Advogados podem requerer certidões das matrizes sem necessidade de procuração

ASSUNTO: Natureza dos Dados Constantes das Matrizes Prediais; Consulta às Matrizes Prediais; Interesse Directo, Pessoal e Legítimo na Consulta de Matrizes; Pedido de Esclarecimento da Ordem dos Advogados


Parecer nº 138/DSCJC/2007-RS de 01/10/2007 – Direcção de Serviços de Consultadoria Jurídica e Contencioso


1. A Ordem dos Advogados veio solicitar esclarecimento acerca do entendimento da Direcção-Geral dos Impostos no que concerne à possibilidade de os Senhores Advogados poderem solicitar certidões de teor de artigos matriciais, sem necessidade de ter de exibir instrumento de mandato e sem necessidade de invocar interesse directo, pessoal e legítimo na sua obtenção.

2. Alicerça o pedido no estatuto profissional da classe que representa, invocando, designadamente, o nº1 do artigo 74º do estatuto da Ordem dos Advogados, que permite aos senhores advogados a consulta e a obtenção de certidões de quaisquer dados ou elementos não subordinados a sigilo ou reserva.

3. Liminarmente, há a referir que, é entendimento pacífico e assente nesta Direcção de Serviços e superiormente sancionado, que os dados constantes das matrizes prediais – quando especificadamente identificadas – ou são públicos ou são de natureza neutra, pelo que não se encontram abrangidos pelo dever de confidencialidade decorrente do nº1 do artigo 64º da Lei Geral Tributária (LGT).

Já se encontrará coberto pelo dever de confidencialidade decorrente deste citado preceito legal, todo o pedido que se dirigir, em abstracto, à globalidade ou universalidade do património imobiliário de alguém e constante das matrizes prediais, sem indicação especificada de cada artigo matricial, uma vez que, da satisfação do pedido, poderá resultar não só o conhecimento da capacidade económica e da situação tributária do titular dos rendimentos desse património, mas também uma utilização indevida das bases de dados à guarda da Administração Tributária, que não podem servir nem para identificar o património de cada um, nem para estabelecer, para terceiros, a situação tributária ou a capacidade económica de cada contribuinte.

4. Desta forma, pode ser requerida e deferida a passagem de certidões do teor dos dados constantes de qualquer artigo matricial, a quem, nos termos da lei demonstrar interesse directo, pessoal e legítimo na sua passagem – nº1 do artigo 130º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), aprovado pelo Decreto Lei nº 287/2003, de 12 de Novembro, conjugadamente com o artigo 64º do Código de Procedimento Administrativo (CPA).

5. Pela actividade de que exercem e pelo estatuto jurídico-profissional de que usufruem, os senhores Advogados, quando no exercício da sua actividade profissional, devem considerar-se dispensados da invocação desse interesse pessoal, directo e legitimo gozarão, pois decorre do seu estatuto jurídico-profissional a faculdade de acesso a quaisquer dados constantes de processos ou procedimentos administrativos e à guarda da Administração Pública, desde que os elementos ou dados constantes de tais processos ou procedimentos não possuam carácter reservado ou secreto. É o que expressamente decorre do nº1 do artigo 74º do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), aprovado pela Lei nº 15/2005, de 26 de Janeiro: “no exercício da sua profissão, o advogado tem o direito de solicitar em qualquer tribunal ou repartição pública o exame de processos, livros ou documentos que não tenham carácter reservado ou secreto, bem como, requerer, oralmente ou por escrito, que lhe sejam fornecidas fotocópias ou passadas certidões, sem necessidade de exibir procuração”. 6. Esta é uma norma especial quer relativamente ao nº1 do artigo 130º do CIMI, quer relativamente ao artigo 64º do CPA e, como tal, sobreleva-se a estes preceitos legais. Como lei especial que é, o nº1 do artigo 74º do EOA não derroga a disciplina comum decorrente dos antes citados preceitos legais, antes estabelece uma regra própria a observar quando, em causa, esteja o exercício da profissão ou a prática de actos próprios dos senhores advogados.

Aliás, esta mesma situação é aplicável aos senhores solicitadores no exercício da profissão, uma vez que, também, o seu estatuto profissional possui uma regra aproximada à que resulta do nº1 do artigo 74º do EOA – cfr. Artigo 100º do Estatuto da Câmara dos Solicitadores, aprovado pelo Dec. Lei nº 88/2003, de 26 de Abril.

7. Por outro lado, o acesso aos dados constantes das matrizes, porque não comportam natureza ou carácter reservado, deve considerar-se no âmbito da prática dos actos próprios dos senhores advogados e solicitadores, nos termos e aos abrigo do disposto na alínea a) do nº 6 do artigo 1º da Lei nº 49/2004, de 24 de Agosto que dispõe, entre outros, constituem “actos próprios dos advogados e dos solicitadores, a elaboração de contratos e a prática dos actos preparatórios tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais”.


8. A consulta aos dados constantes dos artigos matriciais são de fundamental importância quer para a celebração ou modificação de negócios jurídicos tendo por objecto ou envolvendo, de qualquer forma, os imóveis inscritos nesses mesmos artigos matriciais, quer para a defesa de quaisquer interesses relacionados com esses mesmos negócios jurídicos.

Determina a lei não ser necessária a exibição de instrumento de mandato, nem tão pouco a invocação de qualquer situação ou estado que não a correspondente aos dos respectivos estatutos sócio-profissionais.

Com a invocação do estatuto de advogado ou de solicitador, a única exigência que os funcionários da Administração Tributária poderão fazer, a quem se apresenta em Serviço da Administração Tributária a solicitar a consulta e/ou a emissão de certidões de artigos matriciais determinados e devidamente identificados, será a da comprovação, através da exibição da cédula profissional, do estatuto invocado e que habilita e autoriza os titulares respectivos a utilizar e gozar do estatuto correspondente a esse título.

A exigência dessa comprovação será sempre compreensível e deverá ser efectuada quando a invocação de algum desses estatutos sócio-profissionais for efectuada por alguém profissionalmente desconhecido no serviço e/ou pelo funcionário que proceder ao atendimento, tendo em vista, designadamente, o controle do exercício da procuradoria ilícita.

9. Atento tudo quanto acabou de ser escrito concluí-se:
9.1 Os dados ou elementos constantes das matrizes prediais à guarda da Administração Tributária possuem natureza pública ou neutra, não se encontrando subordinados a dever de sigilo ou de confidencialidade fiscal, quando respeitem a inscrições matriciais devidamente identificadas e especificadas;

9.2 A esses dados ou elementos têm acesso todos os que nos termos conjugados do artigo 130º do CIMI, e do artigo 64º do CPA, revelem interesse directo pessoal e legítimo a esses mesmos dados ou elementos, salvo se forem advogados ou solicitadores que, no exercício das suas profissões têm livre acesso a tais dados ou elementos, de acordo com os respectivos estatutos de exercício das respectivas profissões; 9.3 Concordando-se com o teor do entendimento aqui perfilhado, deverá a Ordem dos Advogados ser informada em conformidade; 9.4 Paralelamente e tendo em vista a uniformização de procedimentos nos serviços da Administração Tributária, deverá também, proceder-se à circulação desse entendimento, como orientação a observar pelos serviços da Administração Tributária.

Direcção de Serviços de Consultadoria Jurídica e Contencioso


Este Parecer foi homologado por despacho do Director Geral dos Impostos de 09.10.2007, de que a Ordem dos Advogados foi notificada em 07.11.2007

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