e seg.] e, em relação ao art. 34.°/2/a/i da Lei-Modelo, BENTO SOARES/MOURA RAMOS [418].

(203) Ressalve-se a exigência, feita em relação à cláusula compromissória, de que os litígios sejam emergentes de uma determinada relação jurídica, feita designadamente pelo Regulamento do Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Comercial da Associação Comercial de Lisboa/ Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa e pela Associação Comercial do Porto/Câmara de Comércio e Indústria do Porto (CAC, 1992) (art. 2.°/1).

(204) Em sentido convergente, FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [252 e segs, 276 e segs. e 325 e segs.] e GRIGERA NAÓN [2001: 224].

(205) Ver BERNARDINI [2000: 104] e BORN [2001: 112].

(206) Ver referências em FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [254 ns. 163 e 164].

(207) Cf. LALIVE/POUDRET/REYMOND [322] e BUCHER [1989: 46].

(208) 2003: 178 e seg. e 183 e segs.

(209) Neste sentido, VAN DEN BERG [1981: 189 e seg.] (no que toca ao Estado de previsível execução) e SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 31].

(210) A ressalva das formas permitidas pelas leis internas que não exigem a forma escrita nas relações entre os respectivos países tem gerado dificuldades de interpretação, que não cabe examinar nesta sede — ver FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [393 e seg.], SCHWAB/WALTER [2000: 467 e seg.] e HASCHER [1995: 1015].

(211) Ver FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [379 e segs.].

(212) Cf. Regulamento AAA art. 1.°/1, Regulamento LCIA proémio e Regulamento CAC art. 3.°/1. Ver ainda Regulamento CNUDCI art. 1.°/1.

(213) Cp. FERRER CORREIA [1989: 207 e 212 e seg.] e MARQUES DOS SANTOS [1987: 22].

(214) Cf. VAN DEN BERG [1981: 152] e SCHLOSSER [2002 Anhang § 1061 n.° 43].

(215) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [333 e 345].

(216) Cf. PIERRE LALIVE/GAILLARD [921 e segs.] e BLESSING [2000 n.° 792].

(217) Cf. SCHLOSSER [2000: 194 e seg.], BERGER [2001b: 37] e SCHWAB/WALTER [2000: 460].

(218) Uma vez que o tribunal apreciou a questão da arbitrabilidade exclusivamente segundo o Direito do foro, apesar de ter sido estipulado o Japão como Estado da realização da arbitragem e de as partes terem escolhido o Direito suíço para reger o mérito da causa.

(219) Ver POUDRET/BESSON [305]. Ver ainda, no sentido da aplicação cumulativa da lei reguladora da convenção de arbitragem, NYGH [1997: 18 e seg.].

(220) Cf. BUCHER [1989: 24], LALIVE/POUDRET/REYMOND [292] e BERGER [2001a: 10 e seg.].

(221) Cf. ZWEIGERT/VON HOFFMANN [211], LALIVE/POUDRET/REYMOND [271], PIERRE LALIVE/GAILLARD [loc. cit.], LIMA PINHEIRO [1998 § 11 A] e BERGER [2001a: 11]. Cp. MORAIS LEITÃO/MOURA VICENTE [9 e seg.].

(222) Ver, designadamente, SCHLOSSER [1989: 246 e segs. e 2002 Anhang § 1061 n.° 44]. O problema da arbitrabilidade também se pode suscitar relativamente a questões que relevem do Direito Internacional Público. VON MEHREN/JIMÉNEZ DE ARÉCHAGA [1989: 133], defendem, nas arbitragens entre Estados ou sujeitos públicos e particulares, a arbitrabilidade dos litígios que digam respeito à responsabilidade internacional dos Estados por prejuízos causados a particulares, por entenderem que este regime só processualmente é privativo do contencioso interestadual, uma vez que “a pretensão não é em benefício do Estado”.

(223) Contrariamente ao que poderia sugerir uma leitura mais apressada, entendo que a Convenção de Nova Iorque não obriga o tribunal de reconhecimento a apreciar a questão segundo a lei pessoal. Nos termos do art. 5.°/1/a, o reconhecimento da decisão arbitral “estrangeira” pode ser recusado em caso de incapacidade das partes para celebrar a convenção de arbitragem “nos termos da lei que lhes é aplicável”. A lei aplicável à capacidade é determinada, em princípio, pelo Direito de Conflitos do Estado de reconhecimento, não sendo necessariamente a lei pessoal — cf. VAN DEN BERG [1981: 276 e seg.].

(224) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [337 e seg.] e decisões da Capp. de Paris aí referidas; ver ainda Capp. de Paris 13/6/1996 [R. arb. (1997) 251, an. GAILLARD e Clunet (1997) 151, an. LOQUIN].

(225) Cf. Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.° 34/IV [Diário da Assembleia da República II s. n.° 83, de 2/7/86] n.° 9.

(226) É esta também a opinião de MARQUES DOS SANTOS [1987: 27 n.° 48a] e ISABEL VAZ [133].

(227) Cp. autores e lugares cit. na n. anterior.

(228) Sobre a substituição ver LIMA PINHEIRO [2001: 440 e segs.].

(229) Trata-se aqui de uma remissão operada no quadro do processo de qualificação do direito como disponível e não de uma “solução conflitual”, como pretendem BUCHER [1989: 40] e LALIVE/POUDRET/REYMOND [52], embora a divergência seja mais terminológica que substancial.

(230) Cf. HABSCHEID [1959: 114].

(231) Sobre a apreciação da arbitrabilidade segundo regras transnacionais, cp. VON MEHREN/JIMÉNEZ DE ARÉCHAGA [1989a: 123 e segs.], com indicações favoráveis e, em sentido contrário, observações de RIGAUX [in Ann. Inst. dr. int. 63 (1989) II 131], chamando a atenção para a subordinação do reconhecimento da decisão à arbitrabilidade do litígio segundo a lei do país de execução ou a lei aplicável ao fundo da causa à luz das Convenções de Nova Iorque e Genebra.

(232) Ver LEHMANN [2003: 112 e segs. e 148 e seg.].

(233) Como sugerem FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [363].

(234) Cf. FOUCHARD/GAILLARD/GOLDMAN [341 e segs.]. Também segundo o art. 5.° da. Resolução do Instituto de Direito Internacional sobre a arbitragem entre Estados, empresas públicas ou entes estaduais e empresas estrangeiras (Santiago de Compostela, 1989), um Estado, empresa ou entidade pública não pode invocar a incapacidade de celebrar uma convenção de arbitragem para recusar a sua participação na arbitragem em que consentiu — ver, sobre este preceito, VON MEHREN/JIMÉNEZ DE ARÉCHAGA [1989a: 132 e seg.].

29/07/2025 08:44:56